Empregos e contratos irregulares beneficiaram parentes de secretária da Apae que está desaparecida, diz polícia


Investigação é realizada em paralelo ao inquérito que apura o suposto assassinato da secretária executiva da entidade em Bauru (SP). Filha, irmã, cunhado e ex-marido de Cláudia Lobo, desaparecida desde agosto, estão entre os presos. Polícia afirma que ela foi morta pelo ex-presidente da Apae, que está preso. Polícia Civil dá detalhes da investigação sobre desvios da Apae em Bauru; 8 foram presos
As investigações da Polícia Civil revelaram que membros da família de Cláudia Lobo, ex-secretária executiva da Apae de Bauru (SP) desaparecida desde agosto, eram diretamente beneficiados por empregos e contratos suspeitos dentro da entidade. Uma operação foi deflagrada nesta terça-feira (3) para apurar desvios milionários na instituição e oito pessoas foram presas.
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Segundo a apuração esclarecida em uma coletiva de imprensa na manhã desta quarta-feira (4), Letícia Lobo, filha de Cláudia, era uma funcionária fantasma, que recebia salários sem exercer qualquer função.
“As investigações nos permitiram concluir que esses parentes da Cláudia estavam empregados lá com os salários. Por exemplo, a filha dela tinha um contrato informal com a Apae de prestação de serviço. E quando a gente solicita informações oficiais a Apae diz que não havia um contrato formal, mas que havia um pagamento mensal, um salário pra Letícia no valor de R$ 2,5 mil” , explica Gláucio Stocco, delegado responsável pelo caso.
Ellen Lobo, irmã de Cláudia, e seu marido, Diamantino Campagnucci, mantinham uma empresa de produtos de limpeza que faturou R$ 120 mil em pagamentos por produtos que nunca foram entregues à Apae.
Outro caso destacado foi o de Pérsio Prado, ex-marido de Cláudia e pai de Letícia, que possuía um contrato para digitação de notas fiscais doadas.
Família de secretária desaparecida da Apae era beneficiada com empregos e contratos irregulares
TV TEM/Reprodução
Apesar do trabalho estipulado com o pagamento de R$0,03 a R$0,04 por nota digitada, seu salário ultrapassava R$8 mil mensais, o que demandaria um volume irreal de mais de 200 mil notas lançadas manualmente em um único mês, algo humanamente impossível, segundo o delegado.
“A partir desse salário, quando nós investigamos o caso, a gente percebe que uma parte desse salário ficava para a Cláudia, aí a figura de rachadinha.”
Além desses casos, a investigação identificou desvios por meio de métodos como superfaturamento de contratos, transferências bancárias irregulares para benefício próprio e desvio direto de valores das contas da Apae por meio de adiantamentos e gratificações.
Esses outros esquemas beneficiaram outros presos no processo, como Renato Golino, Maria Lúcia Miranda e Renato Tadeu de Campos. Segundo as investigações, essas pessoas recebiam quantias a mais, além de seus salários tabelados.
Saiba quem são os presos em ação contra desvios milionários
Outro exemplo destacado pelo delegado envolve os sorteios promovidos pela APAE de Bauru. Em um desses eventos, Renato Golino, que ocupava o cargo de coordenador financeiro da instituição, foi o ganhador de um carro. A Polícia Civil investiga se houve manipulação ou irregularidades no sorteio.
“Como o então coordenador financeiro da Apae, ele é sorteado com o maior prêmio que era disponibilizado na época, e quando a gente solicita informações da Apae, eles explicam como é que funciona a sistemática de sorteio, inclusive como era feita a conferência dos bilhetes”, afirma o delegado.
Outras 18 pessoas físicas e jurídicas tiveram seus bens bloqueados. Já os oito presos durante a operação são investigados pelos crimes de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Além das prisões, a polícia apreendeu veículos, joias, armas e dinheiro pertencentes aos investigados.
Um dos mandados de prisão expedidos na operação era contra o ex-presidente da entidade, Roberto Franceschetti Filho, que está preso desde o dia 15 de agosto, suspeito de ter assassinado Cláudia.
Saiba quem são os presos na operação contra desvios milionários da Apae de Bauru
Reprodução
Foram apreendidas armas, munições e dinheiro na operação que investiga desvios na Apae em Bauru
Anderson Camargo/TV TEM
Suposto assassinato
Em paralelo a essa investigação, a Polícia Civil também concluiu o inquérito em relação ao desaparecimento e suposto assassinato de Cláudia.
Em coletiva de imprensa realizada no dia 26 de agosto, a polícia confirmou que Cláudia foi assassinada por Roberto Franceschetti Filho, porém, o corpo da secretária ainda não foi localizado.
Segundo as investigações, Cláudia foi morta com um único tiro disparado pelo ex-presidente da Apae dentro do carro da entidade, antes de o veículo ser abandonado na região do bairro Vila Dutra.
Imagens de uma câmera de segurança mostram o presidente saindo do banco de passageiro e assumindo o volante, enquanto Cláudia vai para o banco traseiro. O carro permaneceu estacionado por três minutos, momento em que, segundo a polícia, Roberto disparou contra Cláudia.
Após o crime, ele teria acionado Dilomar Batista, então funcionário do almoxarifado da Apae, a quem ameaçou para que ajudasse no descarte do corpo. Dilomar foi ouvido pela polícia e confessou ter ajudado a queimar o corpo de Cláudia sob ameaça de Roberto.
O funcionário relatou que o corpo foi incinerado em uma área de descarte usada esporadicamente pela Apae e, quatro dias depois, ele retornou ao local para espalhar as cinzas em áreas de mata ao redor.
No dia do crime, Dilomar assumiu o veículo que Cláudia dirigia e o abandonou na região da Vila Dutra, de onde ele e Roberto partiram em outro veículo da instituição.
Desaparecimento de secretaria executiva da Apae completou três meses e nenhum indício de corpo foi encontrado
Reprodução
Câmeras de segurança e sinal de celular
Mais de uma semana após o desaparecimento de Cláudia, um sinal de celular confirmou que Roberto esteve no local onde o carro da entidade usado por ela foi encontrado.
O documento também menciona que o histórico de chamadas do celular de Roberto mostra movimentações na rodovia SP-321, que liga Bauru a Arealva (SP), e no local onde o veículo foi encontrado, no dia seguinte ao desaparecimento.
Imagens de uma câmera de segurança divulgadas pela Polícia Civil mostram também o veículo que a funcionária da Apae dirigia circulando próximo ao local onde foi encontrado, no dia seguinte ao crime.
Polícia Civil divulga novas imagens do carro que funcionária da Apae dirigia
Buscas pelo corpo
Ainda não há confirmação de que os vestígios de ossos encontrados no local indicado por Dilomar, onde Cláudia teria sido carbonizada, sejam realmente da funcionária. O material segue em análise no Núcleo de Biologia e Bioquímica da Polícia Científica de São Paulo.
Durante as buscas, a polícia encontrou os óculos da funcionária, que foram reconhecidos por seus parentes.
O exame balístico também confirmou que um estojo de pistola calibre 380, encontrado dentro do veículo no qual Cláudia foi vista pela última vez, foi disparado pela arma apreendida na residência do ex-presidente da associação.
Polícia fez buscas por possível corpo da funcionária da Apae desaparecida, Cláudia Regina da Rocha Lobo
Reprodução/TV TEM
Suspeito preso e motivação
A Polícia Civil confirmou que, no dia em que foi preso, Roberto Franceschetti Filho confessou informalmente que matou Cláudia, informação que orientou as investigações a partir dali.
Antes de ser investigado como principal suspeito, Roberto tentou desviar as investigações, sugerindo que um familiar de Cláudia, que havia sido preso por tráfico, estivesse envolvido no caso, alegando que a secretária estaria arcando com dívidas desse parente.
Ao mesmo tempo, a coordenadora financeira da Apae confirmou que Roberto liberava “adiantamentos” que eram registrados como pagamentos para fornecedores, sendo diretamente repassados para Cláudia.
O computador de Cláudia foi periciado, e nele foram encontradas planilhas de contabilidade pessoal com indícios de inconsistências financeiras, incluindo valores em aberto relacionados a Roberto.
A investigação concluiu que havia uma disputa de poder entre o ex-presidente da Apae e a secretária executiva. Segundo o delegado, Roberto era, na verdade, subordinado a Cláudia. Supõe-se que ela teria colocado o suspeito na presidência da entidade, e depois ele quis se desvincular dela.
A Justiça de Bauru aceitou o pedido da 3ª Delegacia de Homicídios (3ª DH) da Divisão Especializada de Investigações Criminais (Deic) e decretou a prisão preventiva de Roberto Franceschetti Filho. O inquérito foi finalizado em 10 de outubro e encaminhado para o Ministério Público.
No inquérito, Dilomar foi indiciado pelos crimes de ocultação de cadáver e fraude processual. Sua prisão foi pedida durante a investigação, mas negada pela Justiça, pois não foram encontrados outros elementos que justificassem a prisão preventiva, e os crimes pelos quais ele foi indiciado têm penas mais brandas. Ele segue sendo investigado em liberdade.
De acordo com o delegado responsável pelo caso, Cledson do Nascimento, má gestão, desvio de verbas e disputa de poder na Apae são apontados como possíveis motivações para o crime. Os dois suspeitos se tornaram réus e a primeira audiência do caso foi marcada para janeiro do ano que vem.
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