PF revela conexões entre produtoras de funk e PCC

A Polícia Federal (PF) concluiu uma investigação que durou quase três anos e expôs a ligação entre uma das maiores produtoras de funk do Brasil e integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC). O relatório final da Operação Latus Actio apontou que empresários do ramo musical lavavam dinheiro do crime organizado e exploravam atividades ilegais, como loterias clandestinas e agiotagem.

A investigação começou após um agente federal ouvir uma conversa suspeita em uma padaria no Alto de Pinheiros, na zona oeste de São Paulo. O comerciante Bruno Amorim de Souza mencionou que estava “fazendo umas fitas do progresso”, expressão usada pelo PCC para se referir ao tráfico de drogas.

A partir dessa pista, a Força Integrada de Combate ao Crime Organizado (FICCO) aprofundou as investigações e identificou um esquema de lavagem de dinheiro dentro da indústria do funk. Entre os principais envolvidos, está o empresário Henrique Alexandre Barros Viana, conhecido como Rato da Love Funk.

Segundo a PF, ele tinha como sócios para venda de shows e promoção de artistas figuras de alto escalão do PCC. O relatório da PF apontou que Gratuliano de Sousa Lira (Quadrado), Moisés Teixeira da Silva (Careca ou Tatuzão) e Márcio Geraldo Alves Ferreira (Buda) eram parceiros de negócios de Rato da Love Funk.

  • Gratuliano Lira (Quadrado): condenado a 11 anos de prisão por lavar dinheiro do PCC, movimentando R$ 1 bilhão em tráfico de drogas.
  • Moisés Teixeira (Tatuzão): um dos líderes do famoso furto de R$ 164 milhões do Banco Central de Fortaleza em 2005.
  • Márcio Ferreira (Buda): possui uma extensa ficha criminal e está preso na Penitenciária de Presidente Venceslau 2, onde ficam as lideranças do PCC.

Além deles, a investigação também cita Ronaldo Pereira Costa, preso pela PF por envolvimento em execuções de líderes do PCC e tráfico internacional de drogas.

A PF constatou que, entre 2023 e 2024, a produtora Love Funk Shows Ltda. recebeu recursos de origem ilícita. Segundo o relatório, Rato da Love Funk e sua esposa Daniella Cristian Vianna administravam empresas que movimentaram milhões sem declaração de impostos.

Os números:

  • A empresa Formato Funk Agenciamento Musical movimentou R$ 173 milhões entre 2022 e 2023, um crescimento de 26.000% em apenas três anos.
  • A Receita Federal autuou Rato em R$ 11,5 milhões por sonegação fiscal.

As investigações revelaram mensagens de WhatsApp que mostram Rato da Love Funk discutindo com membros do PCC sobre a gestão de artistas e divisão de lucros. Conversas indicam ameaças e uso do tribunal do crime para resolver conflitos no setor musical.

Em uma das mensagens, Rato reclama com Moisés Tatuzão sobre um preso chamado “Bahia” que estaria “tentando roubar nossa brisa”. Moisés responde que dentro da cadeia as questões são resolvidas de outra forma.

Outra conversa entre Rato e um criminoso identificado como Dog menciona a compra de 60% da carreira de DJ WN, evidenciando a influência do crime organizado na gestão de artistas de funk. Outro nome citado na investigação foi o empresário Rodrigo Inácio de Lima Oliveira, dono da GR6 Eventos, a maior produtora de funk do país.

Embora a PF não tenha encontrado provas concretas de envolvimento com o PCC, indícios de proximidade levaram ao seu indiciamento por lavagem de dinheiro. A GR6 apareceu em 321 comunicações suspeitas ao Coaf entre 2019 e 2023, e Rodrigo recebeu multas de R$ 43,9 milhões da Receita Federal por sonegação de impostos.

Além dos empresários, a PF indiciou MCs e influenciadores digitais por promoverem loterias clandestinas. Essas apostas ilegais eram um dos mecanismos usados para lavar dinheiro do crime organizado dentro do universo do funk.

Posicionamento dos citados

Bruno declarou-se inocente, assim como Gugu da GR6 e Vítor Hugo. Já Jônatas permaneceu em silêncio durante seu depoimento e se recusou a fornecer a senha de seu celular. A reportagem do Estadão não conseguiu contato com a defesa de Wesley Alemão.

De acordo com a Polícia Federal, em uma tentativa aparente de “regularizar” suas atividades, Wesley Alemão passou a realizar os sorteios de suas rifas por meio de uma parceria com a empresa VIACAP. A defesa de Veronezi, bem como a de MC Ryan e do influenciador Buseira, também não foi localizada.

O advogado criminalista José Luís Oliveira Lima, responsável pela defesa do empresário Rogério Inácio, afirmou que “a GR6 é a maior produtora de música urbana da América Latina, gerando mais de 200 empregos diretos e indiretos e contando com um casting de mais de 120 artistas ativos”.

Segundo ele, a empresa oferece suporte e capacitação profissional a jovens da periferia, auxiliando-os na construção de suas carreiras. Oliveira Lima também destacou que “Rodrigo Inácio de Oliveira é um homem de reputação ilibada” e acrescentou:

“A investigação demonstrou sua conduta correta. No início, houve especulações infundadas que logo foram descartadas. Qualquer questão tributária será resolvida pela GR6 e seu sócio”.

A defesa de Muller de Souza não se manifestou. A reportagem também não conseguiu contato com as defesas de Bahia, Buda, Moisés, Gratuliano, Costa, Daniella e do Rato da Love Funk. No entanto, teve acesso aos depoimentos do empresário e de sua esposa à Polícia Federal, nos quais ambos negaram ter outros sócios nas empresas do Grupo Love Funk.

O Rato da Love Funk afirmou que Gratuliano apenas o auxilia em seus investimentos em Cajazeiras. “Ele é meu amigo de longa data. Um dia, ele me apresentou uns investimentos que achei interessantes. Perguntou: ‘Vamos criar uns bois?’. Eu topei, fui lá ver. Mas, para isso, precisei comprar terras. Ele já tinha umas da família, e eu comprei as minhas. Ele tem uns bois lá também, junto com a família dele.”

Essa é a mesma versão apresentada por Gratuliano em seu depoimento. Quanto a Moisés, o empresário disse que o conheceu no bairro onde morava. “A gente é amigo do bairro, entendeu?”. Ele negou que Moisés seja seu sócio, mas afirmou que ambos têm planos de formar uma sociedade.

“Ele me ajudou, colocou artistas meus numa série famosa da Netflix, colocou música minha lá. Ele é um cara inteligente, e estou tentando trazê-lo para o meu lado, até mesmo como sócio.”

Rato da Love Funk também revelou que pretende incluir Moisés na sociedade da Portuga Records. “Vou colocá-lo porque ele sabe cuidar das coisas, fazer acontecer.” Moisés, por sua vez, negou ser sócio do empresário ao prestar depoimento à PF.

Sobre Costa, Rato da Love Funk afirmou que o conhece desde criança e que ele chegou a morar em sua casa por um tempo. “A gente tem carinho por ele. Independente do que ele esteja envolvido, não sei se é culpado ou não.”

Em relação a Buda, o empresário disse não ter vínculo de amizade ou negócios com ele, embora tenha recebido um recado vindo da prisão. Segundo ele, no meio do funk, “geralmente um artista estoura, explode, e aparece alguém dizendo que é dono dele”. Ele acredita que foi isso que motivou as ameaças recebidas.

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