Juíza envolvida em caso de adolescente que recorreu ao STJ para fazer aborto legal em Goiás é afastada, determina CNJ


Decisão determinou afastamento até o fim do processo administrativo. Desembargadora também responderá, mas será mantida em suas funções. CNJ abre procedimento administrativo contra juíza e desembargadora
De forma unânime, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) instaurou processo administrativo disciplinar (PAD) em desfavor da juíza Maria Socorro de Sousa Afonso da Silva e da desembargadora Doraci Lamar Rosa da Silva Andrade, magistradas do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJ-GO), por decisões proferidas em julho de 2023 que impossibilitaram o acesso de uma adolescente de 13 anos ao aborto legal. A menina havia sido vítima de estupro.
A decisão determinou também que Maria Socorro seja afastada cautelarmente do Juizado de Infância e Juventude de Goiânia até o término do PAD. A juíza deve ser designada para atuação em outra vara. O julgamento foi presidido pelo ministro Luís Roberto Barroso, em sessão plenária virtual na sexta-feira (16).
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Em nota, o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO) esclareceu que o processo mencionado tramita sob sigilo no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), motivo pelo qual não é possível a emissão de comentários sobre o caso. Porém, enfatizou que “as magistradas envolvidas possuem trajetória reconhecida no âmbito do Poder Judiciário goiano, com atuação pautada pela responsabilidade e compromisso com a prestação jurisdicional”.
O g1 não obteve o contato da defesa das magistrada até o momento da publicação da reportagem.
Magistradas vão responder processo administrativo por decisões envolvendo aborto em adolescente
Reprodução/O Popular-Reprodução/Mídias Sociais
Representação
A abertura do procedimento disciplinar atendeu a representação feita pela Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABDJ), em julho de 2024, que denunciou violação de direitos de meninas vítimas de violência sexual. O advogado Vítor Albuquerque, que é secretário executivo da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia, afirmou que o afastamento da juíza Maria do Socorro do juizado da infância e juventude, enquanto responde ao processo disciplinar, se mostra medida importante.
“Principalmente por já ter demonstrado parcialidade em situações que envolva aborto legal em crianças e adolescentes”, ressaltou.
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Albuquerque afirmou que o CNJ vem ouvindo a sociedade e respondendo às violações de direitos praticadas com o pretexto religioso, apesar de o problema ser mais profundo. O advogado destacou que em todos os casos de violência perpetrada com uso de decisão ilegal de negativa de autorização para aborto legal, as vítimas são crianças em situação de violência e vulnerabilidade. “Então são violentadas novamente pelo Estado, de forma perene e impiedosa”, pontuou.
A legislação brasileira autoriza o aborto em três situações: quando a vida da gestante está em risco, quando a gravidez é resultado de estupro, e quando o feto é anencéfalo, ou seja, quando ele possui uma grave malformação congênita com ausência total ou parcial do cérebro, incompatível com a vida.
Luta por aborto
Em junho de 2023, a juíza Maria do Socorro de Sousa Afonso da Silva chegou a autorizar uma interrupção da gravidez da adolescente de 13 anos, desde que a vida do feto fosse preservada. Assim, a magistrada proibiu a utilização de qualquer método que induzisse a morte do feto, o que levaria a adolescente a prolongar a gestação.
No da 27 de junho, a desembargadora Doraci Lamar concedeu liminar que suspendia integralmente o acesso ao aborto pela garota, ao justificar que não havia no processo qualquer documento assinado por um profissional de saúde que comprovasse o risco de morte da gestante.
Em julho a presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministra Maria Thereza de Assis Moura, autorizou a interrupção da gravidez. A decisão afirmava que a intervenção do STJ foi necessária para “fazer cessar o constrangimento ilegal a que se encontra submetida a paciente [vítima]”.
“Defiro o pedido de liminar para autorizar a interrupção da gestação da adolescente, seja pela via do aborto humanitário, caso assim escolher, seja pela antecipação do parto, preponderando-se sempre a vontade da paciente, com o devido acompanhamento e esclarecimentos médicos necessários”, diz a decisão da presidente do STJ.
A decisão também apontou que o caso demonstra “extrema vulnerabilidade por parte da adolescente vitimizada não apenas pela violência sexual perpetrada pelo seu agressor, mas também pela violência psicológica exercida pelo pai e por seus representantes e pela violência institucional decorrente da demora na realização de procedimento de interrupção de gestação que vem sendo buscado há 2 (dois) meses”.
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