A década da pecuária requer um plano para a pecuária

Na semana que foi de 16 a 20 de dezembro de 2024, o Fórum de Pecuária Sustentável, organizado pela Mesa Brasileira de Pecuária Sustentável, aconteceu entre dois grandes anúncios feitos pelo Ministério da Agricultura.

O primeiro, o lançamento de um Plano Nacional para a Identificação de Bovinos e Bubalinos, que pretende expandir a identificação individual do rebanho brasileiro com vistas a aperfeiçoar a rastreabilidade e o controle sanitário no país.

Um plano construído com a participação da cadeia, e que prevê etapas na sua implementação que foram definidas de forma consensual, dado o tamanho do desafio.

O segundo anúncio foi o lançamento da Plataforma Agro Brasil + Sustentável, que pretende integrar dados públicos de propriedades rurais com o objetivo de oferecer garantias socioambientais da produção brasileira ao mercado.

Entre os dois anúncios, o Fórum debatia a rastreabilidade como ferramenta de acesso a mercados e como o setor pode contribuir positivamente para a agenda do clima, em um ano onde a COP volta ao Brasil em um cenário internacional desafiador.

Marcos Jank, do Insper, convidado do evento, afirmou acreditar que estamos entrando na “década da pecuária”.

Réveillon, o nome que damos à festa de virada de ano, vem do verbo francês réveiller, despertar. Normalmente é quando as pessoas fazem um balanço do que foi seu ano e pensam nas mudanças que o novo ano pode trazer.

Eu acredito que com o ano que se inicia, a mensagem de Jank poderia ser a faísca de um despertar para o setor. Despertar para o que exatamente?

Na Mesa reunimos elos da cadeia que vão da produção, indústria, varejo, passando também pelos setores de insumos, serviços, sociedade civil e finanças.

Há um consenso de que a pecuária brasileira pode ter uma contribuição positiva para a natureza, inclusive entre as ONGs que atuam no setor.

Com técnicas da agropecuária de baixo carbono, novas tecnologias, e a implementação efetiva do Código Florestal, temos uma produção que não só é aliada à conservação, mas que tem um potencial gigantesco de aumentar a produção ao mesmo tempo em que reduz emissões, sem necessidade de desmatamento ou abertura de novas áreas.

Aqui é aonde queremos chegar.

Nosso desafio é que esse modelo ótimo de produção ainda não é a realidade de toda a produção. Segundo dados levantados pela Athenagro para a Abiec, cerca de 76% da área ocupada com pastagens no Brasil ainda tem uma produtividade abaixo da média.

Além disso, a estrutura da produção pecuária no país mostra que a imensa maioria de estabelecimentos é de pequenos e médios produtores (com média nacional de 71 animais por propriedade).

Ao mesmo tempo, o boi ainda é usado como meio de ocupação de áreas públicas especialmente na Amazonia.

Se sabemos aonde queremos chegar e sabemos onde estamos, como podemos ao longo dessa década que começa com o ano da COP no Brasil trabalhar para a transformação necessária da cadeia produtiva?

Seria possível construir um plano através de uma articulação público privada que defina esse norte e as ações necessárias para um avanço sem precedentes no setor? Que inclua a rastreabilidade, assistência técnica e disseminação de boas práticas, financiamento, regularização, apoio a pequenos produtores?

Já temos políticas públicas anunciadas e em curso que podem contribuir com isso.

Além do PNIB e da Agro Brasil + Sustentável, temos o Plano Nacional de Conversão e Recuperação de Pastagens Degradadas, os Planos de Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazonia, Cerrado e outros biomas, as políticas de crédito rural, e o Código Florestal, com maiores ou menores gargalos para avançar.

Ao mesmo tempo, existem inúmeras iniciativas privadas de apoio a produtores.

Articular todas essas políticas e iniciativas em torno de um objetivo comum, e um plano, pode ajudar a catalisar as ações, ampliar o impacto e acelerar as entregas.

O ano de 2025 começou com uma carta aberta assinada por mais de 150 ganhadores de prêmios Nobel e World Food Prizes, defendendo ações urgentes para aumentar a produção de alimentos, em um mundo onde 700 milhões de pessoas ainda vivem em insegurança alimentar e com uma população que deve chegar a 1,5 bilhão de pessoas até 2050.

Despertemos para a conclusão inevitável de que o Brasil é possivelmente onde temos a melhor chance, em todo o mundo, de contribuir para reduzir essa insegurança, gerar oportunidades de desenvolvimento econômico e ao mesmo tempo mitigar os efeitos da crise climática. Mas para isso é necessário planejamento e articulação.

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Um adendo: Na mesma semana dos grandes anúncios, o Comitê Gestor do Programa de Integridade e Desenvolvimento da Pecuária do Pará fazia sua reunião final de 2024 em Belém.

O Pará é um grande laboratório de uma articulação público privada em prol do setor. Secretarias, Indústrias, Produtores, Sociedade Civil buscando soluções e planejando ações concretas que tragam segurança, regularização, produtividade, rastreabilidade em um estado onde a pecuária tem papel fundamental na economia. Um esforço que merece o apoio e contribuição de todos.

Fernando Sampaio é engenheiro agrônomo, diretor de Sustentabilidade na Abiec e cofacilitador da Coalizão Clima, Florestas e Agricultura.

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