Rodrigo Zani
Especial para o Jornal Opção
Na Semana Santa, os cristãos de todo o mundo rememoram os últimos dias da vida de Jesus Cristo, sua paixão, morte e ressurreição. No entanto, para além da tradição religiosa, é essencial refletir sobre o Cristo histórico — o homem real que viveu há mais de dois mil anos na Palestina ocupada pelo Império Romano e que se tornou um símbolo universal de compaixão, resistência e amor ao próximo.
Jesus nasceu em Belém, segundo os Evangelhos, em condições extremamente humildes. Era filho de Maria e José, um casal pobre e anônimo, pertencente a uma sociedade rural e dominada. Seu nascimento em uma manjedoura simboliza, desde o início, a identificação profunda com os deserdados da história. Criado na pequena cidade de Nazaré, trabalhava como carpinteiro ao lado do pai, profissão que moldou não apenas sua habilidade manual, mas também seu olhar sensível para as dores da classe trabalhadora de sua época.
Os registros históricos e bíblicos pouco revelam sobre a juventude de Jesus, mas um dos episódios mais marcantes de sua adolescência é quando, aos 12 anos, foi encontrado entre os mestres do templo, impressionando a todos com sua sabedoria. Isso sugere um jovem intelectualmente inquieto, apaixonado pelo conhecimento e profundamente interessado nas escrituras e no destino do seu povo.
Ao iniciar sua vida pública, por volta dos 30 anos, Jesus rompeu com os moldes religiosos e sociais de seu tempo. Não se cercou de sacerdotes ou nobres, mas sim de pescadores, cobradores de impostos, zelotes e até mesmo mulheres marginalizadas. Seus doze apóstolos eram homens comuns, com vidas ordinárias, pecadores segundo os padrões da época. Jesus não tinha templo nem púlpito fixo; sua igreja era a estrada empoeirada, os casebres de pescadores, os montes onde pregava ao ar livre. Sua religião era o amor e sua prática, a solidariedade.
Jesus se posicionou de maneira crítica e desafiadora diante do sistema político e religioso vigente. Em um dos episódios mais célebres, ao ser questionado sobre o pagamento de impostos, responde com a emblemática frase: “Dai a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus”. Essa resposta, ao mesmo tempo diplomática e provocadora, reafirma sua visão de um reino que não se submete ao poder opressor, mas que nasce no coração humano. Por essa postura, foi considerado subversivo pelo Império Romano — um agitador perigoso que ameaçava a ordem estabelecida.
Jesus também foi um revolucionário no trato com as mulheres. Num tempo em que o patriarcado era regra e o apedrejamento de adúlteras era legal e legitimado, ele se interpôs diante da multidão enfurecida e salvou Maria Madalena, dizendo: “Aquele que nunca pecou, atire a primeira pedra”. Nessa frase, Jesus não apenas salva uma mulher, mas desconstrói a lógica hipócrita de julgamento e exclusão.
Falando em hipocrisia, Jesus foi feroz com os fariseus, os religiosos da época. Criticava sua vaidade, a manipulação da fé e o distanciamento do sofrimento real do povo. Um de seus atos mais emblemáticos foi a expulsão dos vendilhões do templo, onde chicoteou os comerciantes que haviam transformado a casa de oração em mercado. Era um clamor por justiça, por espiritualidade verdadeira e acessível.
Mas essa mensagem radical de amor, humildade e compromisso com os pobres teve um alto preço. Jesus foi perseguido, traído, preso, torturado e condenado à morte com o apoio da elite política e religiosa. Seu “crime” foi denunciar as injustiças, tocar os intocáveis, curar os incuráveis e pregar que todos são irmãos. Foi assassinado não por bandidos ou criminosos, mas por aqueles que detinham o poder, justamente porque esse poder foi desafiado por um homem que falava em nome do amor.
Neste tempo de Semana Santa, mais do que lembrar o sofrimento de Cristo, somos chamados a refletir sobre seus ensinamentos. Não basta ajoelhar-se diante da cruz, se não somos capazes de erguer o próximo caído. Não adianta recitar mandamentos, se não nos movemos pela compaixão e pelo perdão. O verdadeiro cristianismo não se encontra nos palácios religiosos nem nas doutrinas vazias, mas nas atitudes cotidianas de acolhida, justiça e solidariedade.
Jesus nos ensinou que “amar ao próximo como a si mesmo” não é uma sugestão, é um mandamento. Disse também: “Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados”. Que essa Semana Santa não passe em branco, mas nos desperte para uma fé viva, crítica e comprometida com os mais vulneráveis.
Porque, no fim das contas, o verdadeiro milagre de Jesus não foi andar sobre as águas. Foi caminhar entre os pobres com o coração cheio de amor.
Rodrigo Zani é produtor rural e militante político.
O post Jesus Cristo: o subversivo do amor e a verdadeira essência do Cristianismo apareceu primeiro em Jornal Opção.