A Lava Jato brasileira foi enterrada por um bem-sucedido pacto das elites políticas, empresariais e judiciárias. Para conter o ex-presidente Jair Bolsonaro, que ameaçava a democracia, deu-se uma união geral, ou quase geral, para “inocentar” Lula da Silva. Porque o petista-chefe era o único capaz de impedir a reeleição do líder da direita. O “acerto” do acordão se deu às custas de um erro flagrante — a morte da operação que, investigando com rigor, penalizou corruptos históricos do país, tanto políticos quanto funcionários públicos e empresários.
Entretanto, a Lava Jato da Argentina continua em plena operação. Na sexta-feira, 2, o jornal “Clarín” publicou a reportagem “Odebrecht: arranca el juicio contra De Vido y empresários” (“Odebrecht: começa o julgamento contra De Vido e empresários”), assinada por Lucía Sallinas.
No primeiro julgamento da Lava Jato argentina, que será realizado no dia 19 de maio deste ano, daqui a oito dias, mesmo acusados, representantes brasileiros da construtora Odebrecht não devem comparecer. Ainda que notificados, eles não têm se manifestado.
Entre os acusados estão Julio De Vido (ex-ministro do Planejamento dos governos de Néstor e Cristina Kirschner), Roberto Baratta, José López e os empresários Carlos Wagner e, entre outros, Aldo Benito Roggio.
O grupo de funcionários do governo e empresários é acusado de “administração fraudulenta, direcionamento, sobrepreços e um suposto circuito de subornos”. Tem a ver com a construção de duas estações de tratamento de água e esgoto da estatal Agua y Saneamientos Argentinos S. A. (AySa), na província (Estado) de Buenos Aires.
As audiências da Justiça serão quinzenais, sempre às segundas-feiras, e virtuais. A procuradora-geral do Ministério Público, Fabiana León, contestou, cobrando audiências presenciais e mais constantes. Mas a decisão judicial foi mantida.
O julgamento está nas mãos dos magistrados Germán Castelli, Enrique Méndez Signori e Fernando Canero, do Tribunal Oral Federal (TOF 7).
O juiz Sebastián Casanello, da 7ª Vara Criminal Federal, vai ouvir 290 testemunhas. Entre elas estão ex-titulares da Unidad de Información Financiera (UIF): Mariano Federici, María Eugenia Talarico e Margarita Stolbizer (no momento, deputada federal).
O julgamento do dia 19 tem a ver com os subornos envolvendo a construção a estação de tratamento de água Paraná de las Palmas e da estação de tratamento de esgoto Berazategui (“Planta del Bicentenario”).
O “Clarín” informa que “as empresas beneficiadas pela licitação foram, por um lado, a UTE integrada por Norberto Odebrecht — sucursal argentina —, Benito Roggio e Filhos, Supercemento e José Cartellone Construcciones Civiles; e, por outro lado, a UTE formada por Construcciones e Comercio Camargo Corrêa y Esuco”.

De acordo com o jornal argentino, a imputação criminal diz respeito a administração fraudulenta, com prejuízo para a administração pública, e suborno de 26 integrantes das empresas envolvidas, funcionários da AySa e do Ministério de Planificación Federal, entre eles De Vido, José López e Baratta.
No banco de acusados não estará nenhum dos empresários brasileiros. “Durante a instrução do juiz Casanello, muitos [brasileiros] foram citados, mas não compareceram”, relata o “Clarín”.
O jornal ressalta que o Supremo Tribunal Federal do Brasil, anulando provas, acabou com a Operação Lava Jato. À Justiça brasileira, empresários haviam admitido ter subornado funcionários públicos de vários países, como a Argentina e Peru. Milhões de reais foram repassados para se obter obras, com licitações fraudulentas.
A Justiça da Argentina acompanhava, com atenção, as confissões dos empresários brasileiros, da Odebrecht e da Camargo Corrêa. Porém, com as provas invalidades, os magistrados do país do presidente Javier Milei terão de se contentar, no julgamento das “plantas da AySa”, unicamente com as provas colhidas na Argentina.
Os subornos — trocas de favores milionários — ocorreram entre 2007 e 2014. A Justiça sublinha que resultou “provada a existência” de subornos, devidamente pagos, vinculados à obra Paraná de Palmas.
A empresa mais beneficiada pelas obras públicas, na área de saneamento básico, foi a brasileira Odebrecht, de Marcelo Odebrecht (hoje fora da empresa) e Norberto Odebrecht, com 50%. As demais empresas favorecidas são Supercemento (16,66%), Benito Roggio e Hijos (16,67%) e José Cartellone Construcciones Civiles (16,66%). As empresas formaram um cartel e, para obter facilidades, corromperam funcionários públicos. Na prática, irmanados, brasileiros e argentinos roubaram o Erário do país de Jorge Luis Borges e Mariana Enriquez.
Na Argentina, ao contrário do que aconteceu no Brasil, a Justiça certamente condenará corruptos poderosos, em caráter definitivo, à prisão — sem conciliações das elites políticas, empresariais e judiciais.
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