Arrecadação federal é recorde em 2024, mas mercado quer mais cortes de gastos

A Receita Federal anunciou que a arrecadação do governo federal em 2024 alcançou a marca histórica de R$ 2,709 trilhões, um crescimento real de 9,6% em relação a 2023. Este valor, ajustado pela inflação medida pelo IPCA, consolida um ano de forte expansão econômica e aponta para uma melhora na eficiência tributária, impulsionada pela retomada de setores produtivos, aumento da massa salarial e ajustes na tributação de grandes rendas.

Para o secretário especial da Receita, Robinson Barreirinhas, o resultado reflete o impacto positivo de políticas econômicas recentes e a recuperação de setores antes estagnados. Barreirinhas destacou que o governo buscou maior justiça tributária ao focar na fiscalização de grandes patrimônios e na inclusão de rendas passivas no sistema tributário. “Trabalhamos para trazer para a tributação aqueles com patrimônio de centenas de milhões de reais que nunca recolheram”, enfatizou.

Os setores de comércio atacadista, entidades financeiras e combustíveis lideraram o crescimento da arrecadação, com alta expressiva também no recolhimento do PIS/Cofins e no IRRF sobre rendimentos de capital. Esses dados reforçam o papel da retomada econômica e do aumento da formalização no mercado de trabalho, com o desemprego em mínima histórica e um aumento real da massa salarial de 11,78%.

Contradições na política monetária

O economista Marcelo Fernandes (UFRRJ)

Apesar do desempenho positivo, a relação entre o crescimento econômico, a arrecadação recorde e a política monetária do Banco Central levanta críticas. O economista Marcelo Fernandes, da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), vê no cenário atual uma oportunidade perdida para alinhar política fiscal e monetária em prol do desenvolvimento econômico.

“Esse resultado mostra que há um esforço fiscal relevante por parte do governo, algo que deveria acalmar o mercado financeiro. Mas, para esse mercado, não basta arrecadar mais do que gasta; eles querem cortes de gastos, independentemente de suas implicações sociais ou estratégicas”, critica Fernandes.

O economista também aponta para a rigidez do sistema de metas de inflação, que permanece como um entrave ao crescimento econômico. “A inflação está acima do teto da meta, mas isso não justifica a manutenção de juros altos. Essa lógica é suicida, porque ignora a necessidade de flexibilizar o sistema. Precisamos ampliar o intervalo da meta inflacionária e repensar os critérios de política monetária”, defende.

O peso dos juros altos

Embora o governo tenha demonstrado compromisso com a responsabilidade fiscal, os juros altos impostos pelo Banco Central continuam a penalizar a economia real. Para Fernandes, o Banco Central permanece refém de uma visão antiquada de controle inflacionário, priorizando cortes de gastos públicos em vez de estimular setores produtivos.

Enquanto países como os Estados Unidos e a União Europeia revisam seus modelos de política monetária para incorporar maior flexibilidade, o Brasil insiste em manter taxas de juros que sufocam o investimento e a geração de empregos. “É uma contradição gritante manter juros elevados quando a própria arrecadação comprova que a economia está em recuperação”, argumenta o economista.

Os impactos dessa postura já são visíveis em setores como o imobiliário e o automotivo, que mostram recuperação forte após anos de estagnação. Fernandes alerta que, sem uma redução mais assertiva na taxa Selic, o Brasil corre o risco de frear sua recuperação econômica em 2025.

Caminhos para a sustentabilidade econômica

Além da crítica à política monetária, a arrecadação recorde reacende o debate sobre o uso estratégico dos recursos fiscais. Barreirinhas destacou o papel de uma Receita Federal mais orientadora e menos repressiva, mas Fernandes acredita que é preciso ir além.

“O esforço para incluir grandes patrimônios na base tributária é um avanço, mas isso precisa ser parte de um projeto mais amplo de reforma tributária e incentivo ao investimento produtivo. O Brasil tem potencial para liderar setores como energia limpa e tecnologia, mas para isso é necessário que as políticas fiscal e monetária trabalhem em harmonia”, analisa.

Com um cenário fiscal mais favorável, o Brasil pode se posicionar de forma mais competitiva no mercado global, mas isso exige uma política de juros alinhada às necessidades do desenvolvimento nacional. Para Marcelo Fernandes, o momento pede coragem política e visão estratégica. “Não podemos permitir que a lógica de cortes e juros altos prevaleça sobre o desenvolvimento econômico. É hora de abandonar velhos paradigmas e construir uma política que favoreça a produção e a inclusão social”, conclui.

A arrecadação recorde de 2024 destaca o potencial da economia brasileira e os esforços do governo em consolidar sua base fiscal. No entanto, as contradições entre as políticas fiscal e monetária limitam o aproveitamento pleno desse momento. Enquanto a arrecadação comprova os efeitos positivos da retomada econômica, a manutenção de juros elevados ameaça comprometer os avanços conquistados, reforçando a necessidade de uma reforma mais ampla e alinhada às demandas do país.

O post Arrecadação federal é recorde em 2024, mas mercado quer mais cortes de gastos apareceu primeiro em Vermelho.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.