
A Argentina vive, nesta quinta-feira (10), sua terceira greve geral em apenas 16 meses de governo Javier Milei. Convocada pelas principais centrais sindicais do país, a paralisação denuncia os impactos sociais do ajuste fiscal, exige aumento de salários e aposentadorias e critica o novo acordo de US$ 20 bilhões com o FMI, prestes a ser oficializado.
Mais de 500 voos foram cancelados, e setores como transporte, saúde, educação e serviços públicos estão paralisados.
A mobilização é liderada pela Confederação Geral do Trabalho (CGT), pela Central de Trabalhadores da Argentina Autônoma (CTA-A) e pela Central de Trabalhadores e Trabalhadoras da Argentina (CTA-T). Desde a véspera, milhares de trabalhadores, aposentados e movimentos sociais realizam atos em frente ao Congresso Nacional, em Buenos Aires, denunciando o agravamento da crise social e econômica.
Os sindicatos alertam para uma explosiva combinação de desemprego, desvalorização salarial e cortes orçamentários em áreas essenciais, como saúde e educação.
Trens, metrôs, transporte marítimo, correios, bancos e hospitais interromperam seus serviços, mantendo apenas atendimentos de urgência. Embora o sindicato dos motoristas de ônibus não tenha aderido totalmente, o transporte público funciona com capacidade reduzida. A aviação civil também foi afetada: centenas de voos foram cancelados em todo o território argentino.
A greve afeta os principais centros urbanos e ocorre no momento em que o governo enfrenta crescente desgaste popular. Segundo institutos de pesquisa, o apoio a Milei recuou entre 5 e 10 pontos percentuais desde o início do ano.
Entre as principais reivindicações estão a retomada das negociações coletivas, o fim do congelamento dos reajustes salariais, o aumento das aposentadorias, a suspensão das privatizações e a reativação dos investimentos públicos. Além disso, os sindicatos denunciam as demissões em massa no setor público e o avanço das importações, que fragilizam a indústria nacional.
Para o sindicalista Ernesto Quiqui, da Federação Sindical Mundial (FSM Cone Sul), o governo Milei não pode sequer ser classificado como neoliberal. “Estamos diante de um governo neofascista. Não só pelo grau de repressão, mas porque busca a entrega total do país e de seus recursos naturais. É um projeto neocolonial”, afirmou ao Portal Vermelho.
Quiqui relata que, sob a justificativa do ajuste fiscal, o governo tem cortado medicamentos gratuitos para aposentados e pacientes com câncer, congelado orçamentos universitários e imposto uma reforma trabalhista que, embora parcialmente barrada pela Justiça, já vem sendo aplicada em diversos setores.
“O governo reduziu a inflação, mas à custa de não pagar absolutamente nada”, disse. A política de arrocho, segundo ele, tem gerado perdas severas para a classe trabalhadora e para os setores populares, ao mesmo tempo em que beneficia o grande capital.
A greve também se insere no contexto da tentativa de Milei de concluir um novo empréstimo com o Fundo Monetário Internacional. O acordo prevê o repasse de US$ 20 bilhões, com carência de quatro anos e pagamento em dez. O governo espera receber antecipadamente até 40% do valor, para conter a pressão sobre o câmbio e renovar vencimentos da dívida externa.
No entanto, economistas alertam que o novo endividamento dificilmente trará estabilidade e que as exigências do FMI apenas aprofundarão os cortes sociais. Segundo Quiqui, “os trabalhadores e os aposentados seguem sendo os alvos centrais do ajuste”.
Apesar do cenário de deterioração social, o sindicalista da FSM aponta que ainda há fragilidades na unidade do campo popular. “Não existe hoje uma força coesa do movimento operário. Mas Milei está sendo golpeado por seu próprio desgoverno. Inclusive, parte da base que o apoiou nas eleições começa a se desiludir”, avalia.
Para ele, o atual momento pode representar uma oportunidade histórica de reorganização popular, impulsionada pela mobilização da classe trabalhadora frente ao aprofundamento da crise social.
“Sabemos que este ano haverá eleições, e é possível que muitas estruturas partidárias tentem canalizar esse descontentamento. Mas é essencial que a classe trabalhadora assuma um papel de protagonismo na construção das alternativas”, afirmou.
A greve acontece a seis meses das eleições legislativas, quando Milei buscará ampliar sua base no Congresso. O descontentamento crescente entre os trabalhadores — inclusive entre ex-eleitores do presidente — pode abrir caminho para uma mudança na correlação de forças. Os sindicatos apostam em desgastar o governo nas urnas e nas ruas, barrando um modelo que, segundo eles, destrói direitos, amplia desigualdades e compromete a soberania nacional.
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