O aterro sanitário de Goiânia foi inaugurado em 1993 com uma expectativa de vida útil de duas décadas e para suprir, à época, as necessidades de menos de um milhão de habitantes. Hoje, já são 1,5 milhão de moradores da capital e um aterro que há anos não tem capacidade de sanar a demanda da cidade. E sejamos claros: trata-se de um problema passado de gestão em gestão, sempre com soluções temporárias e emergenciais, mas nunca definitivas.
Mas a bomba finalmente explodiu. No último mês, a Justiça acolheu uma ação civil pública proposta pela Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (Abrema) e pelo Estado de Goiás, por meio da Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), e mandou interditar o aterro por conta do descumprimento de um TAC firmado entre o Município de Goiânia e o Ministério Público de Goiás (MPGO) e da irregularidade ambiental do local.
A decisão liminar foi derrubada poucos dias depois, para alívio do prefeito de Goiânia, Sandro Mabel. O gestor, por sua vez, não poupou críticas à Semad e ao MPGO pelo que chamou de “atitude desnecessária”.
“A Semad não está sendo correta conosco. Realizamos uma reunião nos últimos dias, e expliquei por que essa decisão não é justa para Goiânia, considerando os decretos de calamidade financeira e de saúde em vigor. Essa atitude é desnecessária neste momento, demonstra falta de sensibilidade, e tem o apoio do MP e da Semad em benefício dos aterros privados. Pode ter certeza absoluta: nada é de graça para se fazer um movimento como esse”, afirmou.
A pasta estadual, claro, rebateu sob o argumento de que “tendo em vista a gravidade da situação, a Semad tem como obrigação legal adotar as medidas cabíveis para mitigar os impactos ambientais negativos, não só quanto à poluição do lençol freático, como também à contaminação de pessoas e outros riscos graves que decorrem da operação do lixão”.
Destaca-se: a Secretaria tem, sim, se movimentado para tentar sanar o problema perene dos aterros e lixões. Dê-se ênfase ao Lixão Zero, programa que implica na obrigatoriedade dos municípios de encerrarem os lixões e aderirem, gradualmente, à destinação final ambientalmente adequada dos resíduos sólidos e da redução da quantidade de resíduos a serem aterrados.
No entanto, causa estranheza quando a pasta passa a trabalhar deixando à margem dos diálogos figuras fundamentais e interessadas na resolução do problema que, reitera-se, a Semad está interessada em resolver.
Dá-se como exemplo a reunião convocada e realizada pela secretária do Meio Ambiente, Andrea Vulcanis, com o prefeito de Hidrolândia e presidente da Associação Goiana de Municípios (AGM), Zé Délio, e do prefeito de Jaraguá e presidente da Federação Goiana de Municípios (FGM), Paulo Vitor Avelar.
No encontro, foi abordada a questão do futuro dos aterros sanitários e ficou definida a convocação dos prefeitos das Microrregiões de Saneamento Básico (MSBs) Oeste, Centro e Leste para uma reunião virtual na próxima semana, dia 7 de maio, para verificar a adesão deles e atualizá-los quanto ao andamento do estudo do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, o BNDES, para indicar os custos das tarifas de tratamento do lixo nos municípios de Goiás. O estudo vai determinar, por exemplo, a viabilidade das MSBs de terceirizarem, ou não, a coleta interna, do tratamento do transbordo até a destinação final de resíduos.
Eis que surge o questionamento: como uma reunião para tratar de um tema em plena efervescência nas maiores cidades do Estado, como Goiânia, e de interesse coletivo não tem a presença de representantes dessas cidades? Fala-se que aqui de um encontro para tratar de aterros sanitários que foi realizado dias depois de uma decisão que interditou o aterro sanitário da maior cidade de Goiás, e para qual seu maior representante, o prefeito Sandro Mabel, não foi convidado.
Mesmo que não se trate de uma reunião de caráter decisório, e sim deliberativo, não seria natural, lógico e até esperado que o gestor da capital fosse chamado a acompanhar as discussões?
Leia-se: há tempos Sandro Mabel garante publicamente que trabalha para sanar, de uma vez por todas, o problema do aterro sanitário. Esta coluna apurou, inclusive, que o prefeito tem engatilhado um modelo de plano para o aterro no valor de R$ 600 milhões e que contou com a colaboração de especialistas de especialistas de Milão, na Itália, e Miami, nos EUA (Mabel se encontrou com eles na viagem a esses dois lugares).
Porém, com a pressão da Semad para que se resolva em 30 dias um problema de 30 anos, passa a soar cada vez menos absurda a acusação do prefeito e de outras figuras políticas, como o deputado estadual Gustavo Sebba, de que a pasta estaria atuando, propositalmente ou não, para abrir brechas para a entrada definitiva da iniciativa privada na gestão dos aterros.
Conforme fontes do próprio BNDES, o projeto contratado pelo Estado deve levar apenas 60 dias para ser concluído, não oferecendo tempo hábil para os municípios sequer aderirem às medidas de regularização oferecidas pela Semad.
Acrescenta-se ao conhecimento do leitor: à frente do projeto está a empresa WTEEC, líder do consórcio Ecocerrado, cujo CEO é Antonio Bolognesi – sócio do Presidente da Associação Brasileira de Energia de Resíduos (Abren), Yuri Schmitke. Logo, não será surpresa se essa mesma empresa – que atua na estruturação de processos de PPP (parceria público privada) ou de Concessão Pública para gestão e tratamento dos resíduos sólidos urbanos – pleitear a concessão do aterro de Goiânia. (T.P.)
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