A vida das gêmeas Kiraz e Aruna tocou muitos corações. Elas nasceram siamesas, unidas pelo tórax, abdômen e bacia. Essa condição rara demandou uma complexa cirurgia de separação. O procedimento, realizado em Goiânia, mobilizou uma vasta equipe médica. Mais de sessenta profissionais atuaram por dezenove horas. O Sistema Único de Saúde (SUS) custeou toda a operação.
A família, em especial a mãe, compartilhava a jornada nas redes sociais. O perfil @kirazaruna no Instagram cresceu rapidamente. Ele acumulou mais de oitenta e um mil seguidores. O carinho e a torcida eram evidentes. Contudo, a cirurgia trouxe um desfecho doloroso. Kiraz, com um ano e seis meses, não resistiu às complicações. Ela faleceu dias após o procedimento. Aruna, por sua vez, segue internada. Ela está na UTI, sob cuidados intensivos. Seu estado é considerado grave.
A notícia do falecimento de Kiraz gerou grande comoção. As redes sociais se encheram de mensagens de pesar. Muitos expressaram solidariedade à família. O médico Zacharias Calil, responsável pela cirurgia, lamentou a perda. Ele descreveu o ocorrido como algo “doloroso”. Para ele, era como perder um familiar. Isso demonstra o impacto humano de tais decisões.
Entretanto, nem todo o feedback foi de apoio. Algumas vozes na internet manifestaram julgamentos. Elas questionaram a própria decisão da cirurgia. Afinal, tratava-se de um procedimento arriscado. A vida de ambas as meninas estava em jogo. Talvez, para alguns, o risco não valesse a pena. Esta é a essência do julgamento online. Pessoas opinam sobre escolhas alheias. Elas o fazem sem conhecer a profundidade da situação.
A internet proporciona uma falsa sensação de intimidade. Ela também oferece anonimato. Assim, as pessoas sentem-se à vontade para julgar. Elas formam opiniões a partir de fragmentos. Não há conhecimento completo da realidade. A distância física facilita a desinibição. Consequentemente, a empatia pode se diluir.
Decisões médicas como esta são agonizantes. Médicos e pais enfrentam dilemas imensos. Não existem respostas fáceis. O corpo clínico avalia cada risco e benefício. Eles discutem as probabilidades de sucesso. Depois, apresentam as opções à família. A decisão final pertence aos responsáveis legais. Os pais de Kiraz e Aruna enfrentaram uma escolha dura. Eles buscaram o melhor para suas filhas. Certamente, essa foi uma deliberação repleta de dor.
O julgamento on-line ignora essa complexidade. Ele simplifica escolhas de vida ou morte. Ele ignora a ciência médica. Além disso, desconsidera o amor parental. Pessoas sentadas em casa emitem sentenças. Elas o fazem sobre famílias em sofrimento. O impacto disso é imenso. A dor do luto pode ser agravada. A crítica externa adiciona um fardo desnecessário.
Ninguém está imune ao escrutínio digital. O mundo virtual amplifica cada passo. Vidas expostas, mesmo que por boa fé, tornam-se alvo. A família das gêmeas buscou apoio. Eles compartilharam sua esperança e angústia. Em troca, receberam tanto afeto quanto julgamento. Isso levanta uma questão crucial. Qual o limite da opinião pública? Onde termina o direito de comentar? Onde começa a invasão da privacidade?
A sociedade digital precisa de mais reflexão. Devemos ponderar antes de tecer críticas. É vital praticar a compaixão. As histórias de vida são intrincadas. Elas não cabem em um único tweet. Nem em um breve comentário no Instagram. Viver é fazer escolhas difíceis. Ninguém pode julgar a dor alheia. Ninguém pode dimensionar a fé de uma família.
Portanto, é imperativo cultivar a empatia. Devemos oferecer apoio, não condenação. O luto é um processo privado e sagrado. Ele merece respeito irrestrito. A decisão de uma cirurgia complexa é pessoal. Ela envolve profissionais e a família. Não compete a terceiros opinar. Eles não possuem o histórico completo. Eles não partilham da mesma dor.
A história de Kiraz e Aruna é um lembrete. Ela nos convida à humanidade. É um convite à solidariedade. É uma chamada à prudência digital. Antes de digitar, respire. Considere o impacto das suas palavras. Ninguém sabe a dor que outro carrega. Ninguém tem o direito de aumentá-la. A vida já é um desafio complexo. O julgamento on-line só a torna mais difícil.
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