‘É difícil aceitar’, diz pintor que perdeu dedos da mão após achar bomba que explodiu na casa de ex-policial


Profissional enfrenta limitações físicas, perda de renda e passou a depender da esposa, deficiente visual, para tarefas simples. Dono do imóvel negou à polícia que sabia de artefato. Polícia de Barretos apura se ex-policial podia ter bomba que atingiu pintor em casa
O pintor autônomo Ronaldo de Oliveira ainda se recupera fisicamente e emocionalmente após ter os dedos da mão esquerda mutilados por uma bomba enquanto prestava serviço na casa de um ex-policial em Barretos (SP).
“Minha vida parou. Não consigo trabalhar, não consigo cuidar dos meus filhos. Era eu que sustentava a casa. Hoje, só tomo remédio e fico esperando o dia passar. Ainda agradeço a Deus por estar vivo, mas é difícil aceitar. Eu só queria voltar a ter uma vida normal”, diz.
O caso aconteceu no fim de abril e virou alvo de investigação da Polícia Civil. O delegado responsável, Gustavo Rodrigo Lopes Coelho, quer saber como o material chegou até a residência, se houve negligência por parte do ex-policial e se há configuração de crime de posse ilegal de artefato explosivo.
Ronaldo tenta retomar alguma rotina em casa, mas tem severas limitações físicas. Ele depende da esposa, Juliana Fagundes Oliveira, que é aposentada e tem deficiência visual, para tarefas básicas do dia a dia: colocar comida no prato, tomar banho, fazer curativos.
A reabilitação, segundo os médicos, deve levar pelo menos seis meses. Além do tratamento das lesões, Ronaldo também precisará de acompanhamento psicológico para lidar com o trauma.
Faça parte do canal do g1 Ribeirão e Franca no WhatsApp
O pintor Ronaldo de Oliveira e a esposa, Juliana Fagundes Oliveira, em Barretos, SP
Valdinei Malaguti/EPTV
O caso
Em abril, Ronaldo foi contratado para pintar a casa que o ex-policial havia desocupado no bairro Ibirapuera. Dias após concluir o serviço, foi chamado pelo cliente para limpar o imóvel. Ele deveria descartar objetos deixados para trás e que não tinham mais serventia.
Durante a separação dos materiais, Ronaldo diz ter encontrado uma lata que se parecia com uma embalagem spray no meio de brinquedos velhos. Sem saber do que se tratava, acabou acionando o artefato.
“Em uma caixa, junto com alguns brinquedos, encontrei uma latinha que parecia um spray, achei que fosse tinta. Acabei mexendo e saiu uma fumaça cheirosa. Quando me dei conta que poderia ser uma bomba, joguei para trás, explodiu nas minhas costas. Arrancou meus dedos, parte da minha nádega, e desde então não escuto mais do lado esquerdo. Fiquei em choque”, lembra.
Mesmo ferido, ele conseguiu correr até a unidade de saúde que fica em frente à casa. Foi atendido no local e transferido à Santa Casa de Barretos, onde passou por cirurgia de emergência.
O pintor Ronaldo de Oliveira teve ferimentos graves na mão esquerda com a explosão de uma bomba em Barretos, SP
Valdinei Malaguti/EPTV
LEIA TAMBÉM:
Polícia de Barretos investiga se ex-policial tinha autorização para posse de bomba que atingiu pintor
Pintor perde dedos da mão após bomba explodir durante trabalho na casa de ex-policial em Barretos
Visita do ex-policial
Na Santa Casa, Ronaldo diz ter recebido a visita do ex-policial dono da casa, que hoje é procurador do município de Barretos.
Segundo o pintor, Ricardo Cardoso de Barros lamentou o incidente, contou que era uma bomba de efeito moral, usada na maioria das vezes para dispersar aglomerações, mas não ofereceu qualquer ajuda.
“Ele é um ex-militar, falou para mim que era tenente. Ele me pediu desculpas, falou que não poderia ter deixado essa bomba lá, como que pode ter esquecido. Mas aí não me procurou mais, não me ofereceu ajuda, remédio, mais nada.”
Procurado, Barros não comentou o assunto. Em depoimento à Polícia Civil, ele negou conhecimento sobre a bomba em casa.
Pintor sofreu graves ferimentos na mão esquerda ao manusear bomba sem saber em Barretos, SP
Reprodução/EPTV
Preocupação
Além da mão, Ronaldo teme novas complicações. A bomba explodiu sobre a prótese que ele tem no lado esquerdo do quadril, implantada após uma cirurgia de reconstrução em 2021. A equipe médica agora investiga possíveis danos.
A esposa do pintor tem contado com a ajuda de vizinhos e familiares para levar o marido diariamente ao posto de saúde, onde ele realiza curativos e passa por consultas. A situação financeira, no entanto, é cada vez mais difícil.
“Estamos dependendo da minha aposentadoria. A medicação é cara, e o curativo precisa ser feito todo dia, no hospital e em casa. A família ajuda como pode, mas ninguém consegue sustentar outra casa por muito tempo. É tudo muito incerto, porque não sabemos quando e se ele vai conseguir voltar a trabalhar”, diz Juliana.
O casal tem dois filhos, e com o orçamento comprometido, a preocupação com o futuro pesa.
“Ele sempre foi muito ativo, acordava cedo, trabalhava muito. Ver ele assim, dependente, me corta o coração. Às vezes ele não dorme, fica ouvindo o barulho da bomba. Está sendo muito difícil”, desabafa.
O pintor Ronaldo de Oliveira teve ferimentos graves na mão esquerda com a explosão de uma bomba em Barretos, SP
Valdinei Malaguti/EPTV
Ronaldo considera que o ex-policial foi irresponsável e colocou várias vidas em risco. Segundo ele, o objetivo poderia ter sido encontrado por uma criança se tivesse sido deixado na lixeira, já que há uma escola perto. A bomba também poderia ter ferido os coletores de lixo.
“E se fosse uma criança que pegasse aquilo no lixo? Ou se explode dentro do caminhão de lixo? Podia ter matado alguém.”
Veja mais notícias da região no g1 Ribeirão e Franca
Vídeos: Tudo sobre Ribeirão Preto, Franca e região
Adicionar aos favoritos o Link permanente.