Para driblar o ambiente de juros altos, o setor de FIIs pede diversificação

Era para ser um ano muito positivo para os Fundos de Investimentos Imobiliários (FIIs) – mas, como quase tudo que envolve o mercado brasileiro em 2024, foi exatamente o contrário. Com a subida de juros no Brasil, o resultado foi a queda de quase 6% do Ifix, com os FIIs de tijolo levando o prêmio de pior desempenho.

Para driblar o ambiente desafiador, os gestores estão diversificando seus portfólios e estratégias.

Não é que o ano tenha sido de todo mau para o segmento – afinal, ele alcançou R$ 44,3 bilhões em captação, um salto de 46,1% no volume de emissões ante os R$ 30,3 bilhões registrados em 2023, segundo dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima).

Mas dois terços desse volume foi no primeiro semestre, quando o cenário doméstico estava mais amigável. Com a deterioração do macro e, consequentemente, o início do aperto monetário, o barco balançou. “Para esse ano não conseguimos nem projetar a captação, porque está muito desafiador. Não dá para ter um racional”, comenta Flávio Pires, head de FIIs do Santander.

A saída? Usar o cenário ao seu favor. Foi isso que a Rio Bravo fez ao aproveitar as cotas extremamente descontadas – nas mínimas históricas, com uma desvalorização de até 15% no segundo semestre – para montar um portfólio e criar seu hedge fund em agosto do ano passado.

“Nesses últimos dois meses, surfamos a onda [das cotas desvalorizadas] e hoje temos um book com um resultado muito relevante, porque pegamos o Ifix se recuperando [em dezembro]. Acreditamos que, mantendo esses fundos numa janela de 6 a 15 meses, podemos começar a vender porque vamos ter um ganho melhor lá na frente, mais o carrego”, diz Guilherme Rheingantz, gestor do Rio Bravo Hedge Fund.

Além de aproveitar os preços baratos, o executivo conta que o momento pedia uma estratégia mais ampla para alocar. O ponto de virada para essa percepção foi quando a Rio Bravo não pôde integrar um FIDC imobiliário que ela própria estruturou, já que seus dois FIIs de crédito, o RHG11 e o RHY11, tinham um regulamento muito restrito.

“Tive que vender o FIDC para uma outra gestora e eles ficaram com a cereja do bolo”, relembra.

Do desafio à solução, eles resolveram criar o novo fundo para ter maior liberdade de alocação. É exatamente isso que os hedge funds se propõem: ter um mandato mais aberto, com possibilidade de alocar em outros FIIs, seja de tijolo ou de papel, em Fundos de Fundos (FOFs), ações do mercado imobiliário e ativos físicos.

Com uma equipe multidisciplinar, segundo o gestor, o apelo foi bom, mesmo em meio ao ambiente mais difícil: o hedge fund, que teve uma oferta exclusiva para clientes da EQI Investimentos, levantou R$ 250 milhões e alcançou 6.791 cotistas, com investimento mínimo de R$ 1.036,40.

O fundo não é listado em bolsa e tem as cotas negociadas no mercado secundário no ambiente de balcão da B3. Entre os primeiros números de retorno, o yield anualizado em novembro ficou em torno de 12% – sendo que a alocação não estava completa. Dentro do hedge fund há mais de 25 FIIs investidos, com fundos de tijolo, desenvolvimento e crédito, sendo tanto para renda quanto para valor.

“Para o cotista na ponta final que acreditou na gente foi um baita investimento, porque estávamos com um caminhão de dinheiro em um mercado extremamente estressado. Mas claro, tudo com muita cautela”, comenta Rheingantz.

Para Pires, do Santander, os hedge funds vieram para ficar justamente pelo mandato mais aberto e maior liberdade de alocação. Um levantamento do Clube FII mostrou que, em 2017, existia apenas um hedge fund no mercado. Hoje, em 2024, esse número saltou para 19 – considerando apenas os listados.

O patrimônio saltou de R$ 2 bilhões em 2020 para R$ 11 bilhões em 2024. Para além do momento mais complicado no macro, trata-se praticamente de uma evolução natural que um mercado que vem ganhando cada vez mais profundidade no país.

“O crescimento do hedge fund vai ser meio natural, já que é uma nova possibilidade no escopo do regulamento dos fundos, que devem buscar essa maior liberdade de investimento dentro da carteira”, Danilo Barbosa, sócio-diretor de Research do Clube FII.

Crescimento do patrimônio de hedge funds (Clube FII/Reprodução)

Cotas divididas

De hedge funds às cotas divididas. A JiveMauá foi pioneira com outra estratégia para enfrentar o cenário adverso. Em um momento em que ninguém conseguia captar, a gestora, que tem mais de R$ 19 bilhões sob gestão e 250 mil investidores, realizou a maior oferta do segundo semestre do ano passado e a terceira maior do ano, com o MCLO11.

O fundo, focado no segmento de galpões logísticos, atraiu mais de 14 mil cotistas e levantou R$ 1,24 bilhão. O diferencial foi a separação de cotas para o varejo, que só foi possível graças à CVM 175. “A gestora quebrou as cotas, em uma sênior – com prioridade no pagamento – e outra subordinada. A cota sênior foi para o varejo e a subordinada para o investidor institucional, parecido com FIDC”, explica Guilherme De Luca, sócio e RI da estratégia de imobiliário da JiveMauá.

Para o varejo, a gestora entregou uma remuneração menor, mas com um risco menor e sem volatilidade – em IPCA + 9%, vindo dos aluguéis. Já para o investidor institucional, o potencial de retorno foi alto, em que as premissas indicam em torno de 20% a 25% ao ano, vindo das possíveis vendas dos galpões.

“Eu coloco esse produto num combo de fundos criativos que nasceram de um mercado muito ruim que vivemos de fundos imobiliários. Os gestores estão se movimentando, porque está muito difícil competir com a renda fixa”, afirma De Luca.

A hora do crédito: patrimônio em FIDCs supera pela primeira vez o de fundos de ações

M&As

Um movimento que o mercado vivenciou em 2023 agora pode voltar em 2025: os M&As (fusões e aquisições) também deve ser uma tendência neste ano. Novamente o ambiente de juros altos faz uma espécie de seleção natural e o mercado passa por uma consolidação – e o case da Pátria é o que ilustra bem esse cenário.

Em setembro do ano passado, a casa se tornou a maior gestora de ativos imobiliários com a aquisição completa da VBI Real Estate e da vertical de Real Estate do Credit Suisse Hedging-Griffo (CSHG), alcançando os R$ 24 bilhões de ativos sob gestão, em 18 FIIs listados na B3, além dos 2 FIIs negociados em balcão da B3.

“Naquele momento, pensamos que o mercado estava mais competitivo e seletivo, então precisávamos estar associados. Nós, VBI, sem um parceiro institucional ficaria cada vez mais difícil, o perigo era ficar estacionado”, conta Rodrigo Abud, atual sócio e head de real estate do Pátria e um dos sócios-fundadores da VBI.

A associação com alguém grande foi benéfico para a gestora. Em 2022, ela tinha R$ 6 bilhões sob gestão, quando 50% foi adquirido pelo Pátria. Dois anos depois, quando foi 100% adquirido, já havia dobrado de tamanho: R$ 12 bilhões sob gestão.

E a própria VBI já havia feito esse movimento ao adquirir ao longo dos anos outras gestoras menores, como Blue Macaw, Bari e More. O movimento não surpreende: ao olhar mercados desenvolvidos, a consolidação é muito mais forte. Nos Estados Unidos, há 200 fundos em um mercado de US$ 1 trilhão. No Brasil, há quase 500 fundos em um mercado de R$ 160 bilhões.

“Uma gestora de até R$ 500 milhões não dá dinheiro, está nascendo. Próximo ao R$ 1 bilhão, está sobrevivendo, mas não remunera sua estrutura. Só vai conseguir remunerar depois de R$ 4 bi, mas só respira depois dos R$ 6 bi. Unir é um racional que faz muito mais sentido para o gestor e para o investidor”, diz Abbud.

Neste sentido, os fundos conseguem se proteger da volatilidade – o que também fez a VBI fez se fundir ao Pátria. A exemplo, Abbud cita o HGLG11, maior fundo de logística do Brasil do Pátria, que caiu 7,6% no pico mais difícil de novembro, enquanto fundos menores chegaram a cair até 30%.

FIIs vão se recuperar?

Apesar das mais diversas estratégias e produtos, os FIIs vivem um período difícil. No entanto, os especialistas dizem que o segundo semestre pode ser melhor que o primeiro de 2025.

Para Pires, do Santander, só quando os juros futuros alcançarem o teto, será possível visualizar o cenário melhor. “Vemos os juros chegando a 15%, mas o mercado especula 16% a 17%. Tendo um teto de juros, olharemos com outros olhos, conseguiremos ver os fundos no micro.”

Para se recuperar antes de julho, só caso o governo apresentasse um novo pacote fiscal ou medidas complementares. Enquanto isso, Pires aconselha para quem tem ativos imobiliários com bons fundamentos na carteira, aguardar. Mais ainda não vê bom ponto de entrada: segundo ele, o ideal é esperar para marcar posição.

Barbosa, do Clube FII, concorda que a curva de juros futuros pressionada prejudica as cotas dos FIIs, mas enfatiza que é necessário olhar além do valor do papel, já que a proposta dessa classe de ativos também é renda.

“Quando observamos somente a precificação do valor das cotas, vai estar no negativo, por conta do contexto de renda variável mais desafiador, mas as pessoas esquecem de calcular o retorno total considerando que ela recebeu esse dividendo todos os meses.”

++ Notícias

  • Coopavel reforça tática da diversificação, com R$ 300 milhões e novos negócios para 2025

  • Elétricas lidam com juros mais altos e rendimento menos atraente em 2025, diz Bradesco BBI; veja as indicações

  • Meta removeu a checagem de fake news — mas engajamento e receita continuam altos

  • Onde investir em 2025? E-book gratuito reúne as melhores ações, FIIs, títulos de renda fixa e criptomoedas para investir

  • Veto de Lula vai taxar os FIIs e Fiagros? Entenda o que muda agora e quais ativos são os mais promissores neste cenário

O post Para driblar o ambiente de juros altos, o setor de FIIs pede diversificação apareceu primeiro em Market Insider.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.