O que a trilha do dinheiro de 2024 diz sobre o futuro da indústria de fundos

Bolsa de valores em queda, dólar em alta e juros reais nas alturas. Apesar do cenário econômico desfavorável no ano passado, a indústria brasileira de fundos de investimentos encerrou 2024 com uma captação líquida positiva de R$ 60,67 bilhões. Foi o melhor saldo desde 2021, revertendo quase toda a saída líquida de R$ 61,9 bilhões registrada em 2023.

O movimento foi impulsionado principalmente pelos fundos de renda fixa, que se beneficiaram da retomada da alta de juros pelo Banco Central. Essa classe de fundos registrou a maior captação de sua história, com entrada de R$ 242,98 bilhões, superando o recorde anterior de R$ 240,97 bilhões, de 2021.

“É uma realidade muito atraente para ativos de baixo risco, que estão oferecendo retornos elevados. Esse movimento reflete o patamar atual da taxa de juros”, afirma Pedro Rudge, sócio-fundador da Leblon Equities e diretor da Anbima.

Dentro da categoria de renda fixa, uma parcela significativa dos recursos foi direcionada para fundos de crédito. Os fundos de classificação livre, em especial, responderam por R$ 156,20 bilhões da captação. Além da alta dos juros, a valorização desses fundos foi favorecida pelo fechamento dos spreads de crédito — a diferença entre a remuneração de títulos privados e públicos. Com essa redução, os títulos privados se valorizaram, impulsionando as cotas dos fundos e alimentando o fluxo de entrada.

Esse movimento foi ainda mais expressivo nos fundos de debêntures de infraestrutura. Isentos de imposto de renda, esses produtos ganharam destaque diante da incidência dos come-cotas em fundos exclusivos e de maiores restrições na emissão de títulos incentivados, como CRIs e CRAs.

Com os spreads já comprimidos e menor espaço para ganhos via marcação a mercado, os gestores de crédito adotaram uma postura mais cautelosa. Sem poderem apostar na abertura dos spreads, muitos aumentaram o caixa para proteção e buscaram instrumentos de renda fixa alternativos com melhor relação risco-retorno. A principal escolha foram os FIDCs, que atingiram uma captação recorde de R$ 113,47 bilhões em 2024, quase o triplo do registrado no ano anterior.

Os FIDCs, fundos de crédito estruturados, operam principalmente na antecipação de recebíveis, podendo ter lastro em relações comerciais entre empresas ou em crédito pessoal, como consignado e saques-aniversários do FGTS.

“Tem ocorrido uma grande desintermediação bancária, com o mercado financeiro ganhando espaço na concessão de crédito via FIDCs. As plataformas digitais também têm facilitado a venda desses produtos, ampliando as opções de investimento”, explica Rudge.

Por outro lado, parte do dinheiro que migrou para a renda fixa veio de fundos multimercados, que tiveram o pior ano da história, com saídas de R$ 357,7 bilhões em 2024. Esse número foi amplificado pelo desmonte de fundos exclusivos, amplamente classificados como multimercados. Mas grandes gestoras também enfrentaram resgates significativos. Um levantamento do BTG Pactual, que considerou apenas os multimercados “puro sangue”, revelou saídas próximas de R$ 100 bilhões, contra cerca de R$ 60 bilhões em 2023.

José Cassiolato, sócio da RGW Investimentos, atribui o movimento ao fraco desempenho dos principais representantes da classe. “A retomada dos multimercados dependerá de uma melhora na performance. Grandes gestores decepcionaram nos últimos dois anos, reduzindo a atratividade desses fundos. Com os resgates, as gestoras perderam receita, tendo que enxugar suas equipes.”

Os fundos de ações também contribuíram negativamente para a indústria, com resgates de R$ 10 bilhões em 2024. Foi o quarto ano consecutivo sem captação expressiva. Embora muitos especialistas enxerguem oportunidades na bolsa, o investidor só deve retornar quando os resultados começarem a aparecer — e o consenso é de pessimismo.

“É um cenário muito desafiador para a renda variável. Não há nenhum gatilho para atrair o investidor local. Também não vejo o estrangeiro voltando, com o dólar forte por mais tempo sob o governo Donald Trump”, diz Marcelo Mello, CEO da SulAmerica Investimentos.

Enquanto isso, a perspectiva para 2025 é de continuidade da captação nos fundos de renda fixa, impulsionados pela alta da Selic, que deve subir de 12,25% para 15%, segundo projeções de mercado.

Na frente de crédito privado, o aumento do risco devido aos juros elevados e os spreads ainda comprimidos devem reduzir o potencial de retorno no início do ano. “Mas a entrada deve ganhar força ao longo de 2025, conforme os spreads se normalizarem”, avalia Mello.

Cassiolato também vê o atual patamar de juros como favorável para os fundos de crédito, ainda que os retornos possam ficar ligeiramente abaixo do CDI. Uma possível saída líquida desses fundos, ele observa, ocorreria apenas com um aumento significativo no apetite por risco, direcionando investidores para a bolsa e multimercados. Para isso, seria necessária uma melhora nas condições econômicas.

“No final do ano, a discussão política deve ganhar força. Caso surja um candidato viável e com postura diferente [para a eleição presidencial de 2026], a percepção de risco pode mudar rapidamente. Por enquanto, o que está precificado é a continuidade da leniência do governo com os gastos”, diz Rudge.

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