Economia com pacote fiscal caiu até R$ 20 bilhões, estima Maílson da Nóbrega

O ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega avalia que o pacote aprovado no Congresso sofreu cortes importantes em relação ao que o Executivo enviou ao Legislativo. Ele calcula que a economia fiscal com as medidas vai ficar entre R$ 10 bilhões e R$ 20 bilhões menor em dois anos.

Ele cita a retirada da alteração na regra de reajuste do Fundo Constitucional do Distrito Federal e a “mudança marota” na forma de conter os supersalários, que agora vai ser feita por lei ordinária e não por lei complementar.

No primeiro caso, ele diz que não faz sentido o governo federal ser ainda responsável pelos gastos de segurança, saúde e educação do Distrito Federal. É uma regra herdada de quando a capital era no Rio de Janeiro e abre janela para mais gasto público:

— É uma cidade rica, com o alto poder de compra dos funcionários públicos.

No segundo caso, a mudança vai limitar o teto para os salários somente para o Poder Executivo. Judiciário e Ministério Público são excluídos, exatamente “onde se observam as maiores distorções”, diz Maílson.

— Ficaram de fora aonde se observam os maiores privilégios e maior vergonha. Houve desembargador de São Paulo falando que a proposta agredia a dignidade do Judiciário, mas o que agride são esses privilégios inaceitáveis. É uma verdadeira casta na sociedade. Os juízes estaduais vão continuar ganhando R$ 100 mil por mês.

Cenário externo mudou

Silvia Matos, economista da Fundação Getulio Vargas (FGV), afirma que se o pacote tivesse sido anunciado mais cedo este ano, quando o cenário externo estava mais favorável, com os juros caindo nos Estados Unidos e na Europa, ele teria mais efeito nas expectativas.

Ela diz que mesmo com as inconsistências do arcabouço fiscal, com algumas despesas obrigatórias crescendo acima do limite imposto pela regra fiscal, o mercado deu o benefício da dúvida. E, ao invés de controle de gastos, diz Silvia, houve redução nas metas de resultado primário.

—Desde meados de outubro, o mundo mudou bastante, o dólar se fortaleceu, veio o Trump, que provocou outra estilingada no câmbio, e a vida dos países emergentes ficou mais difícil. O pacote seria suficiente para ganhar tempo se o contexto internacional fosse outro. Agora o mundo mudou, e o buraco fiscal ficou maior. O tempo que o governo teria para tentar encontrar novas receitas se esgotou.

Ela lembra que o mercado financeiro perdeu dinheiro, apostando que haveria controle fiscal, juro em queda e inflação controlada, mas o governo no início do ano reduziu a meta de resultado primário e a inflação começou a sofrer com choques de oferta, com os alimentos subindo muito. Silvia estima que a inflação de alimentos vai ser de 9% este ano:

— O mercado começou a precificar um cenário de nunca pagar essa dívida, foi o que ocorreu ao longo desses dias. O próprio governo ficou muito tempo sem dar uma resposta. O mercado perdeu muito dinheiro, o juro que era para cair subiu, os bancos deram crédito e, com os juros mais altos, a inadimplência vai subir. E o câmbio desvalorizou bastante.

‘Dólar alto, juro alto e inflação alta’

Para Maílson será difícil para o governo fazer novas medidas de ajuste:

— A maior preocupação do mercado e dos credores é o crescimento ininterrupto da relação da dívida/PIB. É preciso anunciar e lutar para medidas de grosso calibre, para reverter a crise de confiança.

Sem isso, alerta Maílson, há risco de novo round de alta de dólar. Ele avalia que a moeda não ficará mais abaixo de R$ 6, “a não ser em momentos fugazes”:

— A perspectiva é de prevalência dos três cavaleiros do apocalipse: dólar alto, juro alto e inflação alta.

Para o economista, o governo precisa desistir da isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, desvincular o salário mínimo das aposentadorias e pensões, e acabar com a indexação das despesas com saúde e educação:

— Mas essas medidas vão contra o DNA do PT. É uma receita fácil de formular, mas quase impossível de ser executada. Vamos continuar com essa desconfiança, com o mercado olhando cada vez mais com lupa a situação fiscal.

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