Trump vai invadir Panamá e anexar Groenlândia e Canadá: loucura demais para um imperialista?

Rui Martins

O ano começa mal e poderá ficar pior. Quem garante isso é o milionário Donald Trump, de volta à Presidência dos Estados Unidos dentro de alguns dias, numa conversa com a imprensa praticamente quatro anos depois de ter incitado o ataque ao Capitólio.

Saboreando seu retorno ao poder, quer posar como um conquistador e não se envergonha de revelar suas aspirações expansionistas: tomar o Canal do Panamá, se apossar da Groenlândia e tornar o Canadá num novo Estado norte-americano, com o uso da força militar se for preciso. Esse é só o aperitivo, depois tem mais…

Estamos delirando, foi champagne demais no réveillon ou Trump está propondo mesmo trazer a guerra para perto de nossas fronteiras? O presidente do Panamá já disse não estar disposto a ceder os 77 km do canal, projetado e iniciado, em 1880, pelo francês Ferdinand de Lesseps, com sua experiência na construção do Canal de Suez. Cinco anos depois, a empresa faliu.

Nessa altura, a região onde tinham começado as obras do Canal pertencia à Colômbia. Mas o presidente norte-americano Theodore Roosevelt percebeu a importância geográfica e econômica do empreendimento e negociou o controle da região com a Colômbia para concluir o Canal. Entretanto, o Senado colombiano não aprovou o acordo.

Diante desse impasse, os EUA incentivaram o movimento de independência do Panamá que, em contrapartida, lhes concederia o controle da região e a continuação da construção do Canal. A frota norte-americana ficou por perto, impediu a intervenção colombiana e os EUA passaram a ter o controle da zona, pagando também 10 milhões de dólares mais uma espécie de aluguel anual.

Com base nas pesquisas de um médico cubano, foi promovida a erradicação dos mosquitos transmissores da febre amarela, em 1905, causadores até ali de milhares de mortes de trabalhadores. O Canal foi inaugurado em 1913 com a presença do presidente norte-americano e foi muito utilizado pelos EUA durante a Segunda Guerra Mundial, para chegar ao Japão depois do ataque a Pearl Harbor.

No fim do século passado, foram aplicados os tratados que previam uma entrega gradual do controle da região ao Panamá. Esse controle implicou na ampliação do Canal, a fim de poder ser utilizado por navios maiores e mais largos.

Invasão armada no Panamá

Se Donald Trump quiser retomar o controle do Canal poderá negociar um novo acordo com o Panamá. Imagina-se ser a ameaça de uma invasão armada um tipo de pressão própria de Trump. Como no passado, os EUA de Trump poderiam usar de sua força econômica e militar para fomentar um golpe, em troca do retorno do controle do Canal.

No caso de um ataque militar, o Panamá não terá condições para se defender, pois desde 1990 dissolveu as forças armadas, decisão confirmada quatro anos depois pelo Parlamento. Entretanto, é imaginável a intervenção direta ou indireta de alguns países e a criação de um clima geral de instabilidade. O Brasil teria um papel importante nesse tipo de crise.

Em todo caso, o presidente do Panamá, José Raúl Mulino, já disse num comunicado publicado na plataforma social X que “cada metro quadrado do Canal continuará pertencendo ao Panamá”.

Groelândia, Dinamarca e Canadá

Com relação à ameaça trumpista de se apossar da ilha da Groenlândia, ela revela a maldosa dualidade do seu pensamento. Embora seja negacionista e esteja disposto a bloquear e dificultar todas medidas destinadas a impedir ou atrasar o processo das mudanças climáticas, Trump deseja abocanhar essa região pouco habitada, administrada pela Dinamarca, para os EUA se beneficiarem do derretimento das águas marítimas próximas do Ártico e assim passarem a dispor de uma nova rota marítima para a Ásia. Além de poder se tornar base estratégica, a ilha de Groenlândia é rica em recursos minerais e petróleo.

Com relação ao Canadá, Trump não pretende enviar tropas armadas mas exercer um forte pressão para o governo canadense ver a grande vantagem de se integrar nos EUA, não só do ponto de vista aduaneiro com o fim das taxas alfandegárias, como pela proteção representada diante, no caso de guerra, de ataques de navios russos ou chineses.

Essa questão alfandegária foi um dos pontos de desacordo dentro do governo canadense, responsáveis pela demissão do primeiro-ministro Justin Trudeau, para quem “o Canadá nunca, jamais, fará parte dos Estados Unidos”. Ao que Elon Musk respondeu, trocando maldosamente presidente por governador: “você não é mais governador do Canadá, o que você diz não tem nenhuma importância”.

Como se não bastasse Donald Trump ter o apoio irrestrito do dono da plataforma X, Elon Musk, acaba de receber a sujeição de Mark Zuckerberg, dono da Meta. Ambos são contrários a qualquer tipo de censura nas redes sociais, abrindo o caminho para o uso em profusão das fake news.

Rui Martins é jornalista, escritor, ex-CBN e ex-Estadão, exilado durante a ditadura. Criador do primeiro movimento internacional dos emigrantes, Brasileirinhos Apátridas, que levou à recuperação da nacionalidade brasileira nata dos filhos dos emigrantes com a Emenda Constitucional 54/07. Escreveu “Dinheiro Sujo da Corrupção”, sobre as contas suíças de Maluf, e o primeiro livro sobre Roberto Carlos, “A Rebelião Romântica da Jovem Guarda”, em 1966. Vive na Suíça, correspondente do Expresso de Lisboa, Correio do Brasil e RFI.

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