EXCLUSIVO: Tributos, parcerias, Fiagros – as propostas em estudo para a independência financeira da Embrapa

As contas da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) não fecham há muito tempo. Salários e benefícios dos 7,4 mil funcionários consomem R$ 4 bilhões por ano. Para a máquina funcionar, o comando da estatal precisaria de R$ 500 milhões em custeio, mas pediu R$ 376 milhões e teve aprovados R$ 176 milhões no Orçamento de 2024.

Após contingenciamentos, a Embrapa encerrou o ano passado sem receber R$ 26 milhões, o que levou a cortes de serviços e renegociação de dívidas com fornecedores. Hoje, segundo a estatal, apenas 27% do orçamento de custeio da Embrapa vem do Tesouro Nacional e 73% são de parcerias.

Com ao menos uma década de achatamento orçamentário e sem conseguir reduzir a folha de pagamento, a atual gestão da Embrapa criou um grupo de trabalho para buscar novas fontes de recursos externos. Além de ampliar a fatia dos recursos privados e ampliar os valores captados, a meta é torná-la independente financeiramente do governo federal.

O AgFeed teve acesso ao resumo com as propostas do grupo apresentadas ao Conselho de Administração (Consad) no final do ano passado. O documento ainda será avaliado pelo próprio Consad antes de ser levado ao Ministério da Agricultura.

Mas medidas polêmicas não faltam. Entre elas estão a tributação da produção do agronegócio, o chamado modelo checkoff de captação, e a transferência de recursos já captados por outros fundos e contribuições para a Embrapa.

No caso do checkoff, a ideia é cobrar um tributo sobre o total de R$ 1,16 trilhão por ano movimentado pela agropecuária dentro da porteira, e/ou pela exportação, que movimenta US$ 165 bilhões.

Já a proposta de transferência prevê destinar para a Embrapa parte dos R$ 27,6 milhões já captados por contribuições que vão para a modernização industrial.

Além da repercussão negativa que teriam nos setores do agronegócio e industrial, são propostas que dificilmente seriam aprovadas no Congresso.

Entre as sugestões menos complexas e mais viáveis para a captação estão a criação de um Fundo Patrimonial e a de Fundos de Investimentos nas Cadeias Produtivas do Agronegócio (Fiagros).

O modelo do Fundo Patrimonial prevê a busca de recursos diretamente de doações, como é comum, por exemplo, em universidades norte-americanas, ou alienação de ativos da própria Embrapa. Mas, para colocá-lo em pé, seria necessária a criação de um arcabouço jurídico e legal.

Já o modelo pensado para os Fiagros captaria recursos para financiar projetos de pesquisa e inovação utilizando receitas provenientes dos royalties pagos à Embrapa pelos produtos licenciados.

A única diferença estrutural para os Fiagros privados seria a licitação necessária para a contratação de administradores e gestores dos fundos.

Por fim, outra ideia é ampliar o modelo dos Núcleos de Inovação Tecnológica (NIT), em operação desde 2018. O modelo prevê a captação de recursos a partir de parcerias com empresas.

Em entrevista exclusiva ao AgFeed, a presidente da Embrapa, Silvia Massruhá, ressaltou que as propostas do grupo de trabalho ainda devem passar pelo Consad e por várias instâncias do governo – ou seja, só seriam aplicadas em 2026, na melhor das hipóteses.

Ela admitiu as dificuldades para emplacar o modelo checkoff de captação, mas avaliou que uma tributação de 0,05% sobre a produção agropecuária, por exemplo, já resolveria a demanda orçamentária da Embrapa.

“Mas isso tem que ser conversado com o setor produtivo. Então, não é fácil”, avaliou.

Silvia considerou “possível” e que “está analisando a viabilidade” da criação de Fiagros e reforçou a necessidade de se ter um ou mais instrumentos de captação privada para a Embrapa na mesa.

“A gente está fazendo essa matriz de risco, o que é politicamente viável, o que é tecnicamente viável, para a gente discutir com o ministro. O nosso compromisso é implementar em 2025, escolhendo um desses modelos”, explicou.

Silvia destacou que o NIT foi implantado em 2024, com a captação de R$ 3,7 milhões por meio de uma parceria público-privada para o projeto do inoculante BiomaPHOS. “A gente tem um modelo de como esse recurso entra, como ele retroalimenta a pesquisa, para subsidiar novos projetos”, explicou.

Cobranças

Além das dificuldades orçamentárias, na entrevista a presidente da Embrapa antecipou o que apresentará ao grupo de notáveis, liderado pelo ex-presidente da estatal Silvio Crestana, em reunião prevista para fevereiro.

Como mostrou o AgFeed, o grupo elaborou e entregou ao ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, um estudo para a reformulação da estatal baseado em quatro pilares: descentralização da gestão, reformulação jurídica, definição de temas prioritários para pesquisa e novos modelos de financiamento de pesquisa.

A proposta foi entregue em novembro de 2023, mas até o momento não houve resposta de Fávaro. “O ministro pediu que o Consad implementasse as ações e a diretoria da Embrapa, à luz desse relatóri,o também. Então, imediatamente, a gente já começou a executá-las”, afirmou Silvia.

Segundo a presidente, além da revisão do plano diretor da Embrapa em 2023, modelo já adotado nas unidades descentralizadas, uma área de planejamento orçamentário foi criada para trabalhar melhor a distribuição de recursos junto às unidades.

Outra ação foi a abertura de um concurso para 1.027 vagas, com 180 perfis de candidatos e para todas as unidades. “A gente ficava preocupada de ficar alguma vaga descoberta, mas para todos os perfis houve inscrição e a gente ficou bem satisfeita”.

Segundo a presidente da Embrapa, houve ainda uma revisão em processos internos na sede da estatal, em Brasília, para simplificar as operações. De 24 unidades centrais, a Embrapa passou para 13 unidades, uma economia de aproximadamente R$ 1 milhão por ano.

Funcionária da Embrapa há 35 anos, com passagens por toda a hierarquia – de pesquisadora a chefe-geral de unidade -, a presidente da estatal sabe dos desafios que terá para emplacar as propostas. Mas reconhece que a única saída para fazer a Embrapa crescer é ter um modelo de financiamento sustentável.

“Independente da diretoria ou do governo que vier, se você tem um modelo sustentável de financiamento, você pode fazer muito mais para o país”, concluiu.

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