A credibilidade é um capital acumulado a duras penas ao longo do tempo. Se é difícil de adquirir, é fácil de perder. Basta um deslize de conhecimento geral para abalar a confiança depositada em um indivíduo, uma instituição ou um governo.
A primeira e contundente defesa do valor da confiança registrada na história reporta-se a Confúcio. Nos “Analectos”, uma coletânea de ensinamentos atribuídos a ele e compilada por seus discípulos, o filósofo chinês predicou, “para governar o povo são necessárias três coisas: comida suficiente, forças militares suficientes e a confiança do povo no governante”.
Se não puder manter todas, que se abandone o armamento.
Se ainda for preciso abandonar mais uma, que se abandone o alimento, pois a morte sempre esteve entre os homens; mas sem confiança, o Estado não pode existir.
Essa passagem mostra o pensamento profundamente ético e humano de Confúcio: a confiança é mais fundamental que até a sobrevivência física, pois um povo que não confia em seus líderes não consegue formar uma sociedade estável ou justa.
É essa confiança que está sendo dilapidada por governos como o do Trump (e muitos outros). Sem entrar no mérito de ser necessário restabelecer o equilíbrio fiscal, que ameaça o Tesouro com um default, mas focando nas práticas de absoluto desrespeito aos acordos assinados e histórico de liderança mundial, com Trump os Estados Unidos perderam a credibilidade.
Depois da revolução de Trump, o mundo nunca mais será igual. A confiança na liderança americana foi violentada.
Não só as relações de governados com governantes dependem de confiança. Sem um clima de confiança a vida pessoal torna-se-ia inviável. Todas as nossas rotinas estão baseadas na confiança. O que faz com que uma pessoa atravesse ruas de muito trânsito só por ter sido ligada a luz verde de um semáforo. Muitas das vezes sem olhar os carros e motos ainda em movimento. Tantas outras vezes bebemos água de uma torneira com tranquilidade acreditando ser água potável.
Os exemplos são infinitos. Estamos condicionados a algumas crenças, que grudaram em nós pelos usos e costumes. O dinheiro emitido por um país é aceito sem pestanejar, ainda que não passe de um papel pintado. O mesmo papel que diz valer cem ou mil, ainda que os dois tenham o mesmo conteúdo de papel, tinta, produção e distribuição, mas diferente valor.
Estamos tão habituados a agir baseado em confiar em nossas relações com o mundo, que não paramos para questionar. Bebemos água que dizem ser tratada, aceitamos moeda a qual atribuímos o valor impresso, obedecemos aos sinais de trânsito como se não falhassem, tomamos vacina que afirmam inocular, sem pensar nas consequências.
Temos o fator confiança como um bem natural (take for granted). Se assim não o fizéssemos estaríamos ilhados na sociedade. Não só não teríamos tempo suficiente para pesquisar cada uma das situações que se nós apresentam, no dia a dia, como não teríamos competência e recursos para pesquisar e validar cada decisão que tomamos.
A nossa credulidade, de tantas experiências bem-sucedidas, nos leva ao ponto da ingenuidade. Somos ingênuos principalmente diante de fatos que vêm de encontro às nossas crenças e interesses. Por paixão a líderes carismáticos acreditamos nas promessas eleiçoreiras. Por ingenuidade acreditamos serem as empresas estatais administradas por humanos sem os vícios e defeitos dos empresários.
Nem exemplos fragrantes da diferença dos resultados entre a empresa privada e a publica convencem a grande massa (os ingênuos) do mal que é a empresa estatal. O serviço de telefonia no Brasil, que era caro, servia mal e dava prejuízo, ao ser privatizado democratizou o uso do telefone, reduziu os custos, paga altos impostos e beneficia os seus investidores.
Independente da ingenuidade das massas, que acreditam no populismo-socializante, não perde atualidade o alerta do filósofo italiano Norberto Bobbio, em sua obra “O Futuro da Democracia”, em que argumenta que a democracia se sustenta em regras do jogo aceitas por todos e, sobretudo, em confiança mútua entre os cidadãos e entre os cidadãos e as instituições. Para ele, sem essa confiança, o funcionamento democrático se deteriora, dando espaço à desinformação, ao autoritarismo e à polarização.
A perda de confiança entre as pessoas torna a vida inviável; assim como a da sociedade nos seus governantes torna-se na maior das ameaças à democracia.
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