
Além da Operação Copia e Cola, instituição também esteve envolvida em investigação do Rio Grande do Sul, de 2022, e que também citava Rodrigo Manga. Aceni, que seria o pivô do esquema investigado pela PF, é a atual gestora da UPH Zona oeste de Sorocaba
Prefeitura de Sorocaba/Divulgação
A Organização Social Instituto de Atenção à Saúde e Educação (Aceni), que seria o pivô do esquema investigado pela Operação Copia e Cola, da Polícia Federal e que tem entre os alvos o prefeito de Sorocaba, Rodrigo Manga (Republicanos), é citada em uma investigação de 2022 articulando apoio à campanha do prefeito de Sorocaba (SP).
A relação em contratos públicos entre a entidade e a prefeitura começou em 2021. São contratos emergenciais, com dispensa de licitação, e por chamamento público. Tudo, até agora, com pagamentos que somam mais de R$ 123 milhões.
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Na quinta-feira (10), policiais federais estiveram na sede da prefeitura de Sorocaba, na casa e no gabinete de Manga, na Secretaria de Saúde da cidade, no Diretório Municipal do partido e na casa do ex-secretário da saúde, Vinicius Rodrigues.
A suspeita é de que a Aceni, que administra unidades de saúde, tenha sido favorecida pela prefeitura em licitações depois de ter manifestado o desejo de apoiar financeiramente a campanha de Rodrigo Manga.
Uma investigação do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Rio Grande do Sul, durante a Operação Copa Livre, em 2022, que, a principio, não tem relação com a operação desta quinta-feira (veja mais abaixo), apontou suspeita de que a Organização Social (OS) Instituto de Atenção à Saúde e Educação (Aceni) tenha sido favorecida pela Prefeitura de Sorocaba .
O g1 preparou uma linha do tempo entre as investigações e a relação da entidade com Rodrigo Manga, o ex-secretário de saúde Vinícius Rodrigues, o ex-secretário de Administração Fausto Bossolo e a prefeitura de Sorocaba na época. Confira:
Rodrigo Manga, prefeito de Sorocaba (SP), e dois de seus ex-secretários são investigados pelo MP em contratos da saúde
Reprodução TV TEM e Redes Sociais
Setembro de 2020
No dia 13 de setembro de 2020, o partido Republicanos, ainda com a sigla de PRB, fez sua convenção municipal em um hotel de Sorocaba (SP) e oficializou Rodrigo Manga como candidato à prefeitura do município.
10 dias depois, em 23 de setembro, conforme a investigação do MP gaúcho, uma conversa entre integrantes da Aceni cita a candidatura e demonstra o desejo de apoiar financeiramente a campanha de Manga.
Os diálogos foram obtidos com exclusividade pelo g1 e pela TV TEM.
Em conversa interceptada pelo Gaeco do Rio Grande do Sul, grupo que assinou contratos em Sorocaba (SP), após 2021, diz que na cidade precisa apoiar o cara do PRB
Reprodução
“Vamos decidir amanhã as cidades em que a gente vai, porque que estou te falando isso, o João marcou para segunda-feira no PRB com o cara de Sorocaba, o cara de Sorocaba vai ganhar, é aquele cara que já esteve com a gente, todo mundo já me falou desse cara aí e o cara tá no PRB, o cara vai ganhar a eleição. O João já marcou no partido, inclusive, para tentar fazer até uma situação melhor pra nós, marcou para segunda-feira.”
Em documento, Gaeco do Rio Grande Sul afirma que, provavelmente, contrato na UPA do Éden, em Sorocaba (SP), seria parte do acordo
Reprodução
Junho de 2021
Nove meses depois, em junho de 2021, com Rodrigo Manga já eleito prefeito de Sorocaba, os integrantes da organização social trocam novas mensagens. O áudio cita que um dos membros da OS havia acabado de sair de uma reunião com o secretário de Saúde de Sorocaba da época, o médico Vinícius Rodrigues.
Gaeco do RS diz que ex-secretário de Sorocaba (SP) teria pedido R$ 20 mil por contrato
Reprodução
O diálogo da reunião ocorrida em Sorocaba continua e, em determinado momento, é informado que o prazo para entrega das propostas terminaria no dia seguinte, às 23h, e que Fausto Bossolo – secretário de Administração de Sorocaba da época – iria ligar para eles até 22h, com a intenção de passar o valor para a Aceni ganhar.
Após o ocorrido, a Aceni venceu e assumiu dois serviços de saúde no município. Primeiro em 2021, na gestão emergencial da UPA do Éden, em um contrato de seis meses de duração.
Na conversa, o secretário teria afirmado que o Instituto Diretrizes teria perdido um serviço de saúde na cidade e desejava que a Aceni assumisse de forma emergencial. Há, ainda, nos documentos uma menção de valor: “o secretário já adiantara que ele estaria pensando em uns 20 por mês”.
Março de 2022
Em março de 2022, quando já não administrava mais a UPA do Éden, a Aceni venceu o contrato, por meio de chamamento público, para a administração da Unidade Pré-Hospitalar (UPH) da zona oeste, antes administrada pelo Instituto Diretrizes. O contrato para administração da unidade foi firmado pelo valor de R$ 86 milhões.
Operação Copa Livre
Foi também em março de 2022 que o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Rio Grande do Sul realizou a Operação Copa Livre, especificamente no dia 31 de março. O Gaeco cumpriu 81 medidas cautelares contra 24 pessoas e 15 empresas no Rio Grande do Sul, São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. O promotor responsável disse, na época, que havia um núcleo empresarial praticando fraudes em todo o Brasil na área da Saúde.
De acordo com o Gaeco, os investigados entregaram grande quantidade de dinheiro ilícito a vários candidatos nas eleições municipais de 2020, firmando acordos e compromissos, antes e depois das eleições, com a intenção de fechar futuros contratos fraudados na área de atuação da organização social Aceni e empresas parceiras. Um dos exemplos citados no documento é o de Sorocaba, sendo a troca de gestão da UPA do Éden.
O Gaeco do RS cita Sorocaba em sua investigação para evidenciar a prática de outros ilícitos e crimes no curso das eleições de 2020, por parte da organização social. De acordo com o MP gaúcho, os integrantes da Aceni entregaram grande quantidade de dinheiro ilícito para vários candidatos, com objetivo de obterem contratos fraudados após a eleição. A referência de Sorocaba é citada na página 173 do documento.
“No caso, estavam a falar do candidato conhecido como Rodrigo Manga que, de fato, venceu a eleição e, agora, em julho de 2021, provavelmente cumprindo, portanto, o acordo criminoso feito com os investigados, contratou por seis meses a entidade Aceni, do investigado Paulinho, para administrar e gerir a UPA do Éden, na cidade, ao custo de R$ 2,4 milhões por mês.”
Os documentos do Gaeco foram encaminhados ao promotor Eduardo Francisco Junior, em Sorocaba, para fazerem parte do inquérito que apura possível improbidade administrativa na contratação da Aceni na cidade.
A organização social Aceni continua responsável pela administração da UPH zona oeste, em Sorocaba.
Em entrevista coletiva à imprensa, nesta quinta-feira, o prefeito Rodrigo Manga disse que, em 2022, foi aberto um procedimento na prefeitura para apurar possíveis irregularidades no contrato firmado com a Aceni para administração da UPH zona oeste, mas que ainda não há conclusão desta investigação interna. Segundo o prefeito, não é possível romper contrato sem que as investigações sejam concluídas.
Junho de 2023
Em 26 de junho de 2023, o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP) julgou irregular o contrato com dispensa de licitação entre a Prefeitura de Sorocaba e a Aceni, de R$ 8 milhões, para a gestão da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) do Éden, em Sorocaba.
Durante a sessão do TCE, foi julgada irregular a dispensa de licitação e o contrato da gestão, assinado em 14 de julho de 2021. O documento cita o prefeito Rodrigo Manga e Sérgio Ricardo Peralta, diretor-presidente da Aceni, à época do contrato.
Agosto de 2023
Em agosto de 2023, o contrato com dispensa de licitação entre a Prefeitura de Sorocaba e a Aceni para administração da UPA do Éden foi novamente julgado irregular pelo TCE-SP.
De acordo com o TCE-SP, não foi comprovada a situação emergencial para o contrato e também não foi provada a questão da economicidade. Por isso, além de não ser uma contratação que mereceria urgência, o TCE entendeu que o valor pago foi maior do que poderia custar. Em resumo, todos os valores pagos em 2021, que somam mais de R$ 15 milhões, foram julgados irregulares.
Maio de 2024
A Aceni foi autuada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) em maio de 2024. O MTE identificou diversas irregularidades trabalhistas, incluindo falta de recolhimento de FGTS, INSS e registro de empregados.
O MTE também apontou problemas na subordinação jurídica, demostrando que os profissionais não tinham qualquer tipo de autonomia. Os médicos eram inseridos completamente na estrutura da organização, mas eram tratados como empregados.
O documento ressalta o descumprimento de requisitos legais e falta de registro dos trabalhadores. A instituição, conforme apurado pela reportagem, foi multada por desacordo com o artigo 47 da CLT. O artigo trata de empresas que mantém empregados não registrados. Foram apontados mais de 200 empregos que estariam em desacordo com legislação.
Na época, a Aceni afirmou que possui contrato com uma empresa médica, “assim, os médicos que prestam serviços na unidade UPH Zona Oeste são vinculados ao prestador de serviço”.
A nota da instituição continua. “Os profissionais contratados pela OS estão com as suas documentações em dia, contratados via CLT. Ademais, atualmente os profissionais médicos não querem ser contratados via CLT, mas sim contratados como Pessoa Jurídica.”
Junho de 2024
A Aceni foi autuada pela segunda vez pelo Ministério do Trabalho e Emprego em junho de 2024. Na época, o MTE, em conjunto ao Sindicato dos Trabalhadores Públicos da Saúde de São Paulo (SindSaúde-SP), fez uma fiscalização na Unidade Pré-Hospitalar da zona oeste de Sorocaba.
Conforme apurado pela TV TEM, o MTE foi até o local após trabalhadores procurarem o 8º Distrito Policial de Sorocaba denunciando que estavam sem os pagamentos e sem o registro na carteira de trabalho.
A polícia, então, procurou o MTE para entender a regularização da situação dos trabalhadores. A TV TEM apurou que a empresa é subordinada da Aceni, que faz a contratação de outras terceirizadas para que os serviços na UPH possam ser realizados.
A Aceni teria contratado a empresa CCM Life Serviço de Transportes, que fez a contratação de 16 motoristas e técnicos de enfermagem para trabalhar na unidade. Segundo estes trabalhadores, todos estavam sem o registro profissional, sem receber todos os direitos trabalhistas e com falta de pagamento do mês de maio.
A CCM teria rescindido o contrato com estes trabalhadores e uma nova empresa, a Altmed, começou a atuar na UPH da zona oeste. Esta nova empresa também não contratou os trabalhadores, apenas absorveu alguns deles e contratou outros, mas sem registro na carteira de trabalho.
A Aceni esclareceu, na época, que rescindiu o contrato de prestação de serviços com a antiga prestadora de serviços, a CCM Life Serviço de Transportes, que era responsável pelo fornecimento de ambulâncias e serviços de remoção de pacientes, no dia 4 de junho daquele, e que a Altmed foi contratada para prestar o serviço de forma emergencial. Também negou a interrupção do fornecimento do serviço de remoção de pacientes da UPH.
Aceni e Prefeitura de Sorocaba assinaram dois contratos:
Em julho de 2021, para administrar a UPA do Éden e que durou seis meses;
Em março de 2022, no valor de R$ 86 milhões, para administrar a UPH Zona Oeste. Este contrato ainda está vigente.
A organização alvo de operação por desvios na saúde em Sorocaba já recebeu R$ 123 milhões em contratos no governo Manga. Os valores foram pagos entre 2021 e 2024 e estão disponíveis no Portal da Transparência da prefeitura.
Abril de 2025
Na quinta-feira (10), a casa do prefeito de Sorocaba foi alvo de um cumprimento de mandado de busca e apreensão durante a operação “Copia e Cola”.
A operação cumpriu 28 mandados de busca e apreensão em 13 cidades do estado de São Paulo e na Bahia, incluindo a casa do prefeito de Sorocaba, e de Marco Silva Mott, amigo do prefeito, que é suspeito de ser lobista e de lavar dinheiro em diversos contratos da prefeitura.
As equipes da operação estiveram ainda na sede da Prefeitura Municipal de Sorocaba, na Secretaria de Saúde da cidade, no Diretório Municipal do partido e na casa do ex-secretário da saúde, Vinicius Rodrigues.
Além do suposto envolvimento do ex-secretário Vinicius Rodrigues, a PF investiga a participação do ex-secretário de Governo e Administração Fausto Bossolo, que deixou o governo em 2022.
Bossolo foi condenado na ação que investigou o superfaturamento de mais de R$ 10 milhões na compra do prédio particular que seria usado como sede da Secretaria de Educação (Seduc), no bairro Campolim, em Sorocaba.
Apreensões
No dia da operação, a PF apreendeu dois carros de luxo, mais de R$ 800 mil em caixas de papelão que estavam em endereços de líderes religiosos ligados ao prefeito de Sorocaba e diversas armas. Confira na lista abaixo os bens apreendidos:
Uma Porsche, uma BMW e um Toyota na casa de Marco Silva Mott, mas sem informações sobre o dono dos veículos;
R$ 863 mil em caixas de papelão que estavam em endereços de Josivaldo Souza, que se apresenta como bispo de uma igreja, e de Simone Rodrigues Frate de Souza, cunhada de Rodrigo Manga e irmã de Sirlange Frate Manganhato, primeira-dama de Sorocaba;
Seis armas de calibre longo;
11 pistolas;
Diversas munições de calibres diversos.
Marco Silva Mott também é investigado na área cível no caso da compra superfaturada de mais de R$ 10 milhões no prédio particular que seria usado para sediar a Secretaria de Educação (Seduc), no bairro Campolim, em Sorocaba.
O que dizem os citados
Em vídeo postado no Instagram após a operação, Rodrigo Manga disse não ter medo de nenhuma autoridade incomodada com sua ascensão e debochou da ação policial.
“Mandaram a Polícia Federal aqui em casa por causa da denúncia. E acharam algumas coisas aqui em casa: bolo de cenoura, Nutella, e o Pokémon quo meu filho tanto ama”.
Em coletiva de imprensa nesta quinta-feira, após a operação da Polícia Federal, Manga comentou as acusações e os valores repassados para a organização social. Ele argumentou apenas que a investigação precisa acontecer que os serviços são fiscalizados.
Manga também disse que não sabe se ele é investigado na operação ou indiciado, e que a polícia levou apenas a cópia da chave do carro dele que estava no gabinete.
O prefeito também comentou sobre os objetos apreendidos. “Nenhuma daquelas imagens, nem dinheiro, nem Porsche, nem metralhadora, são da minha casa”, argumentou.
Rodrigo Manga se disse perseguido em função da sua ascensão nos últimos meses. Entretanto, ele comentou que a operação é legítima, mas que parte das forças policiais e da Justiça é eleitoreira, e que foi um ato político pontual. Também lembrou que a investigação é de 2022 e que, à época, foi aberto um procedimento para investigar o caso. Ainda conforme o prefeito, não há uma conclusão sobre os trabalhos.
O prefeito de Sorocaba também foi questionado sobre outros escândalos que ocorrem no seu governo, incluindo a compra de um prédio, com superfaturamento de R$ 10 milhões, já com sentença da Justiça, na qual dois secretários da gestão 2021/2024 foram condenados a prisão, e da compra de kits de robótica, no valor de R$ 26 milhões, em que, a pedido do MP, a Justiça bloqueou as contas de Rodrigo Manga.
Sobre isso, disse que os processos estão caindo e que o Tribunal de Contas julgou suas contas regulares. “Aquilo que está no poder público está sujeito a isso. Tá sujeito à exposição, tá sujeito a denúncias, e nós temos que superar isso.”
A Prefeitura de Sorocaba informou colaborar com as autoridades para a investigação e apontou ver “forças ocultas” que, segundo a nota, “se levantarem contra representantes que se projetam como uma alternativa ao sistema e dão voz ao povo. Leia a nota abaixo.
“A investigação da Polícia Federal envolvendo uma OS (Organização Social) acontece em 13 cidades, tais como São Paulo, São Bernardo do Campo, Santo André, entre outras, sendo Sorocaba uma delas. Nesse sentido, está havendo plena colaboração com as autoridades, para que todos os fatos sejam devidamente esclarecidos, o mais brevemente possível. Vale destacar que a operação acontece em um momento de grande projeção da cidade e do nome do prefeito Rodrigo Manga no cenário nacional, inclusive pontuando com destaque em pesquisas para governador do Estado de São Paulo e presidente do Brasil. Não é a primeira vez na história que vemos “forças ocultas” se levantarem contra representantes que se projetam como uma alternativa ao sistema e dão voz ao povo. Recentemente, por exemplo, Rodrigo Manga entrou em embates contra o aumento de impostos de alimentos básicos, combustíveis e remédios, bem como a criação de novos pedágios”.
O ex-secretário da saúde, Vinicius Rodrigues, declarou que não foi responsável por nenhuma das contratualizações entre a organização investigativa e a Prefeitura de Sorocaba e que durante a sua gestão, a lei municipal determinava que qualquer contratação acima de R$ 1 milhão de reais fosse realizada diretamente pelo prefeito que administrava a cidade.
A defesa de Marco Mott afirmou que prefere não se manifestar sobre a investigação, por enquanto. Fausto Bossolo não respondeu aos pedidos de posicionamento da reportagem.
A Aceni, em nota, afirmou que aguarda acesso aos autos para que possa tomar conhecimento integral da operação e que “todos os questionamentos feitos na investigação serão esclarecidos assim que se obter acesso aos autos”.
Josivaldo e Simone não se manifestaram até a publicação da reportagem.
*Com informações de Wilson Gonçalves Júnior, da TV TEM.
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