Entenda por que existem tantas igrejas evangélicas em Goiânia

Goiânia é uma das capitais brasileiras com o maior número de evangélicos, o que resulta em uma grande quantidade de templos religiosos espalhados por toda a cidade. Seja nos bairros periféricos ou nas áreas nobres, igrejas estão por todos os lados, muitas vezes localizadas muito próximas umas das outras, criando um cenário de “concorrência gospel”. Esses templos são de diferentes denominações, incluindo aquelas filiadas à convenções e as chamadas independentes, que não possuem vínculos com lideranças regionais ou nacionais.

Goiânia foi considerada, nos anos 2000, a capital do pentecostalismo brasileiro, conforme estudos da Fundação Getúlio Vargas (FGV). De acordo com o Conselho de Pastores de Goiânia, há mais de 80 denominações religiosas diferentes na cidade, sendo algumas delas fundadas localmente, como a Igreja Videira, Batista Renascer, Luz para os Povos e Fonte. Muitas dessas igrejas possuem congregações em outros estados e até no exterior.

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2022 Goiânia tinha cerca de 2.737 igrejas registradas, o que representa uma igreja para cada 525 pessoas. Esse número supera a quantidade de estabelecimentos de saúde e ensino na capital.

Em 2010, a cidade tinha mais de 400 mil evangélicos, para uma população de aproximadamente 1,3 milhão de habitantes. Apesar disso, os dados mais recentes sobre a população evangélica em Goiânia ainda não foram divulgados, com o IBGE prometendo que as informações do censo de 2022 serão liberadas ainda este ano. O pastor e professor da Assembleia de Deus, Ministério Fama, Giovani Ribeiro, acredita que o número de evangélicos ultrapassou os 500 mil em 2024.

Templo da Igreja Deus é Amor, em Goiânia l Foto: Guilherme Alves/Jornal Opção

O IBGE também revelou que, em 2022, Goiânia tinha 1.481 estabelecimentos de ensino e 1.777 de saúde. Quando comparados com o número de igrejas, os templos superam os estabelecimentos de saúde em 1.256 unidades e os de ensino em 960. É importante observar que qualquer estabelecimento relacionado a saúde, como óticas e drogarias, é contabilizado, assim como creches e autoescolas no setor de ensino.

Facilidade para abrir igrejas

A abertura de uma igreja em Goiânia, e em muitas partes do Brasil, é um processo relativamente simples. O pastor Giovani Ribeiro explica que, para congregações filiadas à Assembleia de Deus, o processo é facilitado, pois a denominação já possui um CNPJ central, o que desburocratiza a formalização de novas congregações. Já para quem deseja abrir uma igreja independente, basta registrar o nome da instituição em um cartório, sem exigência de documentação extra, como atestado mental ou certidão de antecedentes criminais.

Quando questionado sobre o fato de algumas igrejas terem sido associadas a escândalos de crimes como pedofilia e abuso sexual, o pastor Giovani ressalta que tais ocorrências são exceções e não representam a norma do meio evangélico. “Infelizmente, existem situações que envergonham o evangelho, mas elas são exceções e devem ser punidas exemplarmente”, afirma. Ele ainda acrescenta que, caso o pastor envolvido seja de uma igreja filiada a uma convenção, ele pode perder o direito de pastorear.

Pr. Giovane Ribeiro: “abrir igreja é um processo relativamente simples” l Foto: Arquivo pessoal

Aspectos legais e tributários

O pastor Fabiano Reis, vice-presidente da Comissão Especial de Liberdade Religiosa da OAB-GO, detalha que, para abrir uma igreja, é necessário criar um estatuto e registrar um CNPJ. Embora as igrejas sigam o Código Civil, ele observa que geralmente adotam modelos de associações. Além disso, embora as igrejas precisem seguir as normas de segurança, como vistorias do Corpo de Bombeiros, não é exigido um alvará de funcionamento.

Em relação aos impostos, as igrejas são imunes a tributos municipais, estaduais e federais, conforme a Constituição Federal. Essa imunidade abrange impostos como o IPTU e o ITU, mas, quando contratam funcionários, as igrejas seguem a mesma regra tributária que as associações, ou seja, os impostos sobre a folha de pagamento são recolhidos normalmente.

A Assembleia de Deus continua sendo a denominação com o maior número de templos em Goiânia e no Brasil. Fabiano Reis, que pertence ao Ministério de Vila Nova, destaca que sua congregação possui 120 igrejas apenas na capital. Ele também aponta que a Assembleia de Deus e a Igreja Deus é Amor são as que mais têm templos em Goiânia.

A Prefeitura de Goiânia confirmou que as igrejas não pagam impostos municipais, amparadas pela imunidade tributária prevista no artigo 150 da Constituição Federal, que protege a liberdade religiosa. Essa imunidade se aplica a todas as entidades de caráter religioso, independentemente da denominação, e abrange a renda, os serviços e o patrimônio.

Pr. Fabiano Reis l Foto: arquivo pessoal

Cenário atual e tendências

A Assembleia de Deus permanece como a denominação com maior presença em Goiânia, marcando presença tanto em bairros periféricos quanto nas regiões nobres. Outra tendência apontada por líderes religiosos é o crescimento das chamadas churches, igrejas com visual moderno e paredes escuras que atraem principalmente jovens.

O pastor Giovani Ribeiro reforça que o número de templos é reflexo do crescimento da comunidade evangélica e da busca por disseminar a mensagem de fé. “A Assembleia de Deus está presente em toda parte, levando a palavra de Deus e a mensagem de salvação”, conclui.

Igrejas evangélicas precisam estar cadastradas no CNPJ, afirma Receita Federal

A Receita Federal explicou que, de acordo com a legislação vigente, todas as igrejas evangélicas devem estar cadastradas no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ). De acordo com o Código Civil (Lei nº 10.406/2002), organizações religiosas são consideradas pessoas jurídicas de direito privado e sua existência legal começa com o registro de seus atos constitutivos. Além disso, a Instrução Normativa RFB nº 2.119/2022 determina que entidades religiosas devem obrigatoriamente realizar a inscrição no CNPJ.

Igreja Church l Foto: Guilherme Alves/Jornal Opção

De acordo com o órgão, esse cadastro é necessário para que as igrejas possam realizar atividades como a abertura de contas bancárias, o recebimento de doações e o cumprimento de obrigações fiscais, embora gozem de imunidade tributária, conforme a Constituição Federal.

No entanto, a Receita Federal esclareceu que não possui dados sobre o número exato de igrejas evangélicas em Goiânia, pois essas informações não estão disponíveis nos relatórios ou sistemas de consulta da instituição. Segundo a Recita, para obter esses dados, seria necessário um processo de apuração especial, que demandaria custos adicionais e tempo para a consolidação das informações. Por esse motivo, a Receita Federal não pode fornecer as informações solicitadas de forma integral.

Goiânia: Capital religiosa com fortes presença evangélica

Eduardo Gusmão de Quadros, professor do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO), destaca que Goiânia tem uma tradição evangélica marcante e uma legislação que facilita a abertura de igrejas. “Abrir uma igreja no Brasil é muito fácil. É como abrir um MEI. Você vai no cartório, registra, e pronto”, afirma. Segundo o professor, essa facilidade tem origem em uma legislação liberal em vigor há muitos anos.

Além disso, Gusmão explica que, desde sua fundação, Goiânia apresenta uma predominância evangélica em termos de templos. “Logo em 1935, 1936, já havia a Igreja Batista e a Igreja Cristã Evangélica no centro da cidade. Depois veio a Assembleia de Deus, todas localizadas em regiões centrais, como a Rua 2 e a Rua 72”, relata. Ele ainda atribui parte desse contexto histórico à influência de Pedro Ludovico Teixeira, fundador da cidade e maçom, o que, segundo ele, criou um ambiente mais receptivo às religiões evangélicas, em contraste com a Igreja Católica, que combatia a maçonaria na época.

Igreja Fonte da Vida – origem em Goiânia l Foto: Reprodução

Outro ponto levantado é o papel de Dom Emanuel, então bispo de Goiás, que teria demonstrado insatisfação com a transferência da capital para Goiânia. “Dom Emanuel quase não vinha à nova capital e delegou os cuidados da igreja local aos redentoristas, que estavam sobrecarregados com outras paróquias”, explica. Isso teria favorecido o crescimento de religiões como o espiritismo e as igrejas evangélicas.

A música evangélica também contribuiu para a identidade religiosa de Goiânia. “Nos anos 1970 e 1980, tivemos bandas evangélicas importantes que ajudaram a projetar a cidade no cenário nacional”, comenta Gusmão. Além disso, igrejas como Sara Nossa Terra, Videira, e Fonte da Vida, que nasceram na cidade, alcançaram renome mundial.

Hoje, Gusmão acredita que a população religiosa em Goiânia está equilibrada entre católicos e evangélicos. “Não temos dados concretos, mas estimo que seja 50% para cada lado”, avalia. Ele aponta diferenças entre as práticas religiosas: “Enquanto muitos católicos participam apenas de rituais pontuais, como batismos e casamentos, os evangélicos costumam congregar com mais frequência e seguem exigências mais rigorosas de suas igrejas.”

Eduardo Gusmão: “O Brasil é um país que crê em Deus” l Foto: Arquivo pessoal

Capilaridade e criatividade religiosa

A Assembleia de Deus é mencionada como a denominação com maior presença em Goiânia. “A Assembleia está em todos os bairros, desde a periferia até áreas nobres. É uma igreja muito capilar, com diversas divisões e ministérios”, afirma. Ele também observa que novas igrejas pentecostais têm surgido com nomes criativos, como “Esconderijo do Altíssimo” e “Cuspe de Jesus”.

Sobre a facilidade de abrir igrejas, Gusmão refuta a ideia de que isso se deve apenas à busca por benefícios financeiros. “Há casos de abuso, mas, no geral, as pessoas que abrem igrejas têm uma visão espiritual. Divergências doutrinárias e a crença em um chamado espiritual são os principais motivos para fundar novos ministérios”, explica.

Gusmão conclui que a religião é um elemento profundamente enraizado na cultura brasileira, especialmente em Goiânia. “O Brasil é um país que crê em Deus. A herança religiosa é forte, e isso inclui um sincretismo que mistura elementos africanos, europeus e indígenas”, observa. Apesar do preconceito acadêmico em relação à religião, ele defende a importância de estudá-la para compreender a sociedade brasileira.

Assim, Goiânia se destaca como um laboratório vivo de criatividade e diversidade religiosa, com tradições enraizadas e movimentos modernos que continuam a moldar sua identidade.

Igreja independente l Foto: Guilherme Alves/Jornal Opção

Bombeiros esclarecem exigências para alvarás de templos religiosos em Goiás

A Assessoria de Comunicação do Corpo de Bombeiros Militar do Estado de Goiás (CBMGO) informou que templos religiosos precisam de alvará para funcionamento, assim como outros estabelecimentos que promovem a reunião de pessoas.

De acordo com o Código Estadual de Segurança Contra Incêndio e Pânico (Lei Estadual nº 15.802, de 11 de setembro de 2006), é obrigatório o cumprimento de medidas de segurança contra incêndio e pânico em edificações e áreas de risco. A legislação também define critérios e procedimentos para a apresentação de Processos de Segurança Contra Incêndio e Pânico ao Corpo de Bombeiros.

Requisitos para obtenção de alvará

A análise para obtenção do alvará começa com a avaliação da área construída e da capacidade de ocupação do espaço. As exigências variam conforme as seguintes condições:

  • Área menor que 200m² e público inferior a 200 pessoas: pode ser realizado o Licenciamento Facilitado.
  • Área maior que 200m² e público superior a 200 pessoas: é necessário realizar o Licenciamento para Habite-se, com a apresentação de um projeto de segurança contra incêndio e pânico.

Os requisitos mínimos para dimensionar a capacidade máxima de ocupação e a quantidade de saídas de emergência são baseados na Norma Técnica 11 (NT-11), que define critérios específicos para saídas de emergência. Cada saída deve ser dimensionada considerando uma população máxima de uma pessoa por metro quadrado de área. Para públicos superiores a 500 pessoas, é obrigatória a existência de, no mínimo, duas saídas de emergência.

Igreja independente l Foto: Guilherme Alves/Jornal Opção

Regras de segurança e manutenção

A segurança contra incêndio segue os parâmetros da Norma Técnica 02 (NT-02), que avalia os requisitos de acordo com a área, a ocupação e a altura do edifício. A manutenção dos sistemas de segurança deve ser realizada por profissionais habilitados, com a emissão de laudos e termos de responsabilidade técnica.

Para garantir a segurança de todos, a sinalização de emergência e os padrões de acessibilidade para pessoas com deficiência devem seguir as normas nacionais (NBRs) e regulamentações municipais.

Brasil registra abertura de 17 igrejas evangélicas por dia, aponta pesquisa

O Brasil conta com cerca de 109,5 mil igrejas evangélicas, com uma média de 17 novos templos sendo inaugurados diariamente, conforme revelou uma pesquisa do Centro de Estudos da Metrópole (CEM), vinculado à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

Igreja pioneira em Goiânia l Foto: Guilherme Alves/Jornal Opção

O levantamento destaca que, em 2019, foram abertas 6.356 igrejas evangélicas no país. Goiás aparece com uma proporção de 60 templos evangélicos para cada 100 mil habitantes, enquanto o Espírito Santo lidera como o estado mais evangélico, com 93 igrejas para cada 100 mil habitantes.

Por outro lado, a região Nordeste apresentou a menor expansão do segmento religioso, com estados registrando entre 20 e 40 templos por 100 mil habitantes. Esses números refletem um crescimento significativo das igrejas evangélicas no Brasil, mas com variações regionais marcantes.

Opinião do repórter com base bíblica

Certa vez, os discípulos chegaram até Jesus e lhe disseram: ‘Mestre, encontramos um homem expulsando demônios em Teu nome, mas nós o proibimos, porque ele não é um dos nossos.’ Jesus então respondeu: ‘Não o proibais, pois ninguém faz milagres em Meu nome para depois falar mal de Mim. Quem não é contra nós, é a nosso favor.’

A reflexão proposta pelo texto nos leva a pensar sobre a verdadeira motivação por trás da abertura de igrejas e da pregação da palavra de Deus. O relato bíblico, que encontramos em Marcos 9:39 e Lucas 9:49, nos ensina que o foco não deve ser quem está pregando, mas o que está sendo pregado. Jesus, ao responder aos discípulos, nos mostra que, quem prega em Seu nome, mesmo que não faça parte do nosso grupo, está, na verdade, a serviço de Deus. A palavra de Deus tem poder para transformar vidas, independentemente das falhas humanas de quem a transmite.

Esse ponto é relevante quando refletimos sobre os muitos escândalos envolvendo líderes religiosos, inclusive renomados. Apesar das falhas pessoais de alguns pastores, suas igrejas continuam cheias, porque o poder da palavra de Deus vai além das imperfeições humanas. A transformação das vidas das pessoas é a prova de que a mensagem tem um impacto profundo, mesmo quando quem a transmite ainda está em processo de transformação.

No entanto, é fundamental entender que a motivação para abrir uma igreja não deve ser o interesse pessoal ou a ambição de lucro. Jesus deixou claro em Mateus 18:20 que, onde duas ou três pessoas se reunirem em Seu nome, Ele estará presente. A verdadeira motivação deve ser o desejo de pregar o evangelho e contribuir para o crescimento do reino de Deus na Terra, e não a busca por reconhecimento ou poder.

Portanto, ao refletirmos sobre a abertura de igrejas e os líderes que as conduzem, devemos lembrar que o que realmente importa é a pregação da palavra de Deus e seu poder transformador, e não os erros ou intenções de quem a transmite.

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