
A suspensão das negociações para um novo acordo de livre comércio entre Reino Unido e Israel marca uma inflexão nas relações diplomáticas entre os dois países. O anúncio foi feito nesta terça-feira (21) pelo chanceler britânico, David Lammy, em sessão na Câmara dos Comuns.
A decisão ocorre em meio à intensificação da ofensiva militar israelense em Gaza, onde ao menos 85 palestinos foram mortos em 24 horas, e após declarações de ministros do governo Netanyahu em defesa da remoção forçada da população palestina.
Lammy afirmou que o plano de transferir civis de Gaza para países terceiros é “repugnante e monstruoso”, e classificou como “incompatível com os valores do povo britânico” o bloqueio imposto por Israel à entrada de ajuda humanitária.
“Estamos diante de uma escalada que rompe todos os marcos de uma conduta aceitável entre Estados”, declarou. A embaixadora de Israel no Reino Unido foi formalmente convocada para prestar esclarecimentos.
Parlamento britânico endurece discurso e expõe contradições nas relações com Israel
Durante sessão na Câmara dos Comuns, o chanceler David Lammy anunciou a suspensão das negociações por um novo acordo de livre comércio entre Reino Unido e Israel. A medida veio acompanhada de um pronunciamento duro contra declarações de ministros do governo Netanyahu sobre a remoção da população palestina de Gaza.
“Precisamos chamar isso pelo que é. É extremismo. É perigoso. É repugnante. É monstruoso”, afirmou Lammy, ao comentar as falas do ministro Bezalel Smotrich, que defendeu “destruir Rafah” e “realocar” os civis palestinos para outros países.
A sessão, no entanto, não se limitou à condenação moral. Parlamentares pressionaram o governo a explicar a manutenção de exportações militares para Israel mesmo após a imposição de uma proibição parcial em setembro de 2024.
A deputada Zarah Sultana, do grupo trabalhista independente, confrontou o chanceler com dados oficiais que revelam a autorização de £127,6 milhões em exportações militares para Israel apenas no quarto trimestre de 2024 — um montante superior à soma total aprovada entre 2020 e 2023, segundo a organização Campaign Against the Arms Trade.
Lammy respondeu que “não reconhecia esse número” e acusou a parlamentar de “sensacionalismo”, mas não contestou os dados publicados.
Segundo a mesma organização, o governo também aprovou mais de £61 milhões em licenças individuais para equipamentos militares com destino final em Israel, incluindo sistemas de mira, munições e peças para aeronaves militares — itens que podem estar sendo utilizados diretamente na ofensiva sobre Gaza.
As denúncias levaram o presidente do Comitê de Comércio da Câmara dos Comuns, Liam Byrne, a convocar três ministros — do Comércio, do Ministério da Defesa e do Ministério das Relações Exteriores — para prestar esclarecimentos sobre possíveis brechas no cumprimento da proibição parcial.
Byrne também solicitou a divulgação do número de licenças que foram alteradas para excluir Israel como país de destino final.
Parlamentares de diferentes bancadas, incluindo conservadores, defenderam o reconhecimento do Estado da Palestina, o boicote total ao comércio com Israel e o bloqueio imediato às exportações de armamentos.
Para Lammy, a retórica de Netanyahu e o bloqueio à ajuda colocam Israel em rota de isolamento. “Eles estão minando os próprios interesses e afastando o país de seus parceiros históricos”, afirma.
Nova fase da ofensiva militar em Gaza agrava crise humanitária
Os bombardeios desta terça-feira fazem parte da Operação Carruagem de Gideão, conduzida por Israel desde o último domingo (18). Segundo o ministério da Saúde de Gaza, 85 pessoas foram mortas em ataques aéreos em diversas regiões da Faixa, incluindo 22 civis em uma escola usada como abrigo no norte do território.
O número de mortos desde o início da ofensiva, e outubro de 2023, ultrapassa 53 mil, dos quais mais de 28 mil são mulheres e crianças, segundo a ONU Mulheres.
A cidade de Khan Younis recebeu na segunda (19) uma nova ordem de evacuação por parte do Exército israelense, obrigando a mais um deslocamento em meio à fome, à ausência de abrigo e aos bombardeios ininterruptos. Nenhuma área de Gaza tem sido poupada dos ataques.
Ajuda humanitária segue bloqueada apesar de promessa israelense
Apesar de o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu ter anunciado o fim do cerco a Gaza, a ONU afirmou nesta terça-feira (20) que a entrada de ajuda humanitária continua restrita e sem autorização para distribuição.
Apenas cinco caminhões com suprimentos conseguiram cruzar a fronteira até o início desta quarta, segundo o Escritório das Nações Unidas para Assuntos Humanitários (OCHA), e nenhum foi liberado para entrega até o momento da declaração.
O porta-voz da agência, Jens Laerke, afirmou que as medidas adotadas por Israel são insuficientes diante da escala da catástrofe humanitária e que o volume liberado representa apenas um quinto do que Gaza recebia diariamente antes da guerra. A ONU informa que mais de 9 mil caminhões com suprimentos estão prontos para entrar no território, aguardando autorização israelense.
Sanções atingem colonos extremistas e assentamentos ilegais
O Reino Unido também anunciou sanções contra três colonos extremistas e quatro assentamentos ilegais na Cisjordânia, responsabilizados por violações de direitos humanos e ataques a civis palestinos. Entre os alvos estão:
Daniella Weiss, líder do movimento Nachala;
Zohar Sabah, já sancionado pelos Estados Unidos;
As fazendas ilegais Coco’s Farm Outpost e Neria’s Farm, associadas a grupos de colonos armados.
As sanções incluem congelamento de bens, restrições de viagens e impedimentos legais à cooperação com essas entidades.
Críticas internas a Netanyahu e repressão a ativistas israelenses
No plano interno, a crise se aprofunda. O deputado Yair Golan, general da reserva e líder do partido Democratas, afirmou que Israel está se tornando uma nação pária comparável ao regime do apartheid sul-africano. “Um país são não mata bebês por hobby. Não estabelece a expulsão de uma população como meta”, declarou à rádio Reshet Bet.
Netanyahu respondeu com acusações de “calúnia antissemita”, mas Golan reafirmou sua crítica ao que chamou de “guerra corrupta” e lamentou o silêncio da esquerda israelense.
Enquanto isso, ativistas contrários à guerra foram presos por exibirem fotos de crianças palestinas mortas durante um protesto na fronteira com Gaza. Um dos detidos, Alon-Lee Green, é codiretor do movimento binacional Standing Together, que denunciou o duplo padrão do Estado israelense: “Manifestantes pacíficos são levados aos tribunais, enquanto colonos armados agem com impunidade”.
O post Reino Unido suspende acordo comercial com Israel e impõe sanções a colonos apareceu primeiro em Vermelho.