Legendários não quer impor modelo obsoleto de masculinidade, diz fundador do movimento


Movimento cresce no Brasil ao unir pregações religiosas e desafios físicos. Ao g1, Chepe Putzu fala sobre objetivos dos eventos e rebate críticas de elitismo e machismo. Legendários não quer impor modelo obsoleto de masculinidade, diz fundador do movimento
O movimento Legendários tem ganhado cada vez mais visibilidade no Brasil. A ideia é unir pregações religiosas com atividades físicas intensas. Muito se fala dos famosos que participam dos eventos na natureza (Thiago Nigro, Eliezer e Neymar pai, por exemplo) e dos valores das incrições (de R$ 450 até mais de R$ 81 mil), mas quais seus objetivos? Como não reforçar estereóticos de masculinidade? Como se adaptar ao Brasil?
Para conseguir respostas para essas e outras perguntas, o g1 foi atrás de Chepe Putzu, criador do movimento. O pastor nasceu na Guatemala e hoje mora em Miami, nos Estados Unidos. Na entrevista abaixo, ele disse que os Legendários são “uma resposta à crise emocional, social e espiritual que muitos homens vivem”. Para ele, há uma “dívida” masculina com a sociedade.
Putzu também rebate críticas de elitismo e machismo. Ele diz que os Legendários se adaptam a todas as regiões, classes sociais e capacidades físicas. “O movimento procura restaurar aqueles valores profundos que foram perdidos ou distorcidos ao longo do tempo”, ele comenta. “Queremos que todos possam participar, por isso as sedes locais têm auxílio para que as pessoas possam vir.”
Chepe Putzu, líder do movimento Legendários
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g1 — Em poucas palavras, o que é o Legendários e quais os objetivos do movimento?
Chepe Putzu — Legendários é um movimento de homens que busca restaurar o desenho original do homem: um líder que ama, honra e une. É daí que vem o nosso lema “AHU”: um novo nível de Amor, de Honra e de Unidade. É isso que propomos à sociedade e o objetivo que temos é promover essas virtudes, como virtudes esquecidas e fundamentais para formar o caráter do homem.
Isso se baseia em princípios cristãos, porque o que o movimento busca é resgatar e restaurar essa essência do homem como líder, mas também do homem como ajuda, como servo dentro de sua família e dentro de toda a sociedade Descobrimos que a necessidade do homem nos Estados Unidos é a mesma necessidade do homem que está na Patagônia, é a mesma necessidade do homem queé aquele que está na Europa e no Japão.
g1 — Como o Legendários se adapta às diferentes particularidades sociais, realidades econômicas e aspectos culturais do Brasil?
Chepe Putzu — O movimento Legendário se adapta, porque reconhece o Brasil real. Não é aquele idealizado dos discursos acadêmicos ou das ideologias externas, mas sim que abrange muitas regiões, pois em todo o país vemos que o homem passa por um colapso emocional, social e espiritual. De fato, os homens cometem mais suicídio, são mais presos, abandonam a escola com mais frequência, param de ir à escola muito mais rápido e são mais suscetíveis ao uso de drogas.
Se eu pudesse dar alguns dados, diria para você analisar que 78% das mortes, segundo a OMS, são cometidas por homens e entre os jovens com menos de 30 anos, 80% desses casos são cometidos por homens. O sistema penitenciário, as pessoas que estão presas, de todos que estão presos, 95% no Brasil é formado por homens. 91% dos assassinatos que ocorrem nas ruas do Brasil são cometidos por homens, então veja a dívida que temos.
O homem está em dívida com a sociedade, está em dívida com a esposa, está em dívida com os filhos. Se pararmos para pensar, eles estão em dívida consigo mesmos quando consomem drogas… os homens consomem mais drogas ilícitas do que as mulheres, aliás a Fiocruz tem uma estatística que diz que 70% dos que são internados em um centro de reabilitação ou terapêutico são homens. Diante de tudo isso, como eu posso dizer que não estamos em dívida com a sociedade? Onde a cultura do cancelamento rotula, vemos que Legendários restauram; onde a economia exclui, o movimento empodera; onde a desigualdade moraliza, os Legendários humanizam.
g1 — As pessoas são diferentes e possuem limites diferentes para determinadas atividades físicas. Como isso é levado em conta no movimento?
Chepe Putzu — Bem, esta é uma pergunta muito boa. No Legendários não se trata de desempenho físico, mas sim de pequenos testes ao longo do caminho. O que fazemos é desafiar o seu corpo, mas também o seu espírito. Mas temos protocolos de segurança. Aqui no Brasil eles estão prontos para que os participantes sejam atendidos em caso de alguma necessidade.
Aliás, isso é importante porque nenhuma pessoa pode participar sem um atestado específico de um médico confirmando o estado de saúde dessa pessoa, incluindo um teste de esforço físico para poder participar do nosso TOP, o Track Outdoor de Potencial. O mais importante nos Legendários não é a competição, mas a introspecção. Muitos nos perguntam se isto é uma competição. Não, não, não, não é uma competição, é um processo de introspecção, para que possam olhar para dentro e cada um vive a experiência de acordo com a capacidade que essa pessoa tem de se desenvolver.
Evento do movimento Legendários
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g1 — Como foi seu contato com Thiago Nigro, Eliezer e Neymar pai? Em que medida é importante, para promover o movimento, ter famosos participando?
Chepe Putzu — Em relação à divulgação, se pedimos que pessoas ‘famosas’ compareçam ao evento? Não, não existe essa intenção, na verdade eu estava com o Thiago Nigro e passamos por um TOP nos Estados Unidos, só que nunca soube que ele era o ‘Thiago Nigro’, ele não estava na minha cabeça, não o conheci assim até o final. O pessoal e a equipe me disseram que ele é uma pessoa que tem muitos seguidores no Brasil, mas o impacto se torna tão grande do que essas pessoas vivenciam que elas se dedicam a falar sobre o que vivenciaram, começam a viralizar isso, porque foi tão grande… e eu sempre digo isso: ‘só uma pessoa impactada pode impactar’. Só uma pessoa chocada fala sobre isso e comenta isso, só uma pessoa surpresa pode falar sobre algo assim, como esses homens chegaram.
Mas a verdade é que qualquer outro homem veio em busca de respostas e o que vivenciaram foi tão real que decidiram compartilhá-lo publicamente. Claro que isso nos deu muita visibilidade, mas o crescimento de Legendários não depende de celebridades, depende de relacionamentos. O pai quer que o filho vá, a esposa quer que ele vá… quando ela fica sabendo pela amiga que o marido foi… o que acontece é tão bom que eles começam a viralizar entre si, convidando o amigo, convidando… todo mundo quer que outros vivenciem o processo.
Então, não, não buscamos a exposição de tudo isso, mas acreditamos que os depoimentos inspiram outros para que possam viver o seu próprio processo e esta situação também nos ensina que os homens além da sua fama literal, da sua influência nas suas redes sociais, procuram a mesma coisa: encontrar o seu propósito, conhecer o Legendário Número 001.”
g1 — Como o movimento busca incluir homens de diferentes contextos socioeconômicos? Há quem critique o movimento por ele ser visto como ‘uma forma de elitismo religioso’. Como responde a essas críticas?
Chepe Putzu — Na realidade, o movimento procura incluir todos os tipos de homens. Queremos que todos possam participar, por isso as próprias sedes locais têm bolsas, têm auxílio para que as pessoas possam vir e participar. Temos alguns custos, os custos que a gente tem cobrem logística, cobrem transporte, segurança e despesas operacionais diversas. Já tivemos homens de todas as classes sociais e isso é algo que gosto muito, ver como diferentes tipos de pessoas podem compartilhar e sair, entrar como estranhos e sair como irmãos, abraçando-se, quebrando todas as barreiras e isso é impressionante, porque o coração do movimento é este: servir uns aos outros. Agora somos mais de cem mil homens e a maioria desses homens são comuns, como você, como eu, como todo mundo.
Participantes do Legendários acompanham discurso durante evento do movimento cristão para homens
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g1 — Como o movimento colabora com outras organizações e iniciativas locais no Brasil para promover um impacto positivo no país?
Chepe Putzu — O movimento colabora com diversas instituições, porque trabalhamos de mãos dadas. A carga é tão pesada que não conseguiríamos fazer isso sozinhos. Então, trabalhamos com igrejas, com fundações, com líderes locais que compartilham essa mesma visão de transformação e sempre dizemos isto: estamos prontos para responder em momentos de crise. Porque ensinamos que quando há uma necessidade em algum lugar, uma dor, uma doença, deve haver um Legendário lá para ser capaz de resolvê-la. O mais incrível é que se formou essa comunidade de ajudar os outros sem a necessidade de buscar reconhecimento, curtidas ou que lhe digam “parabéns”.
O que vivemos nas montanhas se torna uma transformação real nas comunidades e é orgânico. Ninguém diz: “Vocês têm que fazer de uma forma mais estruturada”. Realizamos algumas ações que distribuindo alimentos, por exemplo, em um lugar chamado Rio Grande do Sul. Aconteceu uma coisa muito forte, uma catástrofe… o que fizemos? Conseguimos levar 4.500 toneladas de alimentos. Não só nós os enviamos, mas as autoridades daquela região ficaram felizes porque os homens não estavam apenas carregando e entregando, e sim distribuindo e apoiando emocionalmente as pessoas que passaram por esse grande sofrimento que aconteceu no Brasil.
g1 — Para você, é possível seguir tudo o que é proposto no movimento sem reforçar estereótipos de masculinidade? O que dizer para quem acha que o movimento é machista?
Chepe Putzu — Não, o movimento não é machista. O movimento não quer impor um modelo obsoleto de masculinidade, mas sim restaurar aqueles valores profundos que foram perdidos ou distorcidos ao longo do tempo. Quem acusa Legendários de ser machista é respondido com calma, com serenidade, o machismo se impõe, oprime e desvaloriza, mas Legendários não nos ensina a dominar, mas sim a servir. Não promove a superioridade, mas sim a responsabilidade, promove o amor ao próximo. Não se trata de poder para si mesmo, não, não, não, não se trata de poder aqui, mas de poder para poder ajudar, prover, para liderar e liderar com amor.
Evento do movimento Legendários
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