
Neste domingo (25), a Venezuela irá às urnas para eleger 24 governadores, 285 deputados estaduais, 335 prefeitos e 2.471 conselheiros municipais. Pela primeira vez, o Essequibo participará do pleito, elegendo seu primeiro governador e representantes legislativos. O processo, organizado pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE), contará com 21,5 milhões de eleitores, incluindo 196 mil estrangeiros residentes no país, distribuídos em 15.736 seções eleitorais.
O sistema eleitoral misto combina votos nominais (para candidatos) e listas partidárias, garantindo proporcionalidade na distribuição de deputados. O estado de Zulia lidera com 25 cadeiras, enquanto sete estados menores terão apenas 6 deputados cada. Além disso, 48 deputados serão eleitos via lista nacional, calculados com base nos votos totais recebidos por partido.
Solidariedade latino-americana para contranarrativas
Um encontro remoto promovido por organizações ligadas ao Foro de São Paulo (FSP) reuniu lideranças políticas e jornalistas de países como Brasil, Peru, Argentina, Bolívia, Costa Rica, Cuba e Portugal para discutir o processo eleitoral e a conjuntura destas eleições regionais. Como destacou Monica Valente, secretaria executiva do FSP, a importância deste evento visa a compreender a participação popular no sistema político venezuelano e a resistência aos ataques da extrema direita contra a democracia da Venezuela, em meio ao silenciamento da imprensa sobre o pleito deste domingo.
“O sistema eleitoral venezuelano é caracterizado por uma democracia participativa e protagônica do povo, destacando-se um modelo que contrasta com a democracia liberal e enfrenta tentativas de deslegitimização da extrema direita e do fascismo”, observou ela, apontando a guerra cultural que se espalha nas mídias corporativas a cada eleição no país.
O Portal Vermelho acompanhou a reunião, quando se apontaram os problemas generalizados de fraude e abstenção em eleições pelo continente, que não são devidamente analisadas pela mídia internacional, como insistem em fazer contra o governo venezuelano. As exposições foram feitas pelo vice-presidente de Assuntos Internacionais do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV) e vice-ministro de Relações Exteriores para América Latina, Rander Peña, e a professora titular da Universidade de Havana e assessora de instituições estratégicas do Estado venezuelano, Yazmin Vazquez.
Rander Peña: “Eleições são batalha contra o imperialismo e o extremismo”

Peña afirmou durante o encontro virtual que as eleições regionais são “uma continuidade da soberania expressa nas urnas” após a reeleição de Nicolás Maduro em julho de 2024. Peña acusou a oposição venezuelana de promover violência pós-eleitoral naquele ano, incluindo mortes e sabotagem, como parte de uma “campanha fascista” financiada pelo exterior.
Apesar da vitória eleitoral, Peña reconheceu os desafios enfrentados pelo governo, incluindo a recuperação econômica sob sanções internacionais e a integração de políticas sociais. “O povo venezuelano escolheu a independência, mesmo diante de sanções e ataques econômicos. A resistência criativa do povo venezuelano é nossa maior força. A direita tenta desestabilizar o país, mas não permitiremos que minem nossa democracia”, declarou, referindo-se ao recente bombardeio de infraestruturas civis por 38 mercenários, incluindo estrangeiros, ligados a grupos opositores.
O vice-ministro denunciou tentativas de “ressurgência fascista” por parte da oposição, que, segundo ele, busca desestabilizar o governo com apoio de atores externos. “Eles querem nos tirar do foco do que é legal e correto. Não permitiremos que imponham uma narrativa mentirosa”, ressaltou.
PSUV defende “soberania” e oposição quer “recolonização neoliberal”
Segundo Peña, as eleições definirão o futuro entre dois projetos antagônicos. O PSUV, que governa 18 dos 24 estados, busca ampliar sua hegemonia, enquanto a oposição tenta conquistar espaços em regiões estratégicas, como Zulia e Miranda. Mais de 50 organizações políticas e 36.986 candidaturas participaram do processo eleitoral, com paridade de gênero garantida.
As eleições de 2025, consideradas por Peña como “as mais importantes desde a reeleição de Maduro”, colocaram em disputa dois modelos antagônicos: o “projeto bolivariano de paz, soberania e justiça social” e o “neoliberalismo recolonizador”. Segundo ele, a vitória de Maduro reflete a resistência popular contra sanções externas e intervenções imperialistas.
O vice-ministro destacou que a oposição, fragmentada em 54 organizações políticas (36 nacionais, 10 regionais e 8 indígenas), carece de unidade e propostas concretas. “Eles não respeitam a Constituição e veem a democracia como mero instrumento para tomar o poder. Não há termos médios: ou defendemos a legalidade ou entregamos o país ao imperialismo”, afirmou.
Peña ressalta o processo de consultas populares a cada três meses em todo o território venezuelano (dividido em 5.338 circuitos comunais), para definir as prioridades de políticas públicas e destinação de recursos para cada região. “Nós acreditamos, na Venezuela, que é um aporte real que estamos dando ao mundo sobre experiências políticas. Cada comunidade, ao ver resolvido um projeto de que eles qualificam como mais importante, na próxima consulta vão mais estimulados. Esse espaço de participação política se conecta com as eleições, porque cada governante regional tem como mandato, que a única forma de governar é desta maneira e não em escritórios com ar condicionado com burocratas que decidem qual projeto é prioritário. É a comunidade que decide e o governador terá como missão facilitar que isso aconteça desta maneira. Não é o povo mendigando que o governante regional o veja, e lhe dê algum tipo de migalha para resolver algum assunto específico”, explicou.
Observadores internacionais: escudo contra a desinformação
Pelo menos 36 organizações internacionais acompanharão o processo eleitoral, incluindo delegações de partidos latino-americanos e europeus. Peña enfatizou que a presença de observadores é crucial para “validar a transparência” e combater narrativas críticas da mídia global. “Na Venezuela não há colapso, há resistência criativa. A voz do povo não será silenciada por meios internacionais que demonizam nosso país”, disse.
O governo também destacou o apoio de movimentos progressistas da América Latina e Caribe, reafirmando a importância da integração regional para enfrentar pressões externas. Peña chamou a atenção para a importância da solidariedade regional. “Esta eleição não é só venezuelana: é uma batalha contra o imperialismo global”, concluiu.
Desafios logísticos e segurança: como o CNE prepara o pleito
O CNE garantiu que 15.736 seções eleitorais estarão operacionais, com 27.713 mesas de votação distribuídas em todo o território. Para evitar fraudes, o sistema eletrônico contará com auditorias em tempo real e acesso público aos resultados.
Autoridades também reforçaram medidas de segurança após os ataques de julho de 2024. Cerca de 60 mil agentes de segurança serão mobilizados para garantir a ordem, com foco em áreas com histórico de tensão, como Caracas e Valência.
Peña classificou as ações recentes como parte de uma “campanha fascista” financiada pelo extremismo e apoiada por setores internacionais. “A direita venezuelana, insatisfeita com a soberania expressa nas urnas, convocou grupos radicais às ruas, resultando em mortes e sabotagem”, declarou.
“Vencer o ódio com alegria e consciência”
Rander Peña reafirma a determinação do governo bolivariano. “Votar é vencer o ódio, a mentira e o fascismo disfarçado de democracia. Como disse Hugo Chávez: aqui ninguém se rende. No dia 25 de maio, o mundo verá que a Venezuela não passará”, finalizou.
“A Venezuela é um exemplo de democracia participativa. Venceremos porque lutamos por um mundo mais justo, mais humano”, finalizou. A intervenção reforçou a narrativa de que a Venezuela se posiciona como um bastião anti-imperialista na atual conjuntura global.
A vitória do PSUV nas eleições regionais consolidaria seu controle político, enquanto um avanço da oposição poderia reacender tensões em um momento crítico para a economia e a estabilidade social do país.
Yazmin Vazquez: Democracia em disputa

A conjuntura, marcada por desafios econômicos e pelo cerco internacional, também foi analisada pela professora Yazmin. “É um prazer ter essa oportunidade de compartilhar algumas reflexões sobre os alcances que realmente tem o modelo democrático venezuelano, amparado nas transformações promovidas pela Revolução Bolivariana”, iniciou Yazmin, ao traçar um panorama das mudanças ocorridas desde 1999. Segundo ela, a democracia na Venezuela se estrutura como uma experiência multidimensional, ancorada em princípios de protagonismo popular, poder obediencial e construção socialista desde os territórios.
A especialista destacou cinco fases no processo de transformação institucional venezuelana, com ênfase na articulação entre o Estado e a organização popular. A Constituição de 1999, primeiro marco legal da Revolução Bolivariana, reconheceu diversas formas de participação cidadã, lançando as bases para um novo modelo de gestão democrática.
Posteriormente, leis fundamentais como a dos Conselhos Estaduais de Planejamento (2002), dos Conselhos Comunais (2006), do Poder Popular (2010) e da Propriedade Social Direta e Indireta consolidaram a arquitetura legal do poder popular. “Essas leis viabilizam que comunidades organizadas exerçam diretamente a gestão de recursos, planejamento e execução de políticas públicas, num ciclo que vai do diagnóstico à comercialização de bens produzidos localmente”, explicou Yazmin.
A criação de instrumentos como o Banco da Mulher, o Banco do Povo e o Fondemi integrou a dimensão financeira ao projeto, permitindo que recursos fossem geridos por estruturas eleitas pela própria comunidade.
O poder obediencial e o papel dos candidatos nas eleições de 2025
Com o fechamento da campanha eleitoral e os preparativos finais para o pleito de domingo, Yazmin Vazquez chamou atenção para o papel do chamado “poder obediencial”, conceito político incorporado por Hugo Chávez a partir do pensamento de Enrique Dussel e amplamente retomado pelo presidente Nicolás Maduro.
“A campanha destacou que os governadores devem ser gestores obedientes ao poder popular, apoiando e impulsionando os processos de base que são o motor da Revolução Bolivariana. Não se trata apenas de governar, mas de acompanhar e se corresponsabilizar pela transformação social junto com as comunidades”, afirmou.
Segundo Yazmin, o PSUV (Partido Socialista Unido da Venezuela) atua como partido-movimento, organizando a militância e os territórios, e articulando-se com as estruturas populares. A escolha de candidatos tem sido pautada pela exigência de compromisso ético, formação política e capacidade de dialogar com os circuitos comunais.
Desafios econômicos, guerra híbrida e resiliência democrática
Apesar dos avanços institucionais, a trajetória do modelo democrático venezuelano enfrenta severos obstáculos desde 2013, com a intensificação da guerra econômica promovida por setores da oposição e sanções internacionais. Yazmin ressaltou que o bloqueio financeiro afetou diretamente a capacidade de expansão do poder popular e a implementação de políticas sociais em sua plenitude.
Ainda assim, ela defende que os aportes do modelo venezuelano à teoria e prática da democracia são reconhecidos por observatórios, universidades e organismos sociais da região. “Desde 2008, o poder popular já era considerado a pedra angular da democracia participativa na Venezuela. Hoje, mesmo com dificuldades, segue sendo um exemplo de inovação política e gestão comunitária que desafia os marcos da democracia liberal tradicional”, concluiu.
Uma eleição que testa mais que urnas: os fundamentos de um projeto
O pleito de 25 de maio será, mais do que um momento de escolha de representantes, um termômetro da vitalidade de um modelo de democracia enraizado em valores coletivos, protagonismo social e soberania popular. Num contexto de persistente tensão geopolítica e tentativa de deslegitimação internacional, a Venezuela aposta na força de suas comunidades organizadas para seguir moldando, desde dentro, seu próprio caminho político.
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