Samuel Pessôa sugere que Trump não vai conseguir reindustrializar os Estados Unidos

A repórter Cássia Almeida, de “O Globo”, fez uma entrevista com Samuel Pessôa, que merece ser lida. O economista é pesquisador associado da Fundação Getúlio Vargas/Ibre. “‘Empregos não vão voltar aos EUA, só robôs. Espanta o nível de amadorismo’, diz Samuel” é o título do material do jornal carioca.

Economista equilibrado, avesso aos radicalismos, Samuel Pessôa é peremptório: “As medidas de Trump vão desorganizar a atividade produtiva mundial. Haverá perda de produto no mundo tudo, mais concentrado nos Estados Unidos. É possível que o país caminhe para um estado de estagflação. Primeiramente, não tem emprego perdido, o país opera a plena carga. Não é um problema real”.

As medidas de Donald Trump pressupõem uma reindustrialização dos Estados Unidos, com o objetivo de criar empregos locais. Mas, pontua Samuel Pessôa, o mundo mudou, dada a revolução tecnológica. “A indústria está toda robotizada. Se voltar para os Estados Unidos, vão voltar os robôs.”

O grupo de economistas que está orientando Trump seria retardatário e, por isso, estaria tentando recriar um capitalismo que, em linhas gerais, não existe mais? Samuel Pessôa frisa que “não houve propriamente uma perda da indústria. Os Estados Unidos se especializaram na produção e exportação de serviços sofisticados. Vale do Silício é nos Estados Unidos, que exporta esses serviços, com Apple, Google, Microsoft. É o setor mais nobre do capitalismo internacional. Está nos Estados Unidos e exporta”.

Donald Trump com seu boné feito na China: o capitalismo integra os diferentes | Foto: Reprodução

Por isso talvez seja possível sublinhar que o capitalismo americano — na verdade, globalizado — é mais moderno que o presidente dos Estados Unidos. Tudo indica que a restauração do capitalismo que Trump pretende é impossível. Até os bilionários americanos, que eram só entusiasmo com o líder republicano, agora estão com um pé atrás. Talvez os dois.

De acordo com Samuel Pessôa, Trump parece acreditar “que existe um comércio desigual, e os Estados Unidos são explorados e que tem de colocar tarifas. É difícil entender uma coisa que não faz sentido”.

O economista brasileiro se diz “espantado” com “o nível de amadorismo” da equipe de Trump. “Ele quer reconstruir a indústria americana, voltar para os anos 1950.” Mas o capitalismo americano, com o uso avançado de tecnologia, reinventou a indústria. Mas, apesar de ser aliado dos chefões das big techs, o presidente não parece entender o capitalismo criado pelos empreendedores da terra de Milton Friedman.

Samuel Pessôa indica que Trump “precisa das tarifas como uma fonte de receita de impostos. Ele quer manter as desonerações de impostos e está com déficit público grande”.

O que se fará no capitalismo regulado, de tarifas, lá (China) e cá (Estados Unidos)? “Nas simulações que já vi, se todo mundo botar tarifa, os Estados Unidos são os que menos perdem. Como é um grande consumidor, tem poder de barganha e consegue reduzir parte das tarifas dos outros”, assinala Samuel Pessôa.

Porém, “para a China, machuca muito”, postula Samuel Pessôa. “Mas, se desorganizar tudo, Trump pode voltar atrás. Ele vai na tentativa e erro, dependendo do nível de desorganização que produz, volta um pouco.”

Agora mesmo, Trump “emitiu uma regra que isentou smartphones, computadores, semicondutores e outros eletrônicos de algumas dessas tarifas, em um alívio significativo para empresas de tecnologia como Apple e Dell — e para os preços de iPhones e outros eletrônicos de consumo” (trecho de reportagem do “New York Times”).

Se Trump não recuar, e se a China se mantiver na defesa-ataque, o que acontecerá com a economia mundial? Talvez prevaleça, depois da primeira histeria do trumpismo, a típica racionalidade americana. Porém, se não houver um recuo substancial, as ações do governo americano vão “desorganizar a estrutura produtiva”, frisa Samuel Pessôa.

“A produtividade do mundo vai cair. A capacidade produtiva vai cair. Essas medidas [as tarifas extremas] geram muita incerteza e certa recessão na economia mundial. Essa queda de demanda, conjuntamente com a desorganização da oferta, gera estagflação. Mesmo com o mundo entrando em recessão, a inflação não cai e é provável que até suba, com a desorganização da oferta”, analisa Samuel Pessôa.

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