Duas grandes movimentações partidárias podem redesenhar o cenário político nacional e impactam diretamente as eleições de 2026: a possível fusão entre PSDB e Podemos; e a formação da federação entre União Brasil e Progressistas, batizada de forma provisória como União Progressista, que cria uma das maiores forças políticas do país.
Essas mudanças afetam diretamente o fundo partidário, o fundo eleitoral, o tempo de TV, e também a composição das bancadas nas casas legislativas. Para esclarecer como esses mecanismos funcionam e quais são seus impactos práticos, o Jornal Opção conversou com o professor de Direito Eleitoral e técnico judiciário do Tribunal Regional Eleitoral de Goiás (TRE-GO), Alexandre Azevedo.
Segundo o especialista, o processo de fusão, incorporação ou formação de federação partidária tem início nas instâncias superiores dos próprios partidos. “O primeiro passo é que os diretórios nacionais, os órgãos nacionais dos partidos políticos, decidam se vai haver a fusão, se vai haver a incorporação ou a formação de uma federação. Os órgãos se reúnem e deliberam sobre isso”, explica.

No caso da incorporação, um dos partidos é extinto e o outro permanece. Já na fusão, nasce um novo partido, com novo nome, número e estrutura diretiva. A formação da federação, por sua vez, mantém as legendas formalmente distintas, mas elas passam a atuar como uma só, especialmente em disputas eleitorais.
Após essa decisão interna, os partidos precisam oficializar o pedido junto à Justiça Eleitoral. “Feita a ata dessa reunião, é levado um requerimento ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para verificar se houve a correta aplicação da lei. O TSE abre prazo para manifestações contrárias, ouve o Ministério Público, e então o plenário julga se defere ou indefere o pedido”, detalha Azevedo.
“A partir do momento em que o pedido é deferido, começa a valer oficialmente a fusão, incorporação ou federação partidária.” A reportagem também ouviu a advogada eleitoral Nara Bueno, que esclareceu os trâmites exigidos e os efeitos imediatos dessas mudanças, destacando que tanto a fusão quanto a federação entre partidos precisam do aval da Justiça Eleitoral para terem validade.
“As mudanças para ambas as hipóteses necessitam de aprovação da Justiça Eleitoral para começar a valer oficialmente”, afirmou a especialista. Segundo ela, no caso da fusão, é necessário que os partidos envolvidos elaborem projetos comuns de estatuto e programa, os quais devem ser aprovados por maioria absoluta em seus órgãos nacionais.
“Após o deferimento do registro da nova agremiação partidária, os registros dos órgãos de direção estaduais e municipais das legendas extintas são cancelados”, explicou. Ao contrário da fusão, em que os partidos deixam de existir separadamente, na federação cada sigla mantém sua identidade jurídica.
“Para a formação de uma federação, dois ou mais partidos devem antes constituir uma associação registrada em cartório, com personalidade jurídica distinta das legendas que a compõem”, detalhou Nara. Essa nova entidade precisa durar, no mínimo, quatro anos. Caso um partido deixe a federação antes do prazo, ficará impedido de formar novas federações ou coligações nas duas eleições seguintes.

Impactos já em 2025
Questionado sobre os efeitos imediatos da recém-anunciada federação entre União Brasil e Progressistas, Azevedo esclarece que, ao contrário da fusão ou incorporação, a federação não configura justa causa para desfiliação de parlamentares. “O impacto para este ano é apenas no sentido de que passam a ser um único partido no que tange às questões eleitorais. Vão ter que caminhar juntos”, afirma.
Segundo ele, cada estado onde ambos os partidos estão presentes deverá ter uma direção específica da federação, além das direções nacionais. Já os efeitos mais práticos surgem na hora da divisão dos recursos públicos e da definição de candidaturas.
“A federação vai somar os tempos de TV, rádio e os recursos do fundo partidário e do fundo eleitoral que cada um dos partidos tinha individualmente. Se um partido tinha direito a um milhão e o outro a um milhão e meio, juntos terão direito a dois milhões e meio, por exemplo”, explica.
Azevedo também destaca que, no caso de federação, embora haja o somatório dos recursos, pode haver a manutenção das estruturas internas dos partidos, o que exige atenção especial à forma como se organizarão para as eleições.
“Caberá ao estatuto da federação estabelecer, por exemplo, quantas vagas para deputado federal caberão ao União Brasil e quantas caberão ao Progressistas, respeitando o total de candidaturas permitido por estado”, exemplifica.
Já de olho nas eleições gerais de 2026, o professor também comenta a possível fusão entre PSDB e Podemos. “Numa fusão, o impacto é ainda maior, porque além do somatório de recursos e tempo de propaganda, há uma redução no número de partidos. Isso significa menos órgãos diretivos e uma reconfiguração total da estrutura interna e externa dessas legendas”, finaliza.
De acordo com a advogada, o primeiro reflexo será na cláusula de barreira — dispositivo que determina o acesso dos partidos ao fundo partidário e ao tempo de propaganda eleitoral.
“Os desempenhos dos partidos são somados para o cálculo da cláusula de barreira. No caso da fusão, o recebimento é feito apenas pela nova sigla. Já na federação, os recursos são repassados separadamente para cada partido que a integra”, afirmou.
Além disso, Nara destacou que essas movimentações ampliam o capital político das legendas: “A fusão e a federação influenciam diretamente na composição das bancadas, o que favorece a obtenção de mais relatorias e o comando de comissões no Congresso Nacional”.
Com as novas alianças, partidos como a futura legenda PSDB-Podemos já podem garantir sua presença nas eleições de 2026, desde que formalizem e tenham a fusão aprovada até seis meses antes do pleito. “Segundo a Lei, poderá participar das eleições o partido que, até seis meses antes do pleito, esteja com estatuto regularizado no TSE”, explicou.
Além disso, a nova configuração altera a liderança de bancadas no Congresso, inclusive a indicação para cargos em comissões e CPIs. A federação pode atuar como uma nova força de oposição ou governo, dependendo das articulações.
Nos municípios, a orientação partidária e os diretórios podem ser reestruturados já para as eleições de 2026. Os recursos do fundo partidário de 2025 (que não é eleitoral) também já passam a ser impactados, com a redivisão proporcional entre os partidos/federações com base nas regras atuais.
Diferença entre fundo partidário e fundo eleitoral
Alexandre Azevedo ainda explicou com como funcionam os repasses dos fundos público-partidários e os efeitos jurídicos para os mandatários dessas legendas. O especialista começou diferenciando dois pilares do financiamento político no Brasil: o fundo partidário e o fundo eleitoral.
Segundo ele, o fundo partidário é uma verba recebida regularmente pelos partidos ao longo do ano. “Mensalmente, o partido vai ter direito a receber uma cota do fundo partidário. Faça chuva ou sol, ele vai recebendo aquele valor ali, mensalmente”, afirmou.
Esse repasse é calculado com base no desempenho do partido na eleição para a Câmara dos Deputados. “Quanto mais votos o partido teve para deputado federal nas últimas eleições, maior a quantidade de verbas do fundo partidário”, explicou Azevedo.
Já o fundo eleitoral tem natureza distinta. “Esse fundo é específico para as eleições. Ele só é para aquela eleição. Apenas para ser utilizado na campanha eleitoral”, destacou. Além do desempenho na Câmara dos Deputados, o fundo eleitoral leva em consideração a quantidade de senadores eleitos, ampliando a base de cálculo para a distribuição dos recursos.
Com a perspectiva de novas fusões partidárias, como a do PSDB com o Podemos e a criação da Federação União Progressista, que envolve União Brasil e Progressistas, Azevedo esclareceu que os repasses dos fundos serão somados conforme o desempenho anterior de cada sigla.
“O valor que cada um recebia vai continuar sendo repassado, só que agora para o novo partido, somado. Exatamente, vai somar para aquele novo partido”, afirmou.
Sobre o fundo eleitoral, Nara lembrou que sua distribuição é determinada pela Lei 13.487/2017, com critérios que variam entre a representação parlamentar e a votação obtida nas últimas eleições para a Câmara. “No caso específico da federação, os recursos são divididos conforme a representação de cada partido que a integra, e os repasses são feitos separadamente”, destacou.
A advogada também apontou as diferenças entre os dois tipos de financiamento público: “O fundo partidário é destinado à manutenção dos partidos, distribuído anualmente. Já o fundo eleitoral é exclusivo para campanhas e só é repassado em anos de eleição”.
Se a fusão for aprovada ainda em 2025, ela também afetará a distribuição do fundo partidário neste ano. “O TSE distribui mensalmente os duodécimos relativos aos partidos. Deixando de existir dois partidos para existir apenas um, será feita a soma dos votos obtidos na última eleição para a Câmara, conforme prevê o § 7º do art. 29 da Lei 9.096/95”, explicou.
Fundo Partidário | Fundo Eleitoral |
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Usado para manutenção dos partidos (custos administrativos, formação de quadros, comunicação etc.). | Destinado exclusivamente às campanhas eleitorais (durante o ano eleitoral). |
Distribuído anualmente com base no tamanho da bancada eleita na Câmara dos Deputados e votos obtidos. | Também segue critérios de tamanho das bancadas, com regras específicas para coligações e candidaturas. |
Pago todos os anos. | Só é pago em ano de eleição. |
As regras que determinam a divisão do fundo eleitoral e o tempo de propaganda gratuita de rádio e TV têm como base a bancada eleita para a Câmara dos Deputados em 2022. Logo, a possível fusão entre PSDB e Podemos passa a considerar os partidos uma única legenda para fins de distribuição de recursos e tempo de TV.
Atualmente, o PSDB tem 13 deputados e o Podemos, 12. A possível nova legenda passaria a ter 25 deputados. Isso garantiria mais recursos e mais tempo de TV do que os partidos teriam separadamente.
Na federação União Progressista, os partidos continuam com identidades jurídicas próprias, mas atuam como um só bloco por pelo menos 4 anos, inclusive no Congresso e nas eleições.
O União Brasil tem 59 deputados, e o PP, 49, então a federação soma 108 deputados federais. Isso torna a União Progressista a maior bancada do país, garantindo o maior tempo de TV e a maior fatia do fundo eleitoral.
Como ficam as bancadas em Goiás?
A mudança também afeta diretamente a composição das bancadas legislativas. “A bancada agora vai ser federativa, formando ali a federação, a União Progressista. É como se os deputados do União Brasil e do Progressistas agora estivessem sob o guarda-chuva da federação”, explicou o técnico do TRE-GO.
A atuação parlamentar passa, assim, a seguir as diretrizes da federação partidária, após o deferimento pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). No entanto, Azevedo destacou um ponto crucial: o tratamento jurídico é diferente em casos de fusão ou incorporação de partidos e em casos de federação.
“No caso da fusão, o TSE entende que os deputados federais, estaduais e os vereadores desses partidos podem sair, podem se desfiliar e ir para outro partido sem o risco de perder o mandato. Isso seria uma justa causa de desfiliação”, afirmou.
Já nas federações, o mesmo não se aplica: “O vereador, deputado, enfim, quem tem algum cargo, não tem muito o que fazer. Se isso for decidido pelos diretórios nacionais dos partidos, não é considerada justa causa para desfiliação”, explicou.
Em princípio, o mandato pertence ao partido. Assim, quando ocorre uma fusão, o parlamentar é automaticamente vinculado à nova legenda. “Contudo, a Resolução TSE 22.610/2007 estabelece que a fusão é considerada justa causa para desfiliação sem perda de mandato”, disse Nara.
Ela ressaltou que essa regra não se aplica às federações, pois os partidos mantêm sua identidade individual, o que impede o uso da federação como justificativa legal para troca de legenda.
As fusões também impactam diretamente os diretórios regionais e municipais, que precisarão ser reformulados com base nas novas diretrizes partidárias. “Eles devem observar as normas do novo estatuto e as regras internas estabelecidas para a federação”, afirmou a especialista.
Por fim, Nara Bueno alertou para possíveis disputas jurídicas que podem surgir, especialmente em casos de parlamentares contrários à mudança. “Para a fusão, existe a possibilidade de desfiliação por justa causa, mas se o novo partido não reconhecer essa justificativa, a questão poderá ser judicializada e caberá à Justiça Eleitoral decidir”, concluiu.
Representantes goianos na Câmara Federal:
- União Brasil: 3 deputados
- Progressistas (PP): 1 deputado
- Podemos: 1 deputado
- PSDB: 1 deputado
Nova configuração:
- União Progressista: 4 deputados federais goianos
- PSDB-Podemos: 2 deputados federais goianos
Assembleia Legislativa de Goiás (Alego):
- União Brasil: 8 deputados
- Progressistas (PP): 3 deputados
- Podemos: 1 deputado
- PSDB: 2 deputados
Nova configuração:
- União Progressista: 11 deputados estaduais
- PSDB-Podemos: 3 deputados estaduais
Câmaras Municipais (exemplo Goiânia):
- Os vereadores eleitos por PSDB e Podemos passam a integrar o novo partido.
- União Brasil e PP atuam em bloco na federação, o que pode unificar bancadas e estratégias.

“Não são apenas arranjos administrativos”, avalia cientista político
As movimentações no cenário partidário brasileiro devem alterar de forma significativa a correlação de forças nas eleições em 2026. A avaliação é do cientista político Eduardo Menezes, que vê nessas transformações mais do que simples arranjos administrativos.
“As fusões, federações e reorganizações partidárias não são apenas arranjos administrativos; elas refletem tentativas estratégicas de ampliar espaço institucional e capilaridade eleitoral”, explica o especialista. Para ele, tudo dependerá da capacidade dessas siglas em construir candidaturas viáveis e firmar alianças regionais.
“Há, sim, a possibilidade de uma mudança relevante na correlação de forças, sobretudo na fragmentação ou consolidação do chamado ‘centro político’, que será chave em uma eleição que tende a ser polarizada.”
Segundo Menezes, esse processo de reorganização do centro político já está em curso. “O centro vem tentando se reposicionar desde 2018, buscando sair da condição de mero coadjuvante entre dois polos mais definidos ideologicamente”, afirma.
As novas estruturas partidárias podem dar mais força a esse campo, com maior tempo de televisão, mais recursos e uma coesão programática mais clara. No entanto, ele ressalta que “o sucesso dessa reorganização depende de liderança, coerência e, sobretudo, de conseguir traduzir essa nova configuração em votos”.
As mudanças devem impactar também a composição do Congresso Nacional. “O impacto pode ser considerável”, diz o cientista político. “Com federações e fusões, partidos ganham mais previsibilidade para montar chapas competitivas e reduzir o número de votos ‘desperdiçados’ por quociente eleitoral.”
Isso pode significar bancadas mais robustas para algumas legendas e, por outro lado, dificultar a sobrevivência de partidos menores. A tendência, segundo ele, é de uma diminuição da fragmentação legislativa, o que pode favorecer a governabilidade.
No entanto, Menezes alerta que o processo de transformação partidária pode causar confusão entre os eleitores. “Especialmente no curto prazo, mudanças de nome, sigla e identidade partidária podem gerar ruído junto ao eleitorado, principalmente em regiões onde a política é mais personalista”, aponta.
A comunicação clara e a manutenção de figuras públicas reconhecíveis são fundamentais para evitar a alienação do público. “Mudanças pouco transparentes podem reforçar a percepção de que partidos buscam apenas benefícios burocráticos, o que mina a confiança popular”, complementa.
Com a reorganização, partidos maiores e federados tendem a ter mais acesso ao fundo eleitoral e a tempo de propaganda gratuita no rádio e na TV, elementos que seguem sendo relevantes na dinâmica eleitoral brasileira.
“O tempo de propaganda e os recursos do fundo eleitoral são instrumentos cruciais para dar visibilidade e viabilidade a campanhas, sobretudo em contextos de baixa identificação partidária”, avalia Menezes. No entanto, ele pondera: “É preciso saber aplicar esse capital político e financeiro com inteligência estratégica, o que nem sempre acontece”.
Apesar da vantagem inicial que os grandes partidos podem ter com o aumento de recursos, isso não garante sucesso eleitoral automático. “Recursos ajudam, mas não substituem carisma, organização de base e propostas claras”, enfatiza. “Vimos exemplos recentes de partidos com grande fundo partidário que tiveram desempenho pífio.”
A televisão ainda possui papel importante, especialmente no início das campanhas e entre eleitores menos conectados digitalmente. “O tempo de TV perdeu parte de sua centralidade, mas ainda é relevante”, afirma.
Entretanto, ele destaca que “as redes sociais são o novo campo de batalha: nelas, se constrói narrativa, engajamento e militância. Quem souber integrar bem os dois canais terá mais chances de sucesso”.
Nas disputas regionais, como em Goiás, essas movimentações também devem provocar alterações importantes. “Em estados como Goiás, onde há forte presença de lideranças regionais, essas mudanças podem redefinir alianças locais, alterar a composição das Assembleias e influenciar diretamente nas candidaturas ao Executivo”, observa.
Segundo ele, partidos que conseguirem se articular bem regionalmente tendem a ganhar força tanto no Congresso quanto nas assembleias estaduais. Por fim, Menezes acredita que o fortalecimento de bancadas estaduais e federais por meio das federações pode ser decisivo para 2026.
“As federações são, na prática, alianças de médio prazo que obrigam os partidos a se manterem juntos por pelo menos quatro anos”, explica. Isso, segundo ele, oferece mais estabilidade e previsibilidade nas negociações, o que deve favorecer a construção de palanques mais sólidos.
“Em 2026, partidos que já estiverem federados devem sair na frente na formação de palanques regionais e nacionais mais robustos, o que pode ser decisivo numa disputa fragmentada”, conclui.
As fusões e federações são estratégias não apenas para ampliar poder político, mas também para garantir mais recursos públicos e influência na propaganda eleitoral, fundamentais em eleições majoritárias e proporcionais.
As mudanças no cenário partidário ainda estão em andamento, mas já sinalizam uma nova dinâmica no jogo político, com efeitos concretos tanto na distribuição de poder quanto no financiamento e organização das campanhas.
Essas transformações demonstram que, além de alterar a estrutura dos partidos, as fusões e federações redesenham o equilíbrio de forças no Congresso e nas casas legislativas, influenciando diretamente os rumos da política brasileira.
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