Déficit do Tesouro é maior do que sugerem balanços oficiais

Folha de São Paulo

Manobras orçamentárias – para inflar receitas, mascarar despesas públicas e driblar limites legais – começaram a ser utilizadas em grande escala no final do segundo governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), tornaram-se prática corrente da também petista Dilma Rousseff e voltaram com toda força na ofensiva frustrada de Jair Bolsonaro (PL) pela reeleição.

Como o acúmulo histórico desses expedientes distorce resultados e pode levar a comparações indevidas, estudiosos passaram a fazer análises mais sofisticadas dos balanços do Tesouro Nacional, expurgando não só os efeitos da contabilidade criativa como os de eventos extraordinários, caso da pandemia. Tais cálculos se mostram novamente úteis neste terceiro mandato de Lula.

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A administração petista tem propagado que conseguiu reduzir o déficit primário (excluindo gastos com juros) a 0,1% do PIB no ano passado, algo como R$ 11 bilhões, o que parece um tremendo progresso ante os 2,4% de 2023.

Já estão excluídos dessa conta cerca de R$ 30 bilhões em despesas classificadas como extraordinárias para o enfrentamento de tragédias climáticas. Há mais a considerar, entretanto.

Como mostrou na Folha o colunista Marcos Mendes, o rombo subiria a 0,9% se contabilizados, além dos dispêndios emergenciais, desembolsos relativos a 2024 antecipados em 2023 – quando não estavam em vigor as atuais regras fiscais – e receitas adiadas de um ano para o outro. Em outras palavras, o governo piorou o resultado de 2023 para obter melhora mais acentuada em 2024.

Segundo estimativas da Instituição Fiscal Independente (IFI), ligada ao Senado, que descontam a influência de fatores atípicos, as despesas do governo cresceram 4,3% acima da inflação no ano passado, depois de uma alta de descomunais 11% no retrasado.

Outro colunista deste jornal, Bráulio Borges, chamou a atenção para estudo do próprio Tesouro Nacional acerca do chamado resultado fiscal estrutural, que expurga fatores temporários e cíclicos para aferir a real evolução da política orçamentária.

Por essa metodologia, o superávit de 0,55% do PIB oficialmente apurado no último ano Bolsonaro – com a ajuda da alta do petróleo e de um calote nos precatórios – dá lugar a um déficit de 0,8% do produto potencial.

Ainda que tal cálculo possa sustentar o discurso político da herança desfavorável recebida, é inescapável que os números pioraram dramaticamente sob Lula, com déficit de 2% no primeiro ano de governo e de 1,16% nos três primeiros trimestres de 2024.

O que se vê com clareza, portanto, é que a gestão petista foi iniciada com aumento inaudito do gasto público, que hoje se reflete em alta da inflação e dos juros. Obter uma melhora na comparação com a calamidade de 2023 significa pouco na busca pelo reequilíbrio orçamentário. Sem ajustes bem mais profundos e rápidos, o governo levará o país a uma crise econômica.

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