Ânsia familiocrática de Bolsonaro coloca sua sobrevida política na corda bamba

Soou, no mínimo, intrigante o tom que o ex-presidente Jair Bolsonaro adotou em uma entrevista concedida à CNN Brasil, na última quinta-feira, 23. Interpelado pela jornalista Débora Bergamasco, o ex-chefe do Executivo federal desfiou uma série de críticas – algumas sutis, outras nem tanto – a lideranças da direita hoje tidas como possíveis candidatos ao Palácio do Planalto em 2026. A cada nome citado por Bergamasco, de Tarcísio de Freitas, passando por Romeu Zema até Ronaldo Caiado e Gusttavo Lima, as reações incluíam algum reconhecimento seguido de “mas…”. No entanto, quando nomes de membros da família Bolsonaro foram trazidos à tona, choveram elogios por parte do ex-presidente sem nenhum retoque.

Os comentários em relação a nomes da direita foram uma resposta ao questionamento da jornalista do porquê da afirmação de Jair Bolsonaro de “não existir oposição [à esquerda e ao PT]” sem ele. E é daí que surge a incoerência da postura do ex-mandatário. Bolsonaro está inelegível até 2030. Ele não poderá concorrer ao Planalto no ano que vem, e sabe disso. Indiciado em três inquéritos, o próprio ex-presidente disse acordar todos os dias com a “sensação de ter a Polícia Federal” em sua porta. Ou seja: Bolsonaro está fora do jogo eleitoral e corre o risco de ser preso a qualquer momento, mas, ainda assim, se agarra ao delírio de que a direita no Brasil deixa de existir sem ele.

Ao menosprezar lideranças como Tarcísio, Zema e Caiado e enaltecer seu filho Flávio e sua esposa Michelle – duas figuras sem qualquer capilaridade e poder de articulação – como “grandes nomes” da política e os únicos com potencial para a disputa que se avizinha, Bolsonaro não só adere a um jogo perigoso que mina chances de alianças futuras e que podem ser decisivas para 2026, como confirma a constante crítica de opositores: a de que ele “defende a família, mas somente a sua própria”.

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Dizer que o governador Goiás “não tem nome” fora de seu estado, como fez Bolsonaro, pode ser lido como ingenuidade por alguns, e para outros como sinais de preocupação de sua parte. Afinal, Caiado tem sido notícia semanalmente em veículos de imprensa nacionais, ganhando um status de “porta-voz” dos governadores de oposição ao governo Lula. É a Caiado, por exemplo, que os jornais de circulação nacional mais tem recorrido quando o assunto é PEC da Segurança e Reforma Tributária, uma vez que são as críticas do governador goiano que vem sendo endossadas por outros governadores e analisadas pelo governo federal.

A projeção dada ao governador, por óbvio, sinaliza o nível de atenção que sua pré-candidatura tem ganhado. O político tem levantado a bandeira de “nome da direita do diálogo”, título que agrada uma parte expressiva do eleitorado cansado do radicalismo ideológico apregoado nos últimos anos. E isso, para Bolsonaro, não é bom.

A questão é que Bolsonaro não é candidato e não tem candidato para 2026. O ex-presidente parece ensaiar uma tentativa de impor o nome de Michelle como alternativa, o que pode ser outro tiro no pé. No cenário espontâneo do levantamento divulgado pelo instituto Paraná Pesquisas na segunda-feira, 13 de janeiro, a ex-primeira-dama aparece em 9º lugar, sendo citada por 0,4% dos entrevistados, atrás de Lula, Bolsonaro, Tarcísio, Ciro Gomes, Pablo Marçal, Caiado, Eduardo Bolsonaro e Gusttavo Lima.

O ex-presidente parece esperar que alguma liderança se curve diante dele para que, assim, ele possa apoiá-la. O que não vai acontecer. A direita, ao que tudo indica, já entendeu que o apoio de Bolsonaro ajuda, mas não decide (não à toa o ex-presidente elegeu somente 36 dos 96 candidatos a prefeito aos quais declarou apoio em visitas nas cidades. Em Goiânia, por exemplo, o candidato com o qual subiu no palanque ao menos três vezes foi derrotado). Só resta o próprio ex-presidente entender isso.

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