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Divulgação/Vatican News
O cardeal Malcolm Ranjith, 77, aprendeu ainda jovem que religião e política são assuntos interligados. Quando tinha 12 anos, foi às ruas protestar contra a nacionalização das escolas católicas que havia sido determinada pelo governo socialista de seu país, o Sri Lanka, experiência que o marcou por toda a vida, inclusive em sua trajetória eclesiástica.Ranjith ainda hoje é crítico do socialismo, ao mesmo tempo em que defende o que chama de capitalismo ético, mais inclusivo e sem grandes discrepâncias entre a população. Com frequência faz comentários sobre a política cingalesa, criticando casos de corrupção que, segundo ele, espalharam-se por todo o país devido a “práticas econômicas equivocadas”.Nomeado cardeal pelo papa Bento 16, em 2010, Ranjith é influente no debate público de seu país, que tem maioria budista. Por vezes, é acusado de atuar como ativista. Em 2022, chegou a pedir a renúncia do então presidente, Ranil Wickremesinghe, que lidava com protestos devido a uma grave crise econômica.Atualmente, é candidato a se tornar o primeiro papa asiático da história moderna, representando a ala conservadora da Igreja. Caso seja eleito, pode rever posicionamentos de Francisco em temas sensíveis: Ranjith é favorável à pena de morte em casos extremos e tem opiniões inflexíveis quanto à eutanásia e ao casamento homoafetivo, manifestando-se de forma contrária à legalização e aceitação dessas iniciativas.No ano passado, ele proibiu a presença de mulheres no altar das paróquias de sua arquidiocese, numa decisão que lhe rendeu projeção e críticas em todo o mundo. Ranjith argumentou que a presença delas poderia impactar o número de candidatos que ingressam nos seminários. “Não podemos correr esse risco.”Especialistas consideram que a decisão é reflexo de uma misoginia cultural enraizada. No Sri Lanka, espera-se que as mulheres se tornem esposas e mães. Em 2019, elas representavam apenas 33,5% da força de trabalho do país, de acordo com relatório divulgado no fim de 2021 pelo Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento). No Parlamento, são menos de 10%.Apesar de diferenças, Ranjith manteve relação amistosa com o papa Francisco, e ambos compartilharam a preocupação com os mais vulneráveis e a defesa do ambiente. O próprio cardeal cingalês tem origem humilde: nasceu na cidade de Polgahawela, localizada no noroeste do Sri Lanka, e cresceu em um vilarejo com forte presença da Igreja e orgulhoso de suas tradições.Depois de ingressar no seminário, foi enviado pelo arcebispo a Roma, onde se formou em teologia. De volta ao Sri Lanka, o então padre Ranjith viveu o que descreve como outra experiência transformadora: o trabalho pastoral junto a comunidades de pescadores. Em uma região sem água encanada, eletricidade ou moradia adequada, o cingalês conviveu com a pobreza extrema –o que, segundo ele, ensinou-o a enxergar o “realismo da vida”.Ranjith foi nomeado arcebispo de Colombo, capital do Sri Lanka, em 2009. Um ano depois, foi eleito presidente da Conferência dos Bispos de seu país e se tornou cardeal.Como arcebispo, Ranjith ficou conhecido por aumentar o número de padres diocesanos, dedicar-se à evangelização de crianças (o que lhe rendeu o apelido de “bispo das crianças”) e promover maior respeito às celebrações litúrgicas, resgatando práticas tradicionais em todo o país, inclusive o uso mais frequente do latim.Ranjith se declara fluente em dez idiomas: italiano, alemão, francês, hebraico, grego, latim, espanhol, inglês, cingalês e tâmil –os dois últimos línguas oficiais de seu país.Tradicional e conservador, o cardeal representaria, caso eleito, uma reaproximação à linha de Bento 16. Assim como Francisco, entretanto, seria outro representante não europeu –desta vez da Ásia, região em que a Igreja Católica está crescendo com relativa rapidez.