Ditaduras deixaram a América do Sul mais dependente dos EUA, diz Belluzzo

No final de 2024, o cineasta Cleonildo Cruz e o economista Luiz Gonzaga Belluzzo foram anunciados como diretores da série de TV Operação Condor, que será coproduzida por emissoras públicas latino-americanas. Não que Belluzzo vá roteirizar o projeto, conduzir a equipe técnica, orientar a filmagem ou definir locações e cenários. “Sobre essas questões, fale com o Cleonildo”, diz ele ao Vermelho.

Dividida em sete episódios, a série – que começa a ser filmada em março – vai investigar crimes cometidos por ditaduras do Cone Sul na década de 1970. Com a Condor, apoiada pelos Estados Unidos, esses regimes criaram uma rede clandestina de inteligência para intensificar a repressão e assassinar opositores que estavam exilados.

Nos EUA, a operação foi inicialmente vendida como “um esforço cooperativo dos serviços de inteligência e segurança de diversos países sul-americanos para combater o terrorismo e a subversão”. O subcontinente estava tomado por generais-ditadores que usavam a “ameaça comunista” como justificativa para governar à base da exceção e do terror.

Na visão de Belluzzo, para além da geopolítica, a Operação Condor teve “dimensões econômicas”. Daí sua participação na série – mais como consultor do que diretor. “Vamos lembrar que todas essas ditaduras eram, sim, militares – mas também eram liberalóides”, afirma o economista. “Todo esse processo embute a dependência extrema dos EUA – uma dependência que se agravou.”

Da Oban à Condor

Lançada pelo Chile do ditador Augusto Pinochet em 1975, a Condor contou com a adesão, em diferentes níveis, de Argentina, Bolívia, Brasil, Equador, Paraguai, Peru e Uruguai. Segundo Belluzzo, “foi tudo organizado pela inteligência norte-americana, que mandava agentes para esses países”.

Antes da Condor, porém, o Brasil já recebia esses agentes. “Eles vinham ao País para ensinar técnicas de tortura nos tempos da Operação Bandeirante (Oban).” Deflagrada em 1969, logo após o Ato Institucional Número Cinco (AI-5) e na reta final da gestão Costa e Silva (1967-1969), a Oban escalou a repressão, à margem da lei, sob o governo Emílio Garrastazu Médici (1969-1974).

Se a Oban perseguiu, prendeu, torturou e matou adversários do regime que estavam dentro do País, a Operação Condor foi atrás de brasileiros que estavam em países vizinhos. No episódio sobre o Brasil, intitulado Memória, Verdade e Justiça, a série sustentará que Juscelino Kubitschek e João Goulart foram assassinados a mando do regime militar. Os dois ex-presidentes morreram em 1976, durante o governo Ernesto Geisel (1974-1979).

Àquela altura, o continente estava às voltas com uma transição. A maioria dos países sul-americanos registrava índices elevados de crescimento nos anos 70. O Brasil, por exemplo, viveu o chamado “milagre econômico”, com seu PIB (Produto Interno Bruto) saltando 11,9% em 1972 e 14% em 1973.

No entanto, quando explodiu a crise do petróleo – um choque que fez o preço do barril quadruplicar de 1973 para 1974 –, as economias da região foram abaladas, assim como a norte-americana e a europeia. “Para continuar a crescer, a aposta das ditaduras militares foi no endividamento – mas no endividamento público ruim, com moeda estrangeira. Quem resolveu se endividar em dólar pagou caro”, explica Belluzzo.

“Década perdida”

O estopim foi outro choque econômico, o dos juros, imposto, desta vez, pelo Fed (Federal Reserve, o Banco Central norte-americano). Na virada para os anos 80, os EUA começaram a elevar a taxa de juros, que chegou a mais de 20% em 1981.

A dívida externa dos países sul-americanos explodiu, culminando numa “década perdida” marcada por recessão, fiscal e hiperinflação. Vários governos tiveram de decretar “moratória” da dívida para evitar o colapso. “No Brasil, o financiamento em dólar produziu 14 anos de hiperinflação.”

O longo ciclo recessivo e a alta dos preços minaram a credibilidade dos regimes, que perderam o apoio de setores empresariais e se tornaram cada vez mais impopulares. Assim, em meio à instabilidade econômica – e mais dependente dos EUA –, o Cone Sul viveu uma onda de redemocratização.

Confira quais serão os sete episódios da série Operação Condor:

  • Chile – Pablo Neruda
  • Brasil – Memória, Verdade e Justiça
  • Argentina – Explosões de Automóveis
  • Uruguai – Voos da Morte
  • Paraguai – Ossadas de Desaparecidos
  • Bolívia – Desaparecimentos Forçados de Pessoas
  • Peru – Conexão Europa

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