Bolsonaro responderá a perguntas de Moraes pela 1ª vez no caso da trama golpista

Depois de passar anos atacando o Supremo Tribunal Federal (STF), o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) deve se explicar pela primeira vez ao tribunal sobre sua participação na trama golpista de 2022.Bolsonaro será questionado por Alexandre de Moraes. O ministro do STF foi alvo prioritário das ofensivas de Bolsonaro contra o tribunal. Agora, será o responsável por conduzir o processo que pode levar o ex-presidente à prisão.

Em março. Jair Bolsonaro acompanhou parte do julgamento do STF que o tornou réu por participação na trama golpista de 2022.

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Gustavo Moreno/STF

A Primeira Turma do STF convocou sessões de segunda-feira (9) a sexta (13) para ouvir os oito réus do núcleo central da tentativa de golpe de Estado após a eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).O início da etapa indica que o processo contra o principal grupo denunciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) se encaminha para o seu fim. O ritmo adotado por Moraes para a ação penal, com prazos curtos entre as etapas do processo, tem sido criticado pelas defesas dos réus.O Supremo decidiu alterar a configuração do plenário da Primeira Turma para a fase de depoimento dos réus. O local será adaptado para parecer um tribunal do júri, com os acusados sentados lado a lado.O ministro Alexandre de Moraes ficará sentado na tribuna principal, em cadeira tradicionalmente ocupada pelo presidente do colegiado. Uma fileira de cadeiras será incluída no plenário, entre os ministros e a plateia, para os réus ficarem sentados em ordem alfabética.Será o primeiro encontro de Bolsonaro com o tenente-coronel Mauro Cid desde que o militar fechou um acordo de delação premiada com a Polícia Federal.As revelações de Cid foram o fio condutor da denúncia da PGR. Foi o militar quem confirmou aos investigadores, pela primeira vez, que Bolsonaro convocou os chefes militares para discutir planos para reverter o resultado das eleições.À direita de Bolsonaro estará o general Augusto Heleno, ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e um dos ministros que esteve mais próximo do ex-presidente nos primeiros anos de mandato. À esquerda, o ex-diretor da Abin Alexandre Ramagem vai ombrear o ex-presidente.O primeiro réu a ser ouvido será Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro e delator. Os demais serão interrogados por ordem alfabética: Alexandre Ramagem (deputado federal e ex-chefe da Abin), Almir Garnier (ex-chefe da Marinha), Anderson Torres (ex-ministro da Justiça), Augusto Heleno (ex-ministro do GSI), Jair Bolsonaro, Paulo Sérgio Nogueira (ex-ministro da Defesa) e Walter Braga Netto (ex-ministro da Casa Civil e da Defesa).Os depoimentos serão transmitidos ao vivo pela TV Justiça. As regras estipuladas por Moraes se diferenciam das normas estabelecidas para as oitivas das testemunhas, quando foram proibidas gravações de áudio e vídeo.O ex-presidente Jair Bolsonaro anunciou na sexta (6) que pretende responder às perguntas em seu depoimento, sem recorrer ao silêncio. Ele pediu aos apoiadores que assistam à audiência –chamada por ele de “inquisição”.”O que aconteceu em 2022 com toda certeza será falado por mim, quando ao vivo estiver no Supremo com cinco ministros na minha frente me cobrando, vale a pena assistir”, disse.”Não vou lá para lacrar, querer crescer, desafiar quem quer que seja. Estarei lá com a verdade do nosso lado. Creio que, se Deus quiser, mostraremos para vocês o que é o Brasil e para onde poderemos ir com o povo ao nosso lado”, completou.A maioria dos réus deve falar ao Supremo, segundo quatro advogados consultados pela Folha. A principal dúvida é quanto às condutas do ex-chefe da Marinha Almir Garnier Santos e do ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira.Os réus podem permanecer em silêncio para não criar provas contra si.Na Presidência, Bolsonaro acumulou uma série de declarações golpistas, provocou crises entre os Poderes, colocou em xeque a realização das eleições de 2022, ameaçou não cumprir decisões do STF e estimulou com mentiras e ilações uma campanha para desacreditar o sistema eleitoral do país.Após a derrota para Lula, incentivou a criação e a manutenção dos acampamentos golpistas que se alastraram pelo país e deram origem aos ataques do 8 de Janeiro.Nesse mesmo período, adotou conduta que contribuiu para manter seus apoiadores esperançosos de que permaneceria no poder e, como ele mesmo admitiu, reuniu-se com militares e assessores próximos para discutir formas de intervir no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e anular as eleições.A defesa de Bolsonaro nega a participação do ex-presidente em crimes e argumenta, entre críticas à denúncia da PGR, que não há provas de ligação entre a suposta conspiração iniciada no Palácio do Planalto, em junho de 2021, e os atos de vandalismo de 8 de janeiro de 2023.Bolsonaro e os demais réus foram denunciados por supostamente liderar um plano no fim de 2022 para evitar a posse de Lula à Presidência da República. As principais acusações contra o ex-presidente estão relacionadas à edição de minutas de decreto e tentativa de conseguir apoio dos chefes das Forças Armadas para as iniciativas golpistas.Todos os oito respondem pelos crimes de golpe de Estado, tentativa de abolição do Estado democrático de Direito, associação criminosa armada, dano qualificado ao patrimônio público e deterioração do patrimônio tombado.Parte dos crimes atribuídos aos réus tem relação com os ataques de 8 de janeiro de 2023. Segundo a denúncia, a multidão bolsonarista que invadiu as sedes dos Poderes foi incentivada por Bolsonaro e seus aliados para atentar contra o Estado.Como a Folha mostrou, o STF tenta acelerar o processo da trama golpista para julgar o núcleo principal ainda este ano. O objetivo, dizem ministros nos bastidores, é evitar que o calendário eleitoral de 2026 contamine o julgamento do caso, que tem forte impacto político.As defesas dos réus reclamaram do pouco tempo dado por Moraes entre a fase de depoimento das testemunhas para a etapa de inquirição dos réus. Elas alegam que o ritmo acelerado do processo impede a análise do material apreendido pela Polícia Federal durante a investigação.Os investigadores enviaram para os advogados os arquivos com todas as informações usadas no inquérito da PF sobre a tentativa de golpe de Estado.São 77 terabytes de arquivos digitais. Além da grande quantidade de dados, os advogados relatam dificuldade de manejar o material, que chegou de forma compactada, com documentos corrompidos, e outros cuja senha não foi disponibilizada.

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