Como a reforma tributária vai afetar quem vende, compra ou aluga imóveis?

A regulamentação da reforma tributária vai delinear como o novo sistema tributário será aplicado no Brasil gradualmente a partir de 2026. As novas regras foram apresentadas na forma do Projeto de Lei Complementar (PLP) 68/2024, aprovado no último dia 17 de dezembro pelo plenário da Câmara dos Deputados. O projeto agora segue para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

A reforma tem como principal efeito a unificação de cinco tributos — ICMS (Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias) , ISS (Imposto sobre Serviços), IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), PIS (Programa de Integração Social) e Cofins (Contribuição para Financiamento da Seguridade Social) — em uma cobrança única, que será dividida entre os níveis federal, com a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), e estadual e municipal, com o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que formam dois impostos de valor agregado (IVA).

E como o mercado imobiliário entra nesta história? À EXAME, o advogado Lucas Bettim, do escritório Benites Bettim Advogados, explica como ela pode impactar o setor.

O IVA abrangerá operações que, atualmente, não são alcançadas por todos esses tributos, como compra e venda, locação ou arrendamento de imóveis, sujeitos apenas às contribuições ao PIS e à Cofins em algumas ocasiões no modelo atual.

“Pode-se dizer que a regulamentação proposta pelo PLP 68/2024 torna a tributação mais rigorosa para quem realiza transações imobiliárias frequentes ou de grande porte, enquanto oferece benefícios direcionados a imóveis populares e operações pontuais”, diz o advogado.

A reforma tributária trouxe, portanto, mudanças significativas para quem vende imóveis, tornando o vendedor – seja pessoa física ou jurídica – o sujeito passivo da obrigação tributária em relação ao IBS e CBS. Esses impostos incidem diretamente sobre as operações de venda, com regras específicas dependendo do perfil do vendedor e da natureza da transação.

No caso de pessoas físicas, a reforma estabelece critérios claros para identificar quem será considerado contribuinte do IBS e CBS. O objetivo é tributar atividades que se assemelhem a práticas empresariais. Assim, passam a ser contribuintes:

  • Quem vende mais de três imóveis no ano anterior, adquiridos há menos de cinco anos;
  • Quem vende mais de um imóvel construído por si mesmo nos últimos cinco anos.

Para quem não se enquadra nesses critérios, a venda de imóveis continuará sujeita apenas ao Imposto de Renda (IR) sobre o ganho de capital e à incidência do ITBI (
Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis – Inter Vivos), como já ocorre atualmente. Isso significa que esses contribuintes estarão isentos de pagar o IBS e CBS.

“Já as empresas que realizam vendas de imóveis estarão sujeitas ao IBS e CBS, mas com um desconto de 50% na alíquota padrão (desconto também aplicado às pessoas físicas), resultando em uma carga tributária efetiva de aproximadamente 15,9% sobre o lucro das operações. Embora esse benefício mitigue o impacto tributário, ele representa um aumento em relação ao regime anterior, o que pode reduzir a rentabilidade em algumas situações”, explica Bettim.

Favorecimento do mercado popular

Para imóveis residenciais novos destinados à moradia, a reforma introduz um benefício significativo: um redutor social de R$ 100 mil na base de cálculo do IBS e CBS. Esse mecanismo visa tornar mais acessíveis os imóveis populares, especialmente para famílias de menor renda. Para lotes residenciais, o redutor é de R$ 30 mil, o que também reduz a carga tributária e favorece pequenos compradores interessados em construir.

A reforma também alterou o momento em que o tributo é devido. No caso da venda de imóveis, o IBS e CBS incidem no ato da alienação, abrangendo inclusive promessas de compra e venda com pagamento parcial. Isso significa que o imposto será exigido mesmo que o pagamento ainda não tenha sido concluído ou esteja condicionado a fatores futuros.

Como a reforma afeta quem compra imóveis

A reforma tributária afeta pessoas que compram imóveis de forma indireta, uma vez que os novos tributos incidem sobre o vendedor, e não sobre o comprador. O impacto pode ser sentido nos preços finais, pois a tributação sobre o vendedor pode ser repassada ao consumidor em determinadas transações.

Enquanto há mecanismos criados para baratear os imóveis populares, os de maior valor podem sofrer um impacto tributário mais elevado.

Com a aplicação de alíquotas efetivas de cerca de 15,9% sobre o lucro das operações de venda, os custos para o vendedor podem aumentar, especialmente em imóveis de alto padrão. Isso pode levar a uma elevação nos preços de mercado, afetando diretamente o comprador.

“Embora o comprador não seja o sujeito passivo do IBS e CBS, ele permanece, em regra, responsável pelo pagamento do ITBI (Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis), que continua vigente e é aplicado sobre o valor da transação do imóvel adquirido. Esse tributo é pago no momento do registro do imóvel em cartório”, afirma Bettim.

Em casos específicos, como leilões judiciais, o comprador pode ser o sujeito passivo do IBS e CBS. Nessa situação, os impostos incidentes sobre a operação são de sua responsabilidade direta, o que pode impactar os custos totais da aquisição.

Como ficam os alugueis

Para os aluguéis, foi proposta a redução da alíquota padrão, de 26,5%, na proporção de 70%, resultando em uma tributação efetiva de até 7,95% sobre o valor dos aluguéis para além da tributação de imposto de renda, quando incidente.

Além das pessoas jurídicas, estarão sujeitas à tributação as pessoas físicas com receita anual de mais de R$ 240 mil provenientes de mais de 3 imóveis alugados (equivalente a R$ 20 mil por mês), montante que deverá ser corrigido mensalmente pelo IPCA. Ainda, caso a renda anual da pessoa física proveniente de aluguéis ultrapasse 20% desse valor (ou seja, R$288 mil), ela também será tributada, mesmo que detenha menos que 3 imóveis alugados.

No que diz respeito ao redutor social, foi proposta a dedução de R$ 600 na base de cálculo de cada imóvel locado. Ou seja, o tributo será devido somente referente ao valor que ultrapassar essa quantia em relação a cada imóvel.

Os inquilinos, por sua vez, poderão ver os valores dos aluguéis subirem em função do repasse da carga tributária pelos proprietários que estarão sujeitos aos novos tributos. Ou seja, ainda que a responsabilidade pelo recolhimento dos impostos seja do locador, o locatário poderá arcar com o ônus tributário, assemelhando-se à compra de produtos e serviços.

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