Ex-agente uruguaio quer prestar depoimento sobre morte de João Goulart

O ex-agente do serviço de inteligência do Uruguai, Mário Neira, declarou que deseja prestar um depoimento oficial sobre a morte do ex-presidente brasileiro João Goulart, conhecido como Jango, assim que a Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos reabrir o caso. Goulart governou o Brasil de 1961 até ser deposto pelo golpe militar de 1964. Exilado na Argentina, morreu em 6 de dezembro de 1976, na cidade de Mercedes, com a causa oficial atribuída a um ataque cardíaco.

Segunda o colunista Jamil Chade, do UOL, Neira, que monitorou Goulart entre 1973 e 1976, afirmou desde 2008 que o ex-presidente teria sido envenenado. A declaração foi feita ao filho de Jango, João Vicente Goulart, e ao diretor Cleonildo Cruz, que trabalha na produção de uma série sobre a Operação Condor, rede de cooperação entre as ditaduras do Cone Sul.

Monitoramento e conspiração

Mário Neira foi designado pelo governo uruguaio para vigiar Jango e instalar escutas na fazenda onde ele morava no exílio. Em depoimento ao documentário “Operação Condor: Verdade Inconclusa”, de 2015, Neira revelou que Goulart era visto como uma ameaça pelo regime militar brasileiro devido à sua capacidade de articular alianças políticas.

“Jango se tornou perigoso para o regime porque ele aglutinava pessoas com poder político de diversas correntes. Sua participação em um plano de retorno ao Brasil era vista como uma ameaça. O governo militar não considerava o momento propício para o seu retorno”, afirmou o ex-agente.

Segundo Neira, a execução teria envolvido a troca de medicamentos de Goulart por comprimidos envenenados. Ele também relatou que foram feitas manobras para impedir a realização de uma autópsia. “Tivemos que nos ocupar da permanência de Jango por 48 horas, no mínimo, para evitar que a autópsia fosse feita”, disse.

Repercussão e busca por justiça

A disposição de Neira em depor foi bem recebida por João Vicente Goulart, que defende a reabertura do caso. “O caso João Goulart não está finalizado. Ele está aberto na Justiça do Rio Grande do Sul. Não é aceitável que a Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos investigue a morte de Juscelino Kubitschek e ignore a de Goulart”, declarou.

O diretor Cleonildo Cruz também enfatizou a importância do depoimento do ex-agente. “Neira se comprometeu a depor assim que o caso de João Goulart for reaberto pela Comissão”, afirmou. A série sobre a Operação Condor contará com sete episódios e direção também de Luiz Gonzaga Belluzzo. O projeto abordará os assassinatos de João Goulart e Juscelino Kubitschek, além de outros casos emblemáticos da repressão na América Latina.

Passado controverso

Neira já foi alvo de operações da Polícia Federal no Brasil e possui um histórico criminal. Ele foi preso em diversas ocasiões, incluindo uma detenção em 2003 na Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (RS). Em entrevista à Folha de S.Paulo, ele detalhou como Jango foi espionado 24 horas por dia e reafirmou que a ordem para sua morte partiu do então delegado do DOPS, Sérgio Paranhos Fleury, sob autorização do presidente Ernesto Geisel. Segundo ele, a operação teria sido acompanhada e financiada pela CIA.

O plano, segundo Neira, consistia em inserir cápsulas envenenadas nos medicamentos do ex-presidente, de forma a simular um ataque cardíaco. “As cápsulas eram misturadas aos remédios no Hotel Liberty, em Buenos Aires, na fazenda de Maldonado e no porta-luvas de seu carro”, relatou. Apesar das graves acusações, Neira não apresentou provas documentais, afirmando que o caso era tratado pessoalmente entre os envolvidos.

A possibilidade de uma reabertura oficial do caso de João Goulart reacende o debate sobre os crimes cometidos durante a ditadura militar e a necessidade de justiça e transparência histórica.

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