Mudanças climáticas ameaçam exportações de banana na América Latina

Luiz Felipe Fernandes / SciDev.Net

O fim do verão no hemisfério sul ainda não amenizou as altas temperaturas na área onde Ervino Kogler cultiva bananas, em uma região semiárida no município de Bom Jesus da Lapa (BA). O temor é de que os meses de seca que se avizinham repitam o cenário de 2023, quando uma onda de calor provocou uma redução de 15% na colheita do ano seguinte.

Mesmo em condições normais, 60% da área de 100 hectares onde Kogler cultiva frutas já precisa de irrigação. “Mas quando a temperatura atinge algo próximo dos 40ºC, e com a umidade do ar muito baixa, as plantas, mesmo com irrigação, param de trabalhar”, conta.

Com os sucessivos aumentos da temperatura global, as perspectivas não são nada animadoras. Um estudo publicado na revista Nature Food prevê que, até 2080, o aumento das temperaturas poderá levar a uma redução de 60% na área adequada para a produção de banana para exportação na América Latina e no Caribe, caso não sejam adotadas medidas urgentes para enfrentar as mudanças climáticas.

Ervino Kogler em uma plantação de bananas. Bananas são uma fonte crucial de renda para países de baixa e média renda | Foto: Acervo Pessoal / Luiz Neves

Também é esperada queda na produtividade na maioria das áreas atualmente dedicadas ao cultivo de banana na região. Além disso, os cientistas concluíram que fatores socioeconômicos, como a disponibilidade de mão de obra e infraestrutura, limitam a adaptação às mudanças climáticas.

Os pesquisadores utilizaram imagens de satélite para mapear regiões de produção intensiva de banana, identificando os fatores climáticos, edáficos (relativos ao solo) e socioeconômicos que influenciam a viabilidade do cultivo.

Os resultados revelam que a produção de banana se concentra em regiões de baixa altitude, com temperaturas elevadas e estáveis, e solos levemente ácidos. Além disso, a maioria das áreas produtoras está próxima a portos e centros urbanos, o que limita o potencial de realocação para regiões mais adequadas.

“Algumas regiões já estão muito quentes, perto do limite para produção comercial, e elas ficarão muito quentes”, disse ao SciDev.Net Dan Bebber, professor de Ecologia da Universidade de Exeter, no Reino Unido, que liderou o estudo.

Segundo Bebber, Colômbia e Costa Rica são particularmente vulneráveis, o que é preocupante para a indústria de exportação voltada para a Europa e América do Norte. O cenário só foi favorável no Sul do Brasil, que já é uma região fria, e no Equador, cujas previsões não indicam um aquecimento tão acentuado.

“Descobrimos que o sensoriamento remoto por radar via satélite foi muito útil para detectar a produção intensiva de banana”, explicou Bebber. “No entanto, muitos países insulares do Caribe, como o Haiti, produzem bananas de forma menos intensiva, e não conseguimos detectar com precisão esses sistemas de produção”, acrescentou. Sua equipe pretende desenvolver outros métodos para monitorar esse tipo de produção.

US$ 11 bilhões

Ervino Kogler com muda de banana | Foto: Acervo Pessoal / Luiz Neves

A banana é um dos produtos agrícolas mais exportados do mundo, com um mercado avaliado em cerca de US$ 11 bilhões anuais. A fruta é uma fonte crucial de renda para países de baixa e média renda. Na Colômbia, por exemplo, o comércio de banana responde por cerca de 5% do Produto Interno Bruto (PIB) agrícola e emprega quase 300 mil trabalhadores direta ou indiretamente, segundo o estudo.

Além disso, por ser um alimento básico consumido globalmente, ameaças à sua produção também representam riscos à segurança alimentar em diversos países.

Desde 2020, o Brasil incluiu o cultivo da banana no Zoneamento Agrícola de Risco Climático (ZARC) – um mapeamento dos riscos de plantio e produção da fruta diante das condições climáticas.

O pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) Maurício Coelho disse ao SciDev.Netque o ZARC tem permitido observar que regiões subúmidas secas do país têm se tornado semiáridas. “Regiões nas quais, embora com um risco climático alto, ainda era viável trabalhar com bananeira sem irrigação, passaram a ter necessidade do uso da irrigação para mitigar os riscos”, detalha.

Estratégias de mitigação

Diversas estratégias têm sido adotadas para mitigar os impactos das mudanças climáticas. Em seu bananal, Ervino Kogler precisou aumentar o número de irrigações diárias e direcionar a água para mais partes das plantas.

O problema é que a disponibilidade de água também é afetada pelo aquecimento global. Para isso, pesquisadores têm estudado variedades de bananas mais tolerantes à seca. Entre elas estão duas variedades de banana-maçã desenvolvidas pela Embrapa, que apresentam um consumo de água 25% menor em comparação a cultivares tradicionais.

Segundo Coelho, esses híbridos de banana foram inicialmente desenvolvidos para resistir a doenças causadas por fungos, como as sigatokas negra e amarela, mas surpeendetemente também se mostraram menos exigentes à água.

Cientistas indianos também observaram que a exposição de mudas de banana Grand Naine – uma das variedades mais comuns – a um aumento gradual de temperatura de 30ºC para 42ºC pode prepará-las para enfrentar temperaturas mais elevadas no futuro. Com os experimentos, foi possível identificar os genes e vias metabólicas envolvidos na aquisição da termotolerância.

“Alguma memória molecular estará lá para elas [as mudas de banana] lidarem com o estresse maior”, explicou ao SciDev.Net Kundapura Ravishankar, do Instituto Indiano de Pesquisa em Horticultura (ICAR). Ele acrescentou que as descobertas do estudo são relevantes para diversas regiões do mundo.

Em outra frente de desenvolvimento tecnológico, a Embrapa, juntamente com uma empresa de biofertilizantes, desenvolveu um “protetor solar” para plantas, que reduz os danos às folhas e frutos causados pelo calor excessivo. A substância, diluída em água, pode ser pulverizada com bombas costais, tratores ou até drones. Coelho explica que a proteção melhora as trocas gasosas das plantas, que ocorre por meio da fotossíntese.

Segundo ele, experimentos em curso em bananais têm demonstrado que plantas sem a proteção solar apresentam 30% menos clorofila – pigmento verde essencial para a fotossíntese – do que as plantas que receberam o produto.

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