A tempestade que vem da Casa Branca

Por Marcus Prado*

Há manifestos históricos dirigidos à consciência livre dos homens que deveriam ser lidos no sentido mais amplo da palavra e seus significados, por todas as pessoas comprometidas com o futuro da ciência em benefício da humanidade. Um corajoso exemplo nesta hora vem dos cientistas ligados às universidades e institutos de pesquisa com a Carta ao Povo Americano em defesa da ciência do país. Quase dois mil pesquisadores que assinaram o manifesto repudiam os cortes no financiamento para pesquisas cometidas pelo empresário e presidente Donald Trump. Todos os signatários são membros eleitos da Academia Nacional de Ciências, Engenharia e Medicina dos EUA, e entre eles vencedores do prêmio Nobel.

A situação assumiu tamanha gravidade (os números esclarecem sem rodeios) que a revista Nature, uma das mais importantes do mundo, realizou uma enquete entre cientistas desse país. O resultado é que 75% dos pesquisadores entrevistados afirmaram que repudiam os atos do presidente, estão repensando as suas carreiras e começam a procurar universidades, laboratórios e centros de pesquisa fora dos Estados Unidos, principalmente a universidade de Columbia, em Nova York. US$ 185 milhões em financiamento federal para a Universidade da Pensilvânia foram cortados, alegando que a instituição “força mulheres a competirem contra homens nos esportes”.

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“Espantosamente, o governo Trump está desestabilizando empreendimentos de altíssima necessidade ao cancelar o financiamento para pesquisa, demitir milhares de cientistas, remover o acesso público a dados científicos e pressionar pesquisadores a alterar ou abandonar seu trabalho por motivos ideológicos”, diz a Carta. Não deu, para o noticiário internacional, detalhar alguns currículos da lista dos quase dois mil cientistas americanos.

Tive a curiosidade de pesquisar alguns nomes isolados por meio das redes virtuais e fiquei convencido de que o objetivo é minar a confiança da população na ciência e remover evidências científicas que possam se contrapor a interesses, não só econômicos. A ordem é dar cortes inimaginados nos 60% dos recursos do governo destinados às universidades.

 Essas instituições requerem vultosos recursos para cumprir suas funções, pois elas geralmente mantêm hospitais universitários, executam numerosos serviços de extensão, formam a elite dos professores do país e nelas são desenvolvidas pesquisas que dependem de insumos e equipamentos sofisticados. Falta de investimentos, bolsas de pesquisa congeladas por nove anos, corte de verba para manutenção de equipamentos nunca foi estranho no Brasil.

Nosso país pode ter perdido cerca de 6,7 mil cientistas nos últimos anos, que foram continuar suas pesquisas no exterior, segundo estimativas do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, veiculado ao Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação. Para nunca esquecer a era nefasta do Brasil, do ditador Getúlio Vargas, quando a ciência voltou a estado primitivo: O pernambucano do Recife Mário Schenberg, visto como o renascentista da ciência brasileira, que tudo lhe seria negado por motivo ideológico, preso, torturado, exilado (seria um dos 5 maiores físicos do século em que viveu), para poder estudar fora do Brasil teve que apelar para o jogo de bicho. Voltaire tinha razão ao dizer que todos os acontecimentos estão encadeados uns aos outros por uma fatalidade.

*Jornalista

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