Família denuncia maternidade por se recusar a colocar imagem de Oxum em altar durante nascimento de criança


Família havia deixado imagem para ser colocada no altar da Maternidade Municipal de Salto de Pirapora (SP) a pedido da gestante. Imagem está desaparecida e não foi colocada no local porque, segundo a recepcionista, é necessária uma autorização. Maternidade Municipal de Salto de Pirapora (SP)
Reprodução/Facebook
Uma família registrou um boletim de ocorrência contra a Maternidade Municipal de Salto de Pirapora (SP) alegando ter sido vítima de intolerância religiosa por parte de funcionários do local. O caso ocorreu em 13 de março, mas os documentos foram divulgados somente na segunda-feira (24).
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Ao g1, Cíntia Delgado afirma que sua prima, Estefani de Abreu, fazia acompanhamento pré-natal na unidade durante o período de gestação. A mulher havia pedido que, quando o período próximo ao parto chegasse, a família colocasse a figura de uma orixá umbanda no altar religioso da maternidade.
“Minha prima fazia acompanhamento na maternidade e nós somos uma família quilombola. Vimos que havia um ‘altarzinho’ e, quando chegou a época do parto, levamos uma figura de Oxum pequenininha, de 15 centímetros, para que ela fosse colocada lá. Na última consulta, expliquei à recepcionista que, na umbanda, ela significa vida e era muito importante para a nossa religião”, conta.
Segundo a mulher, a recepcionista respondeu que guardaria a imagem e, assim que possível, seria colocada no altar por outros funcionários. Mas a figura não estava no local durante o parto da gestante, que ocorreu na noite do mesmo dia.
Imagem de Oxum, utilizada pela família quilombola
Arquivo pessoal
“Estefani entrou em trabalho de parto e, quando chegamos lá, a figura de Oxum não estava no altar. Mesmo com dor, minha prima perguntou da imagem. Perguntamos à recepcionista do turno e ela afirmou não saber de nada. No dia seguinte, a mulher com a qual eu havia deixado a imagem disse que ‘este tipo de imagem’ não poderia ser deixada ali sem autorização da prefeitura. Estamos ofendidos”, explica.
Sem entender o motivo, Cíntia questionou novamente a recepcionista, que, em resposta, afirmou que a família não precisaria de autorização se a imagem fosse relacionada à Igreja Católica. Mesmo assim, ela não obteve nenhum retorno positivo.
“Eu perguntei o que ela queria dizer com o termo ‘este tipo de imagem’. Fiquei cerca de dez minutos conversando com ela, explicando que o Estado é laico. Se as outras santas que já compõem o altar nunca causaram nenhum problema, por quê uma imagem tão pequena causaria algo? Mas ela disse que não tinha jeito e não conseguiu arrumar ninguém para conversar comigo”, pontua.
Cíntia afirma que, desde então, a imagem não foi devolvida à família. Ela entrou em contato com o prefeito do município, Matheus Marum (PSD), que, segundo a mulher, afirmou desconhecer qualquer tipo de regra envolvendo religiões de matrizes africanas.
“O prefeito disse que essa história nunca chegou até ele. Nunca ninguém perguntou para ele de imagem nenhuma. Então, parece ser uma decisão interna da maternidade. Só sei que a imagem não está no altar e não devolveram para nós”, destaca.
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De acordo com a mulher, Estefani ficou desapontada com a situação. A família chegou a fazer uma manifestação na cidade, mas ela alega que recebeu diversos comentários ofensivos nas redes sociais por protestar contra o caso.
“Nunca vi uma discussão na cidade sobre um santo no altar. Fizemos cartazes dizendo que mulheres do Axé também têm direito à maternidade. As pessoas estão dizendo que estamos tentando ‘colocar goela abaixo’, que queremos impor nossa religião. Enfim, eu prefiro focar nas pessoas que entendem que a umbanda é uma religião de resistência e que já são anos de invisibilidade”, lamenta.
O que dizem as autoridades
Em nota, a Prefeitura de Salto de Pirapora afirma que está ciente do caso e que é totalmente contrária a qualquer tipo de discriminação religiosa.
No entanto, a gestão alega que a Maternidade Municipal funciona sob administração privada da Santa Casa de Misericórdia de São Bernardo do Campo (SP) e que, por isso, é de responsabilidade da instituição se manifestar sobre o ocorrido.
O g1 entrou em contato com a Santa Casa, mas não conseguiu retorno até a publicação desta reportagem.
*Colaborou sob supervisão de Gabriela Almeida
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