Soninha Santos
Especial para o Jornal Opção
A primeira edição de “Lili Inventa o Mundo”, do poeta e escritor gaúcho Mario Quintana, foi lançada em 1983, pela Editora Mercado Aberto, de Porto Alegre. Justíssimo, já que Mario Quintana era de lá, mais precisamente, da cidade de Alegrete. Contudo, o belíssimo exemplar que me chegou às mãos em forma de presente é da Editora Global, de 2005, ilustrado pelo Suppa. Grandioso trabalho, inclusive, salta aos olhos a riqueza dos detalhes das ilustrações.
A grandeza poética de Mario Quintana é reconhecida, sem qualquer sombra de dúvida é seria desnecessário e mesmo irrelevante falar a respeito. Ele ocupa um lugar de destaque na poesia brasileira.
Mas este livro é catalogado como infanto-juvenil e transborda tanto leveza quanto singeleza ímpares.
Lili, a voz que fala nos poemas, é uma princesa, dessas habitantes etéreas do reino do luar e das sagradas terras da fantasia. Da imaginação de fato. Lugar enraizado entre o antes, o agora e o depois, lugares acessíveis apenas aos que sonham alto, lugares assim, feito esconderijos na lua, ou outros até, capazes de abrigar qualquer criatura feita para sonhar alto.
Mario Quintana consegue, com seus versos, abrandar a correria diária, resgatar bichos e gentes dos seus afazeres rotineiros e sossegar corações mais afoitos ou tristes com as imagens criadas em seus versos.

Usando de metáforas espetaculares, contornadas de ritmo, repetição, rimas ricas, em meio a tantos outros elementos presentes na lírica, o leitor ou leitora percebe que “na porta a varredeira varre o cisco varre o cisco”, ele pode varrer também outras coisas ou ideias (por que não?) que o incomodam tal qual o cisco, ou o simples ato, hábito chato, de “escovar os dentes”. A gente sim, varre, escova, e o mundo continua a girar. Se a nosso favor ou não, a poesia responde.
A beleza do livro, presente na poesia de Mario Quintana como um todo, é percebida também nos momentos singulares de prosa poética, surreal às vezes, folgo em dizer, como o caso do peixinho em “Velha história “ que, vivendo naturalmente na terra, morre afogado ao ser devolvido para o rio de onde fora tirado. Essa história remete a imagens de pura locação fantasiosa… como assim, um peixinho que sobrevive com um humano fora do seu habitat natural?!
Outras questões bastante recorrentes no jeito Mario Quintana de ver o mundo são imagens de situações e sensações relacionadas ao elemento ar: vento, brisa, por exemplo.
Merece destaque outras recorrências, como a destreza dos versos sutilmente colocados a serviço de quem os lê: “Se a gente pudesse puxar por uma perna um só Grilo, se desfiariam todas as estrelas!” Como assim?
A resposta é simples, basta trazer “Lili Inventa o Mundo”, para “nosso” universo, às vezes tão caótico e padecendo da falta de sensibilidade e ler. Com certeza, você verá refletidas em suas páginas, todas as versões disponíveis para a vida. Poesia faz bem. Poesia oferecida às crianças desde cedo, faz um bem maior ainda.
Vai perder essa chance?
Soninha Santos, crítica literária e professora de literatura infantojuvenil, é colaboradora do Jornal Opção.
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