Moradora de Baixo Guandu vira bisavó aos 50 anos

Delma Caetano de Souza Kamke tem 5 filhos, sendo que o primeiro nasceu quando ela tinha 16 anos. Ana Cláudia de Matos, 36 anos, é mãe de Kamila Matos de Miranda, de 20 anos, que deu à luz Matteo, bisneto de Delma, em 2024

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Acervo pessoal

Ter filhos cedo nunca foi problema para a produtora rural Delma Caetano de Souza Kamke, moradora de Baixo Guandu, no Noroeste do Espírito Santo. Aos 50 anos, ela já é bisavó e vive com orgulho cada geração de sua família.Moradora da comunidade rural Patrimônio do Tamanco, ela conta que teve o primeiro filho aos 16 anos, tornou-se avó aos 30 e hoje celebra a chegada do bisneto Matteo. “Quando soube que ia ser bisavó, chorei. Minha maior alegria está nos meus filhos, netos e agora no bisneto. A família é tudo para mim, é um presente de Deus”.Matteo, com apenas quatro meses, é filho de Kamila Matos de Miranda, de 20 anos, neto de Ana Cláudia de Matos, de 36, uma das filhas de Delma. “Minha mãe sempre foi uma mulher forte. Quero transmitir essa força ao meu neto também”, diz Ana Cláudia.Kamila, a jovem mãe, se comove ao falar da bisavó do filho. “Ela ajuda muito. Poucas famílias têm esse privilégio hoje.”Mãe de cinco filhos – três mulheres e dois homens –, Delma já tem cinco netos, mas carrega no coração a dor da perda da neta mais velha, Stefany, vítima de um acidente há 14 anos. “A dor não passa, mas meus outros netos me fortalecem”.Entre os netos estão os gêmeos Ezequiel e Mateus, de 15 anos. “Ela é nossa heroína. Está sempre ativa. Trabalha na roça, nos escuta, dá conselhos. E ainda faz a melhor comida do mundo”, diz Mateus.É na terra que Delma se sente viva. Há mais de quatro décadas, planta, colhe e sustenta a família com dedicação. “Acordo cedo, lavo o rosto na água fria e vou para o mato”.Para Ana Cláudia, mãe dos gêmeos, a matriarca é a base de tudo. “Se estamos unidos, é graças a ela. Sempre teve pulso firme, mas nunca faltou amor. É uma mulher que não se abate, que enfrenta as dificuldades e segue em frente. Minha mãe é o coração da nossa família. É essa força que quero passar para o meu filho agora”.Delma Kamke, produtora rural: “Nunca deixei faltar amor e nem comida no prato”Delma Caetano de Souza Kamke nasceu na zona rural de Baixo Guandu. Filha de lavradores, começou a trabalhar na roça aos 11 anos de idade, ajudando os pais no sustento da casa. Foi mãe aos 16, avó aos 30 e, em 2024, tornou-se bisavó aos 50, formando uma família de quatro gerações unidas e marcadas pela força feminina.A Tribuna – O que significa para a senhora ser bisavó aos 50 anos?Delma Kamke – Muita gente se assusta quando ouve, mas para mim é motivo de orgulho. Eu comecei cedo e minha família também. Ser bisavó nova não é problema, é sinal de que a vida andou rápido e que a gente foi seguindo em frente. O Matteo é uma bênção. Ver ele crescendo, saber que já tem uma quarta geração depois de mim é gratificante. Mostra que tudo que plantei lá atrás tá dando fruto hoje. E o melhor: ainda tenho saúde para acompanhar, ajudar, para ensinar.Como foi criar cinco filhos no meio da roça, trabalhando tanto?Foi puxado. Tinha dia que eu mal tinha força pra levantar, mas levantava. Trabalhar, cuidar de criança, fazer comida, dar conta da casa. Tudo ao mesmo tempo. Mas nunca deixei faltar amor e nem comida no prato. Eduquei com firmeza, ensinei a respeitar os outros e a correr atrás das coisas. A senhora se considera uma mulher forte?Me considero. Não porque sou invencível, mas porque nunca deixei a peteca cair. Criei cinco filhos, enfrentei perdas, trabalhei a vida inteira, nunca deixei faltar comida na mesa. Ser forte, pra mim, é isso: aguentar a pressão e seguir em frente sem fazer drama.Maternidade fora dos planosSer mãe aos 16 anos não estava nos planos de Delma Caetano, mas ela abraçou o desafio com coragem. Hoje, aos 50, ela olha para trás com orgulho da escolha que fez ainda tão jovem. “Quando descobri que estava grávida, fiquei assustada. Não sabia direito o que fazer”. Na época, ela morava com os pais na zona rural de Baixo Guandu. A vida simples na roça, com poucos recursos e muitas responsabilidades, não impediu que ela enfrentasse tudo de cabeça erguida. “Minha mãe me ajudou muito, mas o peso era meu”.Delma conta que havia preconceito, mas ela não se abalou. “Muita gente me olhou torto, falava pelas costas. Mas segui firme”. Ela recorda que, mesmo jovem, nunca fugiu das tarefas. “Cuidava da casa, lavava roupa na mão, fazia comida no fogão a lenha, e ainda ia plantar. Não tinha moleza”.Ao ver a família crescer, Delma se emociona. “Aquele bebê aos 16 anos me fez mulher. Hoje, sou mãe, avó e bisavó. Faria tudo de novo”.Paixão e orgulho pelo trabalho no campoA vida na roça nunca foi fácil para Delma Caetano, mas foi nela que ela encontrou força. Desde os 11 anos, quando começou a ajudar na lavoura de seus pais, o campo é sua segunda casa. E ela não parou com a chegada dos netos nem do bisneto. A produtora rural ainda acorda cedo, lava o rosto na água fria do tanque e vai trabalhar. “Eu não sei ficar parada. A terra é minha vida. Tem dia que nem como direito, só quero as plantas, o cheiro de mato, o barulho da enxada batendo no chão”, diz.Hoje, Delma é conhecida por ser uma das melhores peoas da região, trabalhando em lavouras de terceiros, onde cuida do plantio de café e da colheita de milho. “Trabalho o dia inteiro, muitas vezes até de noite. Não tem horário, mas a roça é o meu lugar.”ANÁLISE

Marcos Lacerda, sociólogo especialista em dados populacionais

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Acervo pessoal

“Mulheres acumulam responsabilidades desde muito cedo”“Casos como o de Delma, bisavó aos 50 anos, revelam uma faceta significativa da realidade brasileira: a persistência da maternidade precoce, especialmente em determinados contextos regionais e socioeconômicos. Essa precocidade gera um efeito em cadeia nas gerações seguintes, mantendo o ciclo de vulnerabilidade social. Em muitos casos, a maternidade se antecipa por falta de acesso a políticas públicas de educação sexual, planejamento familiar e oportunidades para a juventude. Por trás da estatística, há histórias de mulheres que acumulam papéis e responsabilidades desde muito cedo”.

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