Médico goiano explica cirurgia inédita na América Latina para tratar obesidade: “Redução da busca compulsiva por alimentos”

O Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás (HC-UFG) realizou uma cirurgia inédita na América Latina, que promete revolucionar o tratamento da obesidade mórbida (grau III). O procedimento, realizado pela primeira vez na América Latina, consiste na estimulação cerebral profunda bilateral do núcleo accumbens, uma área do cérebro relacionada ao prazer, recompensa e vícios.

A operação, que envolve a implantação de eletrodos no cérebro de um paciente, visa tratar a obesidade de uma maneira inovadora, atuando diretamente nos circuitos cerebrais responsáveis pela compulsão alimentar. A cirurgia faz parte de um projeto de pesquisa que busca compreender a eficácia desse procedimento experimental, focando especialmente nos pacientes que não respondem a métodos tradicionais de tratamento, como dietas, exercícios e até medicações.

Dr. Osvaldo Vilela, neurocirurgião responsável pelo procedimento, explicou em entrevista exclusiva ao Jornal Opção que a motivação por trás da escolha dessa abordagem é tratar a obesidade não apenas como uma questão de ingestão de alimentos em excesso, mas como uma doença relacionada à compulsão. “A obesidade é uma doença gerada por compulsão alimentar, e nosso objetivo foi atuar nos circuitos cerebrais que estão ligados ao prazer e à recompensa, buscando reduzir a busca compulsiva por alimentos”, detalhou Dr. Osvaldo.

Osvaldo Vilela, neurocirurgião do Hospital das Clínicas UFG | Foto: Arquivo pessoal

Ele ainda esclareceu que o tratamento convencional, como a cirurgia bariátrica, tem seus limites e nem sempre oferece resultados satisfatórios, especialmente em 15% a 20% dos casos. “Enquanto a cirurgia bariátrica foca na parte do corpo que processa o alimento, nós estamos atuando diretamente no cérebro, na área que controla a vontade de comer”, afirmou.

O primeiro paciente a passar por esse procedimento foi Ivan dos Santos Araújo, um ajustador de granito de 38 anos, natural de Goiânia, que atualmente pesa 183 kg. Ivan começou a ganhar peso ainda na infância e, após um acidente em 2015, não conseguiu mais perder peso devido à sua mobilidade limitada. O procedimento foi realizado no dia 18 de março.

“A obesidade afetou minha vida em todos os aspectos. Fiquei muito tempo parado, sem poder me exercitar, e isso me trouxe dificuldades físicas e emocionais”, contou Ivan, que afirmou que, apesar de receoso com a novidade, confiava nos médicos e na pesquisa. “Fui muito bem orientado, me explicaram tudo sobre a cirurgia e os riscos. Agora, tenho grandes expectativas”, disse.

Ivan dos Santos Araújo, ajustador de granito | Foto: Arquivo pessoal

O núcleo accumbens, onde os eletrodos serão implantados, é uma região do cérebro envolvida em funções emocionais e comportamentais. “Ao estimular essa área, esperamos gerar uma sensação de prazer e bem-estar no paciente, diminuindo a busca por essas sensações na alimentação”, explicou Dr. Osvaldo. O procedimento foi realizado com a intenção de ajudar pacientes como Ivan, que sofrem com a compulsão alimentar.

A cirurgia é experimental e será acompanhada por uma equipe multidisciplinar de médicos durante dois anos. Os pacientes que participam da pesquisa serão monitorados de perto, com avaliações regulares, para medir os efeitos da estimulação cerebral profunda.

O tratamento promete não apenas ajudar no controle da obesidade, mas também no tratamento de problemas emocionais associados à condição, como a depressão e a ansiedade. O acompanhamento médico será rigoroso e incluirá o uso de escalas psicológicas e de compulsão alimentar, além de monitoramento constante do índice de massa corporal (IMC) e outros parâmetros de saúde.

Dr. Osvaldo, Ivan dos Santos e a equipe do HC – UFG envolvidas na cirurgua | Foto: Arquivo pessoal

A iniciativa foi aprovada após anos de estudos e planejamentos e conta com a colaboração da Universidade da Pensilvânia, nos Estados Unidos, conhecida por sua excelência em pesquisa científica. A equipe do HC-UFG realizou diversas reuniões com os pesquisadores da universidade para definir a melhor técnica de implantação dos eletrodos no núcleo accumbens.

Cirurgia inédita

Os pesquisadores do HC e da UFG começaram a escrever, em 2017, um projeto sobre cirurgia cerebral para obesidade, que seria para a implantação de eletrodos, um de cada lado do cérebro, para o tratamento da obesidade mórbida.

Apesar de ser uma técnica promissora, a cirurgia ainda é experimental e não está disponível no Sistema Único de Saúde (SUS). Dr. Osvaldo ressaltou que a pesquisa está em seus primeiros estágios e que só após um número significativo de pacientes tratados será possível determinar a eficácia da estimulação cerebral profunda para diferentes perfis de obesidade.

“Esse estudo colaborativo com a Universidade da Pensilvânia nos permitirá expandir o conhecimento sobre o tratamento e, quem sabe, oferecer novas alternativas para pacientes com obesidade que não respondem a métodos convencionais”, afirmou o neurocirurgião.

O especialista explica que dentro do cérebro há uma estrutura chamada hipotálamo, e no hipotálamo há dois centros importantes: um que é o centro da fome e o outro que é o centro da saciedade. Quando o centro da fome é ativado, a pessoa come. Quando o centro da saciedade é ativado, a pessoa para de comer. Em pesquisas realizadas no Brasil e em outros países, tentaram implantar eletrodos ou no centro da fome ou no centro da saciedade para inibir o centro da fome ou ativar o centro da saciedade para tratar a obesidade.

Ivan, por sua vez, acredita que sua experiência pode servir de inspiração para outros pacientes. “Eu espero que minha história ajude outras pessoas que também sofrem com a obesidade e que, como eu, enfrentam dificuldades para perder peso”, disse, otimista com a possibilidade de mudanças em sua vida. “Estou com grandes expectativas, confiando em Deus e na equipe médica para que tudo dê certo”, completou.

Enquanto isso, a equipe do HC-UFG continua acompanhando Ivan e os outros pacientes que participam da pesquisa, na esperança de que essa abordagem possa, no futuro, se tornar uma alternativa eficaz para o tratamento da obesidade mórbida, oferecendo uma nova esperança para milhares de pessoas que lutam contra a doença.

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