O economista e filósofo Eduardo Giannetti concedeu excelente entrevista¹ à repórter Cássia Almeida, de “O Globo” (sábado, 19).
Eduardo Giannetti diz que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, está bagunçando o mundo e, possivelmente, de maneira incontornável.
A primeira consequência do tarifaço de Trump “é a redução do comércio internacional”. O que pode levar a uma recessão global.
“Uma reconfiguração dos fluxos de comércio” será a segunda consequência. China, México e Canadá terão de buscar outros mercados. “O Brasil pode se beneficiar do fechamento do mercado chinês para os produtores americanos, com a venda de proteína animal, soja milho.”
A perda de eficiência das economias é a terceira consequência, aponta Giannetti. “O protecionismo leva à perda de eficiência microeconômica.”
A inflação vai “reaparecer”, ou firmar-se. “É inevitável, por que os preços vão ficar mais altos de um modo geral.” O Fed, banco central americano, tende a elevar os juros, o que contribuirá para a redução da atividade econômica.
Os títulos do Tesouro americano podem perder força. Em seguida, a recessão dará as caras. “Há uma paralisia das decisões de investimento. A ação de Trump comprometeu a confiança no ambiente de negócios”, assinala Giannetti.

Pensando como cientista político, Giannetti explica por que a direita está se fortalecendo em todo o mundo: “A ascensão da extrema direita no mundo é um reflexo do descontentamento dos trabalhadores ocidentais com a situação criada pela hiperglobalização”.
De acordo com Giannetti, “a entrada de centenas de milhões de asiáticos na produção global foi devastadora para a pretensão de segurança e melhoria de vida da classe trabalhadora ocidental. Perdeu capacidade de negociação, perdeu emprego. Esse caldo de ressentimento e frustração levou a extrema direita ao sucesso eleitoral. A classe média e trabalhadora do Ocidente perdeu muito da segurança e prosperidade”.
Os Estados Unidos, com Trump, estão apresentando uma resposta “regressiva, atabalhoada e desastrada”.
Segundo Giannetti, com Trump, “é muito patente a regressão ao mercantilismo do século XVII, num pensamento que antecedeu a Revolução Industrial, quando as considerações geopolíticas dominavam sobre a eficiência e racionalidade econômica, quando o poder sobre as nações era mais determinante do que o bem-estar e a geração de riqueza”.
Giannetti acrescenta que “Trump está regredindo ao mercantilismo, com esse objetivo de fazer superávit na balança comercial, ter produção doméstica para o consumo do país”.
O economista diz que os Estados Unidos “são uma potência em declínio e a China é uma potência em ascensão”. Mas Giannetti admite que, como não está mais conseguindo atender as grandes aspirações dos chineses, pois o país não cresce mais a 10% ao ano, e sim a 5%, é possível uma crise social e, até, política.
Sobre o Brasil, Giannetti diz que tem “uma economia fechada, pouco ligada ao comércio mundial. Mercado interno grande ajuda muito numa hora assim. Temos capacidade de ocupar espaços que vão se abrir com a reconfiguração do fluxo de comércio. De modo geral, quando tem crise externa, o Brasil reage bem”.
A crise gerada pelos Estados Unidos pode acabar ajudando a “desbloquear o acordo da União Europeia e o Mercosul”. Noutras palavras, o tiro de Trump pode sair pela culatra. Já está saindo.
Nota
¹ A entrevista saiu com o título “‘Trump está regredindo ao mercantilismo’, diz o economista Eduardo Giannetti
A íntegra da entrevista (muito mais ampla do que minha síntese) pode ser conferida em “O Globo” (https://tinyurl.com/3axp7ehm).
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