A partir do mês que vem, o exame citopatológico conhecido como Papanicolau começará a ser substituído no SUS (Sistema Único de Saúde) pelo teste molecular RT-PCR, uma nova tecnologia de análise por DNA.A implementação terá início pelo estado de Pernambuco, onde deve alcançar 435 mil mulheres ao longo de um ano na detecção precoce do papilomavírus humano (HPV), principal causador do câncer de colo do útero.De acordo com o Ministério da Saúde, Minas Gerais também demonstrou interesse em adotar o teste nesta fase inicial. “A expansão do teste molecular e do novo rastreamento ocorrerá gradualmente em todo o país ao longo de 2025 e 2026, período em que serão realizados treinamentos e capacitações das equipes”, informou a pasta.O kit de testagem foi desenvolvido com tecnologia nacional e passa neste mês pelas últimas análises de validação clínica no Inca (Instituto Nacional do Câncer). O ministério está finalizando as diretrizes para organização da rede de saúde, incluindo logística de coleta e análise laboratorial.O procedimento aumentará de três para cinco anos o intervalo entre as coletas nas pacientes e tem sensibilidade de 97% na detecção dos subtipos do HPV. A proposta é que o novo rastreamento seja implantado em toda a APS (Atenção Primária à Saúde), em articulação com a Atenção Especializada.A disseminação da nova tecnologia no SUS será viabilizada pelo “Kit Biomol HPV Alto Risco”, desenvolvido no Brasil pelo Instituto de Biologia Molecular do Paraná (IBMP), capaz de detectar 14 genótipos do HPV causadores de câncer.Baseado no exame de PCR em tempo real, o teste já teve o registro aprovado pela Anvisa (nº 80780040020). O teste de DNA é automatizado e elimina riscos de falsos negativos e positivos entre os cerca de 200 genótipos do HPV existentes. O Papanicolau, por sua vez, identifica apenas células já adoecidas e depende de análise humana.Em caso de dúvida, o mesmo material coletado para o RT-PCR pode ser utilizado para análise citológica, dispensando uma nova coleta.Vantagens do exame de DNAEmbora o teste genético tenha um custo mais elevado do que o Papanicolau, ele é feito menos vezes ao longo da vida da paciente e pode ser mais econômico a longo prazo.Um estudo da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) mostrou que o teste de DNA permite diagnosticar o HPV cancerígeno até dez anos antes do surgimento da doença. Com isso, o problema é tratado precocemente, com intervenção cirúrgica e sem a necessidade de procedimentos de alto custo, como radioterapia e quimioterapia.Luísa Lina Villa, chefe do Laboratório de Inovação em Câncer e colaboradora do ICESP (Instituto do Câncer do Estado de São Paulo), afirmou em nota pública do ministério que a mudança para o exame de DNA é uma tendência mundial.Villa, que é professora da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo), reforça que o novo teste permite “checar a presença do vírus e não só alterações morfológicas”, como faz o Papanicolau.Desafios para a implementação no BrasilSegundo o CFM (Conselho Federal de Medicina), a migração no SUS do Papanicolau para o teste de DNA contribui para um rastreamento mais eficaz da doença no país. A entidade alerta, porém, para os desafios do contexto brasileiro, como a dimensão territorial continental, desigualdades regionais e limitações de acesso aos serviços públicos de saúde.O médico Ademar Augusto, coordenador da Câmara Técnica de Ginecologia e Obstetrícia do CFM, afirma que o conselho não teve acesso ao planejamento da substituição do exame, mas ressalta os riscos do ponto de vista clínico.”É legítimo questionar se a substituição do Papanicolau pelo teste molecular é viável e segura. Vale lembrar que a própria coleta do Papanicolau já enfrenta desafios logísticos significativos em muitas regiões”, diz o coordenador.Augusto defende que o ideal seria a combinação dos dois métodos, juntamente com “uma adoção bem estruturada”, pois há valor na chegada da nova tecnologia.”O teste molecular representa uma ferramenta diagnóstica de alta eficácia. A identificação do DNA viral é relevante porque a família do HPV é extensa e apenas alguns tipos pertencem ao grupo de alto risco oncogênico”, diz o médico.O Ministério da Saúde não informou até a publicação desta reportagem se haverá alterações nas diretrizes de rastreamento do HPV também para os planos de saúde.O modelo que chega agora ao SUS, porém, também está em curso em outras instituições públicas, como o Iamspe (Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual de São Paulo), que atende exclusivamente servidores estaduais e seus beneficiários.De acordo com a assessoria da entidade, o teste molecular de DNA-HPV está em processo de substituição no Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo (HSPE) há alguns anos, mas, por enquanto, é feito apenas quando há suspeita do vírus. A previsão é que o método seja implementado integralmente até o fim deste ano.Metas e público-alvo O teste de DNA no SUS é direcionado a mulheres de 25 a 49 anos e identifica os principais subtipos do HPV, incluindo o 16 e o 18, causadores de 70% das lesões pré-cancerosas. O HPV atinge mais da metade das brasileiras (54,4%) e 41,6% dos homens com vida sexual ativa, podendo levar a tumores de colo do útero, ânus, pênis e faringe.O Ministério da Saúde alerta que a presença do vírus nem sempre é sinônimo de câncer, mas indica risco para o desenvolvimento de neoplasias. Outro ponto importante é a existência de uma vacina contra o HPV, disponível gratuitamente e em dose única na rede pública para jovens de 9 a 14 anos.A vacinação e o teste molecular fazem parte de um conjunto de políticas públicas para acelerar a meta da OMS (Organização Mundial da Saúde) de eliminar o câncer de colo do útero até 2030.
SUS começa a substituir papanicolau por teste de DNA a partir de maio
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