O que o governo de Lula tem contra os diabéticos tipo 1?

Pedro Sérgio dos Santos

É difícil o diálogo com um governo que pensa que é Estado. A máquina pública deve cumprir seu papel independentemente de quem está de plantão no volante na ocasião em que a necessidade se faz presente.

Dar vida às políticas públicas passou, para uma militância sem juízo, a ser, na história recente do Brasil, sinônimo somente do que chamam de políticas afirmativas para as minorias identitárias, enquanto grandes grupos sociais, com problemas relevantes, amargam o ostracismo.

A título de exemplo, vale lembrar que o Brasil tem cerca de 30 milhões de diabéticos e ainda são pífias as políticas públicas e de atenção do Estado para essa população.

Parte significativa dessa população possui o diabetes tipo 1, que é muito agressiva e limita muitos aspectos da vida cotidiana de uma pessoa.

Gravidade: cegueira, amputações e morte

O deputado Zacharias Calil, um dos autores da versão original da proposta de lei vetada pelo presidente Lula da Silva, considera “imprescindível” classificar o diabetes tipo 1 como deficiência, a exemplo do que ocorre nos Estados Unidos, no Reino Unido, na Espanha e na Alemanha. A diabetes mellitus (tipo 1) impõe ao doente a desigualdade, em razão de problemas no corpo; limitações para atividades, gerando desafios e restrições na execução de tarefas diárias normais. Pode ainda gerar cegueira, amputações e até mesmo a morte em tempo mais rápido em razão da falência de órgãos vitais.

A proposta de lei de número 2687/2022, considerando a pessoa com diabetes mellitus como portador de deficiência física e, de consequência, recebendo os benefícios da lei teve aprovação no Congresso Nacional.

Mas, segundo o noticiário eletrônico (segundo o site do próprio governo: GOV.BR — https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/2024/junho/dia-nacional-do-diabetes-cerca-de-30-milhoes-de-atendimentos-foram-realizados-em-2023) do Senado, do dia 13.01.2025 , o presidente da República optou pelo veto após “ouvir o Ministério da Fazenda, o Ministério do Planejamento e Orçamento, o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, o Ministério da Saúde e a Advocacia-Geral da União (AGU).” (Fonte: Agência Senado).

Assim, fica bem explicado o veto: os ministérios da Fazenda e do Planejamento não enxergam o ser humano, somente os cifrões.

O Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos ainda não inovou nada de significativo para o país em termos institucionais e entrou de gaiato nesse parecer.

O Ministério dos Direitos Humanos age como profetizou o autor do consagrado livro “A Revolução dos Bichos”. Nesta obra, George Orwell mostrou que, na fazenda onde os porcos tomaram o poder, determinou-se que todos os animais eram iguais, porém uns mais iguais que outros, os porcos.

Voltemos à afirmação inicial deste texto: o governo woke vem priorizando grupos identitários, que pagam os favores recebidos com a promoção de um carnaval eleitoral em cada pleito, sendo sempre uns considerados “mais humanos” que outros, principalmente quando estão nominados com intermináveis siglas e letras e protegidos por sua mídia mal-intencionada e maledicente.

O Ministério da Saúde, por sua vez, devendo, em tese e por óbvio, cuidar da saúde, ao apoiar ao veto já apresenta a piada pronta e tudo se fecha com chave de ouro quando a AGU sobe ao picadeiro e diz ao respeitável público, com aquela chata linguagem jurídica, que o espetáculo circense terminou. Entretanto, o drama para os diabéticos continua…

Outro projeto enviado à Câmara dos Deputados, por professores da Universidade Federal de Goiás, prevê a legalização da venda de medicação para diabéticos com preços reduzidos, com a retirada de impostos, indicando que ainda que a medicação seja utilizada por outras pessoas com fins diversos , o governo pode criar mecanismos de identificação do diabético cadastrado e retirar somente para esses os custos tributários da medicação.

Nessa toada, teme-se ainda que essa proposição seja essa ideia aprovada no Congresso, e, caso o atual presidente recorra aos “sábios palpites” de seus conselheiros, é mais uma proposta que pode dar em nada.

Todavia, se de um lado o governo pode alegar que a retirada de tributos na medicação pode reduzir a arrecadação, como sempre aponta a equipe econômica; de outro lado, vale pensar que cada pessoa diabética é também um consumidor de outros produtos juntamente com sua família, e que, ao ter valores da medicação reduzidos, haverá uma sobra de dinheiro para outros gastos e assim haverá uma circulação de dinheiro em outros setores da economia e de consequência a respectiva tributação.

Ou seja, é uma falácia da equipe econômica alegar que o Estado não deve atender as necessidades básicas dessa população (que, no caso, não é de picanha e cerveja) tão- somente por uma questão tributária.

Nesse contexto não se sabe se vivemos dominados pela má-fé ou pela incompetência (ou até mesmo pela duas, para os mais realistas). Seja qual for, o processo democrático precisa ser aperfeiçoado para que se entenda de fato o que é fazer política pública com “P” maiúsculo e as próximas eleições possam nos agraciar com gestores mais qualificados.

Pedro Sergio dos Santos é professor titular da Universidade Federal de Goiás e no Programa de Pós-graduação em Direito e Políticas Públicas. Doutor em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco.

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