A crise desencadeada pelo impasse registrado na Favela do Moinho, em São Paulo, e o descompasso de comunicação entre os governos federal e estadual podem acelerar uma dança das cadeiras já ventilada nos corredores da Esplanada dos Ministérios, em Brasília: a nomeação do deputado federal Guilherme Boulos (Psol) como ministro no governo Lula.
Moradores da comunidade, onde vivem cerca de 900 famílias, foram agredidos pela Polícia Militar de São Paulo após uma série de protestos contra o processo de desapropriação da região, que deve ceder espaço para a construção de um parque e da Estação Bom Retiro, da CPTM, anunciados em setembro de 2024.
O parlamentar viajou com o presidente Lula ao Uruguai, onde participaram do velório do ex-presidente do país Pepe Mujica, que faleceu nesta terça-feira (13), em Montevidéu. Enquanto isso, duas delegações do governo federal estiveram em São Paulo nesta quinta-feira (15). Uma delas seguiu para uma reunião com o governo de São Paulo, capitaneada pelo ministro das cidades, Jader Filho, e pela ministra substituta da Gestão e Inovação, Cristina Mori. Enquanto uma segunda esteve na Favela do Moinho.
O chefe da Secretaria-Geral da Presidência (SGPR), Márcio Macêdo, ficou de fora da agenda dos ministros, aguardando o retorno de Lula a Brasília. Para a delegação escolhida para dialogar com moradores, foram convocadas a secretária-executiva da SGPR, Kelli Cristine Mafort, e a secretária-adjunta da Secretaria Nacional de Diálogos Sociais e Articulação de Políticas Públicas, Izadora Gama Brito.
Segundo fontes da presidência ouvidas sob condição de anonimato pela Agência Pública, a escolha de Mafort – que estava em período de férias, interrompidas devido à crise do Moinho – teria se dado por seu perfil mediador, enquanto Brito, coordenadora nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto do Brasil (MTST), poderia defender os interesses da comunidade. A decisão teria sido formalizada em reunião a portas fechadas, na noite desta quarta, em que os presentes tiveram que participar sem portar aparelhos celulares, e em que a iminente saída de Macêdo teria sido comunicada.
Nos corredores da SGPR, a substituição de Macêdo por Boulos é dada como certa e a condução da crise que se tornou o processo de desapropriação da Favela do Moinho se consolida como uma agenda de transição entre as gestões. Procurada, a secretaria-geral não se manifestou sobre o assunto.
Sobre a condução das negociações quanto à comunidade, a assessoria de imprensa da SGPR afirmou não ter previsão de seus representantes voltarem a São Paulo para tratar do assunto.
Segundo Mafort, “deve ser organizado um cronograma de trabalho com Mcidades e MGI” para conduzir a questão. Sobre o indicativo de mudança ministerial, a secretária-executiva informou não ter “nenhum informe sobre a motivação da composição da comitiva”.

O fator São Paulo: a delicada balança entre acordo e impasse
O diálogo do governo Lula com a gestão Tarcísio em São Paulo estava travado e, em resposta ao uso das forças policiais para remover famílias da comunidade da região central da capital paulista, a Secretaria do Patrimônio da União (SPU), do Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos (MGI), havia notificado o governo de São Paulo quanto à suspensão do processo de transferência da área da Favela do Moinho que pertence à União.
Segundo nota do MGI, o uso violento da força policial contraria o acordo prévio que condicionava a cessão a uma atuação “cuidadosa, para evitar o impacto na estrutura das casas vizinhas e minimizar a interferência nas atividades cotidianas da comunidade”.
A ação policial se intensificou após o protesto de segunda-feira (12) dos moradores do Moinho, quando atearam fogo em sacos de lixo sobre trilhos da CPTM, interrompendo a circulação de trens das linhas 13 Jade, 8 Diamante e 7 Rubi no trecho entre as estações Luz e Palmeiras-Barra Funda. Durante a crise que se instaurou, deputadas do Psol que acompanhavam a situação foram agredidas.
Após reunião da delegação ministerial com o governo de São Paulo, Jader Filho comunicou um novo acordo com o governo estadual, condicionando uma maior participação do governo federal, desde que cessada a violência policial – que, se retomada, significaria o fim das condições negociadas. Na ocasião, Cristina Mori alegou que, com o acordo, o processo de cessão das terras da União deve voltar a evoluir.
Nesse cenário, os moradores teriam acesso a um subsídio de R$ 250 mil por família para realocação, via programa Casa Paulista, verbas sendo R$ 180 mil federais (do Minha Casa, Minha Vida) e R$ 70 mil estaduais. Enquanto isso, as famílias tiveram o Aluguel Social ampliado para o valor de R$ 1,2 mil. Os benefícios atendem famílias com ganhos inferiores a R$ 4,7 mil.