Injeção de crédito por meio de empréstimo ao trabalhador piora inflação, mas pode frear rejeição a Lula

O governo federal reservou um crédito na praça de até R$ 120 bilhões para trabalhadores formais e Microempreendedores Individuais (MEI) como medida para cobrir R$ 40,4 bilhões em recursos contratados com bancos do setor privado. A medida, chamada de Crédito do Trabalhador, utiliza a fórmula político eleitoral do presidente Lula (PT) desde o seu primeiro mandato, mascara o problema estrutural do corpo industrial brasileiro. Enquanto caminha para a reeleição num contexto de baixa popularidade, ainda falta ao presidente uma solução maior do que a oferta de satisfação temporária ao trabalhador.

A ideia é trocar um crédito mais caro com bancos privados por juros mais em conta com a Caixa Econômica Federal ou o Banco do Brasil. Economistas avaliam que a medida pode manter a trajetória de alta da Taxa Selic, seja por mais tempo ou com índices mais elevados. Para garantir o crédito mais em conta, o trabalhador poderá deixar como garantir até 10% do saldo no FGTS para garantias ou ainda 100% da multa rescisória em caso de demissão.

“A economia brasileira está trabalhando acima do seu limite e passamos por um hiato econômico e isso pode elevar os gastos públicos, por isso vemos uma inflação desancorada”, explica o economista formado pela Pontíficia Universidade, André Luiz Braga. Ele pontua que a inflação corrói a economia tanto do setor público, que toma empréstimos e capta dinheiro de investidores, quanto ao setor privado na captação de investimentos em bancos privados.

Se para a ponta da pirâmide, a medida gera preocupação, para as classes mais baixas, o impacto é sentido nos supermercados, postos de combustíveis e nos impostos. “Aquelas famílias mais vulneráveis passam a ter dificuldade para comprar mesmo com programas como o Bolsa Família pois os alimentos ficaram mais caros”, completa.

Braga lembra que durante os primeiros mandatos do PT, o Brasil vivia um cenário econômico com mais espaço fiscal para medidas mais arrojadas de injeção de dinheiro na praça. “O espaço foi diminuindo por que tanto governantes de esquerda quanto de direita tomaram medidas populistas ao invés de tomar as atitudes que deveriam tomar”, analisa.

Inadimplentes e endividados

A previsão para 2025, de acordo com indicadores da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), Confederação Nacional do Comércio (CNC) e do próprio governo é que o número de inadimplentes e endividados permaneça em alta para 2025, com reflexos também para o próximo ano. Em fevereiro, 41,5% dos brasileiros (66,7 milhões de pessoas) não conseguem pagar as contas enquanto o número de endividados chega a 77%.

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Formado em administração com atuação no mercado financeiro, Rodolfo Gomes explica que a soma desse cenário freia o investimento pois o risco de mercado, crédito e trabalhista pesa na hora de decidir para qual lado irá o dinheiro. “Muitos fazem a conta se vale a pena investir, o que desestimula o crescimento da economia. Vale mais o empresário investir na própria empresa, pegando um dinheiro emprestado para lucrar talvez 25%, 30% ao ano ou fazer uma aplicação financeira?”, comenta.

Rodolfo Gomes explica: cenário freia o investimento pois o risco de mercado, crédito e trabalhista pesa na hora de decidir para qual lado irá o dinheiro | Foto: Acervo Pessoal

Gomes avalia que a economia brasileira não tem se desempenhado de forma tão positiva quanto se esperava, principalmente devido ao fato de o governo ter gasto muito e mal, o que provocou inflação.

Falta de estímulo produtivo

Professor de economia na Universidade Federal de Goiás (UFG), Tiago Camarinha Lopes, pontua que a falta de um projeto de crescimento e estímulo ao setor produtivo consistente e de longo prazo mantém o país numa crise econômica sistêmica e duradoura. “Desde a crise de 20008 o Brasil e as economias do mundo vêm tentando manter ou recuperar uma trajetória de crescimento, mas essa recuperação não tem acontecido. O atual governo tem feito propostas que são muito superficiais e não vê a fundo os problemas estruturais”.

A apreensão, argumenta Camarinha, é menos com a inflação e mais com o processo de desindustrialização que o país passou nas últimas décadas. “A inflação é um problema, é uma questão para se observar o que tem provocado essa inflação tão alta nos últimos anos. A decisão do Banco Central nas últimas reuniões de política montarias tem a justificativa de trazer a inflação pro centro da meta, mas ela é padronizada e não vai a fundo em identificar os verdadeiros problemas que a economia brasileira tem”, relata.

Tiago Camarinha Lopes | Foto: Reprodução

Perspectiva na economia global

O presidente dos Estados Unidos, Donaldo Trump, anunciou, na última quarta-feira, 2, a imposição de tarifa mínima de 10% sobre todos os produtos importados, o que inclui o Brasil. Ao apresentar os detalhes do novo plano tarifário, Trump citou que países como Índia e Tailândia impõe tarifas acima de 70% em motocicletas e apontou que a culpa é de outros presidentes que não responderam à guerra comercial.

A medida reação dos mercados globais, queda do dólar e retaliação de diversos países, entre aliados e adversários históricos. Importações chinesas foram sobretaxadas em 34%, elevando as tarifas totais para 54%, como resposta a práticas comerciais consideradas desleais. Produtos europeus enfrentam tarifas adicionais de 20%.

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Em retaliação, a China impôs tarifas de 34% sobre produtos norte-americanos e implementou restrições à exportação de terras raras, essenciais para diversas indústrias tecnológicas. As medidas tarifárias desencadearam quedas significativas nos mercados globais, com o S&P 500 registrando uma queda de 9% em uma semana, refletindo temores de uma guerra comercial prolongada. ​

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Empresas como a Nintendo pausaram lançamentos de produtos nos EUA devido às incertezas causadas pelas tarifas, evidenciando o impacto direto no setor de eletrônicos de consumo.

Oportunidade ou mudança de aliança

As perspectivas otimistas na economia global, sob a ótica dos especialistas, incluem tanto oportunidades quanto potenciais consolidações de parcerias estratégicas. Camarinha vislumbra uma “luz no fim do túnel” no contexto da transformação geopolítica liderada pelos países do sul global, principalmente pela China

Ele observa que nações que estão integrando projetos de financiamento, especialmente em infraestrutura, com a China e seus parceiros, incluindo o Brasil nos BRICS, têm apresentado desenvolvimento mais sustentáveis e interessantes para o país.

Os dados da economia mundial apontam que aqueles países integrados aos projetos de financiamento global, principalmente os de infraestrutura que a China e seus parceiros comerciais tem implicações para a inserção do Brasil nesse contexto e o Brasil tem tentado se posicionar para viabilizar uma cooperação também com os países da Europa e Estados Unidos.

Por outro lado, Rodolfo Gomes, atuante no mercado financeiro, aponta que a taxação de 10% dos produtos brasileiros anunciada por Donald Trump poderia, num primeiro momento, tender a beneficiar o Brasil.

Isso ocorreria porque, ao encarecer os produtos brasileiros nos Estados Unidos, haveria um incentivo ao consumo de produtos locais, deixando mais produtos brasileiros disponíveis internamente e potencialmente contribuindo para a redução da inflação.

Contudo, Gomes ressalva que, a longo prazo, se as empresas brasileiras exportadoras não encontrarem novos mercados, essa medida poderia desestimular a produção.

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