Médico utiliza o próprio câncer para explicar sua relação com doenças infecciosas e crônicas


Larry Schlesinger, que também é cientista e professor, afirma que é prioritário pesquisar as enfermidades causadas por vírus, bactérias e parasitas, porque elas desempenham papel relevante no agravamento das condições de saúde Larry Schlesinger é médico, cientista, professor e presidente do Texas Biomedical Research Institute, uma instituição sem fins lucrativos. Em meados de dezembro, escreveu um artigo bastante impactante, no qual mostrava a relação entre infecções, doenças crônicas e o câncer, com uma peculiaridade: ele utilizou sua própria história como exemplo.
Larry Schlesinger é médico, cientista, professor e presidente do Texas Biomedical Research Institute
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“Há alguns anos, fui diagnosticado com câncer de boca (ou câncer de lábio e cavidade oral) e meus médicos rastrearam sua origem: uma infecção por papilomavírus humano, o HPV, contraída décadas atrás. Tenho 69 anos e, na juventude, não havia a vacina que é capaz de prevenir cerca de 90% dos casos de HPV associados ao desenvolvimento do câncer. Se tivesse nascido em outra época, não teria enfrentado a doença”, relatou.
Felizmente, Schlesinger está em remissão, mas quis tornar sua experiência pública para enfatizar que não se pode separar as chamadas doenças crônicas, como a cardíaca, diabetes, câncer e obesidade, das infecciosas, como se não houvesse vínculo entre elas.
“Priorizar o tratamento de condições crônicas, como são classificadas aquelas que duram mais de três meses, deveria ser também priorizar doenças infecciosas, causadas por vírus, bactérias e parasitas, porque elas desempenham um importante papel nos quadros crônicos. Pesquisar a conexão entre elas é a única forma de resolver a crise de saúde”, alertou.
No artigo, essalta que as pesquisas para desvendar o papel de bactérias e vírus para o surgimento de enfermidades crônicas ainda são recentes. A Associação Americana para a Pesquisa do Câncer (AACR em inglês) tem uma estimativa conservadora de que 13% dos casos de câncer no mundo estão atrelados a um quadro infeccioso.
Antes da década de 1980, acreditava-se que as úlceras de estômago eram provocadas por estresse, até que dois cientistas australianos descobriram que a bactéria Helicobacter pylori colonizava a mucosa do órgão, ocasionando a inflamação conhecida como gastrite que predispunha os indivíduos a úlceras pépticas e câncer. Em 2005, os estudos lhes valeram o Prêmio Nobel de Medicina.
O vírus Epstein-Barr, da família da herpes, está associado a inúmeras moléstias, como mononucleose e lúpus eritematoso e esclerose múltipla – ambas autoimunes. A Doença de Chagas, transmitida por um protozoário presente nas fezes do inseto “barbeiro”, leva à insuficiência cardíaca.
“Aumentam as evidêncidas de que infecções como pneumonia, sífilis, herpes, Doença de Lyme (causada por carrapatos) e periodontal (das gengivas) contribuem para o desenvolvimento de enfermidades neurodegenerativas, como o Alzheimer. A chave para entender a conexão é o processo inflamatório. Quando enfrentamos um vírus ou bactéria, o sistema imunológico prepara uma resposta: vermelhidão, inchaço, calor e dor são sinais de inflamação que indicam que o organismo está combatendo o agente agressor. No entanto, se ela se estende por muito tempo, se torna crônica e nociva, porque ataca os tecidos saudáveis, e pode ser o gatilho para doenças crônicas”, escreveu.
Dois em cada dez brasileiros que tiveram Covid-19 sofreram com a Covid longa, um bom exemplo de inflamação crônica que afeta duramente a qualidade de vida das pessoas: os sintomas incluem fadiga extrema e problemas de memória e concentração. Nos Estados Unidos, são cerca de 17 milhões que apresentam esse quadro. “Uma coisa é certa: todos teremos diversas infecções ao longo de nossa existência. É imperativo que continuemos investigando como as doenças infecciosas contribuem para condições inflamatórias crônicas”, finalizou.
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