A deputada federal Marussa Boldrin (MDB-GO) tornou pública, nesta segunda-feira, 28, uma denúncia de violência doméstica envolvendo seu ex-marido, Sinomar Júnior, que foi superintendente na Secretaria de Esporte e Lazer de Goiás. Em uma carta aberta publicada em seu perfil no Instagram, a parlamentar relata ter sido vítima de agressões físicas, violência psicológica e moral durante anos de um relacionamento que classificou como abusivo.
“Dizer isso em voz alta já é, por si só, um ato de coragem”, escreveu Marussa no início do texto, que rapidamente repercutiu nas redes sociais e mobilizou manifestações de apoio de colegas parlamentares, lideranças políticas e entidades ligadas à defesa dos direitos das mulheres.

A carta, intitulada “Por todas as mulheres que já silenciaram sua dor”, expõe episódios de desvalorização pessoal, sabotagem profissional, traição, ofensas verbais e duas agressões físicas – a primeira, segundo ela, ocorrida em 2023 e a segunda neste ano, em 2025, quando decidiu procurar a polícia, registrar boletim de ocorrência, realizar exame de corpo de delito e solicitar medida protetiva. “Porque não cabe amor onde existe violência”, declarou.
A deputada teria realizado o registro da violência na Delegacia de Polícia de Rio Verde e exigido medida protetiva na Justiça com base na Lei Maria da Penha. Marussa possui atuação na bancada feminina na Câmara dos Deputados e escreveu projetos sobre defesa e proteção às mulheres. Entre eles a proposta de aumentar a pena para crimes de feminicídio em áreas rurais e a notificação obrigatória de casos suspeitos em hospitais.
Marussa afirma que viveu em silêncio por anos, acreditando que o amor e a maternidade poderiam transformar a dinâmica do relacionamento. “Me calei por medo, por vergonha, por acreditar que tudo ia mudar”, escreveu. Ela relata que chegou a engravidar do segundo filho na tentativa de “corrigir a rota do abuso com amor”, mas que os episódios de violência se intensificaram. “Fui xingada, maltratada, ameaçada e humilhada, criando, infelizmente, uma rotina de sofrimento.”
De acordo com o relato, o ex-marido passou a demonstrar interesse em sua vida apenas quando percebeu os avanços da parlamentar na política. “Ele se reaproximou – não por mim, mas pelo interesse no que eu representava”, afirmou.
Sinomar Júnior, ex-marido da deputada, é figura conhecida nos bastidores da política goiana, com histórico de atuação em cargos públicos e vínculos empresariais. Até o momento, ele não se pronunciou sobre as acusações. A reportagem tentou contato, mas não obteve retorno até a publicação deste texto.
Ao final do relato, Marussa afirma que a Justiça já reconheceu os abusos e oficializou o divórcio, garantindo a ela a guarda dos filhos. Ela também prevê que haverá tentativas de desqualificar sua fala por motivações políticas: “Vão usar esse episódio como uma manobra para tentar abafar os abusos que vivi, e eu não vou aceitar isso.”
A deputada diz ter decidido romper o silêncio em nome de si mesma, dos filhos e de outras mulheres que sofrem em silêncio. “Hoje, eu começo a escrever um novo capítulo da minha vida. Um capítulo de cura, de força, de dignidade.”
A seguir, a íntegra da carta publicada por Marussa Boldrin:
CARTA ABERTA
Por todas as mulheres que já silenciaram sua dor
Eu estive em um relacionamento abusivo. Dizer isso em voz alta já é, por si só, um ato de coragem. Durante anos, fui silenciada dentro da minha própria casa. Fui desvalorizada, desacreditada, diminuída como mulher, como mãe e como profissional. E, por muito tempo, acreditei que suportar em silêncio era o caminho. Hoje, sei que não era.
Me casei acreditando no amor, acreditando na parceria. Tínhamos uma filha a caminho, uma vida inteira pela frente e muitos sonhos a serem vividos. Mas, logo após o nascimento da minha primeira filha, o homem que havia jurado cuidar de mim se afastou, emocional e fisicamente, e as agressões psicológicas começaram. Eu tentava compreender, tentava reconectar, insistia no que já não existia. Não casei para separar – repeti isso tantas vezes para mim mesma.
Insisti, mesmo quando ele passou a me ferir com palavras. Quando dizia que meu trabalho não prestava, que eu era incompetente. Quando desdenhava do meu mandato, usando até mesmo palavras de baixo calão. Quando dizia sentir nojo do meu leite enquanto eu amamentava. Ainda assim, eu me calava. Por medo, por vergonha, por acreditar que tudo ia mudar. Eu me calei. E me arrependo profundamente de ter silenciado a minha voz.
Enquanto eu lutava na vida pública, ele me sabotava na vida privada. Nunca me apoiou com sinceridade, apenas por conveniência. Nem mesmo compareceu à minha posse de reeleição como vereadora. Eu seguia tentando. Mesmo depois de descobrir uma traição, em que a outra pessoa chegou a me mandar mensagem expondo o relacionamento entre eles, tentei reconstruir. Engravidei do segundo filho mais uma vez tentando corrigir a rota do abuso com amor. Ao invés da relação dar sinais de melhora, os abusos se transformaram em pesadelos diários e a pressão psicológica e moral passaram a ser regra dentro de um lar que deveria ser um porto seguro.
Fui xingada, maltratada, ameaçada e humilhada criando, infelizmente, uma rotina de sofrimento. Me agarrei à falsa esperança de que o amor pudesse curar o que, na verdade, era abuso. Mas não há cura quando não há respeito. Não há reconstrução possível onde há destruição emocional diária.
A distância entre nós passou a ser questão de segurança para mim e quando decidi avançar na política almejando um cargo maior, ele se reaproximou – não por mim, mas pelo interesse no que eu representava.
E, mais uma vez, me iludi acreditando que a prestatividade dele era real, mas o tempo provou que eu estava errada. Ele continuou a me machucar psicologicamente e a me humilhar moralmente. E, em 2023, ultrapassou todos os limites: me agrediu fisicamente pela primeira vez. Eu tive medo. Tive vergonha e optei por não contar nem para minha família, que já havia entendido o relacionamento abusivo em que eu estava.
Pensando em proteger nossos filhos do trauma de um divórcio e com medo de expor minha vida em público, decidi seguir com medo.
Nos últimos tempos, minha vida ganhou intensidade. Me dividi entre Brasília e meus filhos, entre compromissos e a maternidade. Direcionei todo meu amor para meus pequenos. Sempre fui mãe, mesmo sob ameaças. Mesmo ouvindo gritos e ofensas e sofrendo agressões. Passamos a coexistir no mesmo ambiente, dividindo apenas o mesmo teto. Eu estava sozinha, buscando forças para sair de um relacionamento que nunca deveria ter sido construído. Em 2025 resolvi seguir com minha vida para tentar voltar a ter paz, ele reagiu com ódio e me espancou pela segunda vez, agora com mais intensidade. E finalmente resolvi falar. Tive coragem de procurar a delegacia, de fazer o boletim de ocorrência, o corpo de delito, e pedir uma medida protetiva. Porque não cabe amor onde existe violência.
Eu sobrevivi.
Busquei em Deus a força e a coragem que eu precisava, e agora, finalmente, eu falei. Falei por mim e por todas as mulheres que sofrem em silêncio. Falei porque quero viver feliz, e a felicidade só é possível com paz. Tomei meu primeiro passo para romper de vez esse ciclo. Meu divórcio já foi consumado pela justiça que entendeu os abusos que vivi e me garantiu a guarda dos meus filhos.
A justiça já conhece a minha verdade, e sei que para uma pessoa que só conhece a agressão, falta a ele tentar agredir minha imagem de maneira pública. Vão usar desse infeliz episódio como uma manobra política para tentar abafar os abusos que vivi em troca de desgaste de imagem e eu não vou aceitar isso.
Eu vou resistir assim como eu já resisti aos abusos morais e físicos. Eu sei que tenho a verdade ao meu lado — e mais: tenho minha história, meu trabalho limpo e o apoio de quem sempre me viu com respeito.
Não quero mais carregar essa dor calada. Não quero mais fingir que está tudo bem. Não aceito mais ser abusada, nem física, nem moral, nem psicologicamente. E se você, mulher, estiver lendo isso e vivendo algo parecido, saiba: você não está sozinha. Não tenha medo de denunciar, de pedir ajuda, de buscar sua liberdade.
Hoje, eu começo a escrever um novo capítulo da minha vida. Um capítulo de cura, de força, de dignidade.
Por mim. Pelos meus filhos. Por todas nós.
Marussa
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