Lula inicia segunda metade do mandato no modo reeleição e tenta repactuar aliança com centro-direita

Por Vera Rosa, do Estadão

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva iniciou a segunda metade do seu mandato, neste ano-novo, no modo reeleição. Embora nem a cúpula do PT saiba se Lula vai mesmo disputar mais uma vez o Palácio do Planalto, em 2026, toda a organização do governo, a partir de agora, tem como meta esse cenário político.

Há um diagnóstico no Planalto de que os principais ministérios da área social, como Saúde e Educação, precisam acelerar o passo para construir suas próprias vitrines. O slogan do terceiro mandato do PT é “União e Reconstrução”, mas o País continua dividido e o julgamento da trama golpista neste ano – quando se completam 24 meses do 8 de Janeiro – promete acirrar ainda mais os ânimos dos aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro.

Lula aguarda a escolha dos novos presidentes da Câmara e do Senado, em fevereiro, para fazer a reforma ministerial. Hugo Motta (Republicanos-PB) e Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), respectivamente, já são considerados eleitos, mas há incertezas no horizonte sobre como será a relação com o Congresso.

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Nos dias que antecederam a virada do ano foram muitas as cabeçadas entre o governo e o Congresso por causa do bloqueio de emendas parlamentares ao Orçamento determinado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino.

Mas não foi só: ao sancionar a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2025, Lula também restringiu a liberação de emendas, mesmo as impositivas, para cumprir os limites de gastos estabelecidos pelo arcabouço fiscal. Além disso, barrou um novo cálculo para o aumento do fundo que financia os partidos.

Nos bastidores, interlocutores do presidente já esperam a retaliação em votações assim que terminarem as férias de deputados e senadores, sem contar uma cobrança maior de fatura, em troca da renovação do apoio. Com um detalhe importante: nem o Orçamento de 2025 foi votado ainda.

É sob esse sistema de “toma lá, dá cá” cada vez mais forte que Lula tentará fazer uma repactuação com partidos aliados de centro e de direita que hoje não estão comprometidos com o projeto da reeleição, embora comandem ministérios com orçamentos robustos. Nesta lista figuram o MDB, o PSD e o PP.

Um dos interlocutores de Lula disse à Coluna, sob reserva, que a “amarração” feita pelo presidente com os partidos, no início de 2023, era para a sustentação do governo no Congresso. Agora, porém, essa solda precisa levar em conta o apoio nas disputas de 2026. O PT fará tudo para ampliar sua bancada no Senado, hoje com nove representantes, e deter o avanço do bolsonarismo na Casa de Salão Azul.

Secretário de Governo na gestão Tarcísio de Freitas, o presidente do PSD, Gilberto Kassab, classificou como remota a possibilidade de seu partido estar com Lula e muito menos com outro candidato petista, em 2026. O PSD comanda três ministérios no governo – Minas e Energia, Agricultura e Pesca – e pode ganhar mais espaço na reforma da equipe de Lula.

Dividido, o MDB tem uma ala que quer continuar na aliança com o PT em 2026, desde que o candidato a vice na chapa seja emedebista, e não mais Geraldo Alckmin (PSB). Hoje, o nome mais citado pelo MDB, que também controla três ministérios – Transportes, Cidades e Planejamento – é o do governador do Pará, Helder Barbalho. Um outro grupo do partido, no entanto, vai insistir na candidatura própria.

O PP tem o Ministério do Esporte e a Caixa e pode aumentar sua cota no governo, embora, até agora, nada indique que ficará com Lula ou quem ele escolher como sucessor mais adiante. Partidos como Republicanos e União Brasil também estão oficialmente no barco de Lula, mas, com um pé em várias canoas, discutem abertamente chapas próprias para 2026.

Apesar das negativas, Tarcísio tem chance de ser candidato ao Planalto pelo Republicanos, com aval de Bolsonaro. O governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), tenta, por sua vez, se consolidar para disputar a cadeira de Lula. Mas tem enfrentado resistências internas.

É nessa balbúrdia política que surge o fator decisivo: a economia. A ascensão do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, como possível sucessor de Lula nas fileiras do PT está atrelada ao sucesso nessa seara. A alta de juros sinalizada pelo Banco Central, no entanto, já indica o encolhimento econômico.

O dólar acima de R$ 6 e os juros na estratosfera serviram como biombo para esconder conquistas do governo, como o indicador da extrema pobreza abaixo de 5%, pela primeira vez na história, e a queda da taxa de desemprego. O crescimento previsto para 2024, em torno de 3,5%, não deve se repetir em 2025, já batizado por analistas como “o ano da desaceleração”.

De qualquer forma, ao decidir mudar a comunicação, Lula está convencido de que precisa atrair a classe média e a faixa de eleitores que recebe acima de dois salários mínimos, os chamados “remediados”, além dos evangélicos. Como fazer isso é outra história que nem o próprio governo sabe.

No Planalto, porém, a música “Sujeito de Sorte”, de Belchior, virou hit. Diz ela: “Tenho sangrado demais, tenho chorado pra cachorro. Ano passado eu morri, mas esse ano eu não morro”. Feliz Ano-Novo!

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