Trabalhadores pedem redução da carga horária; empresas relutam em investir no aumento da produtividade

Pesquisa realizada pelo Nexus, instituto de pesquisas de mercado e comportamento do consumidor, trouxe de volta à tona uma discussão que ocupa o centro do debate social e político há meses: a redução da jornada de trabalho. O estudo revelou que 65% dos brasileiros apoiam a redução da carga horária semanal de 44 para 36 horas, além de indicar que o apoio é ainda mais forte entre os jovens, com 76% de adesão entre pessoas de 16 a 24 anos.

O levantamento também apontou que 55% da população acredita que a redução das horas de trabalho poderia significar um aumento na qualidade de vida, com muitos optando por usar o tempo extra para estar com a família, cuidar da saúde ou até investir em qualificação profissional.

A proposta de mudança, que tramita no Congresso na forma da PEC 6×1, visa a alteração da Constituição para garantir uma carga máxima de 36 horas semanais, distribuídas ao longo de quatro dias de trabalho. A ideia, no entanto, enfrenta resistência, principalmente entre os empresários, que temem que a redução da jornada possa afetar a produtividade. Eles argumentam que uma carga horária menor poderia diminuir os rendimentos das empresas e afetar a arrecadação tributária.

Países como a Alemanha, que possui um dos maiores índices de desenvolvimento humano (IDH) do mundo, são utilizados como argumento para justificar que a redução das horas de trabalho é viável sem prejudicar a eficiência. Entretanto, a comparação entre a realidade brasileira e a de países com um IDH elevado, como a Alemanha (que ocupa a 7ª posição no ranking global de IDH com 0,950), parece estar fora de contexto. O Brasil, com IDH de 0,760 e ocupando a 89ª posição mundial, ainda enfrenta desafios profundos como a desigualdade social, a pobreza e a falta de acesso a serviços básicos de saúde e educação.

A realidade brasileira é muito diferente da de países desenvolvidos, onde os sistemas de seguridade social são mais robustos, e as condições de trabalho são mais equilibradas. Comparar essas realidades é, no mínimo, um erro.

Para entender a relevância da proposta, é preciso considerar a rotina do trabalhador brasileiro. Com jornadas de trabalho que muitas vezes ultrapassam as 12 horas diárias, o trabalhador retorna para casa exausto, sem tempo ou energia para cuidar de sua saúde, se especializar ou estar com a família. O cenário é comum para milhões de brasileiros, especialmente em empregos informais ou em setores de baixa qualificação, onde a exigência de horas extras é a regra, não a exceção.

Quando se trabalha em condições extenuantes, a qualidade de vida sofre um impacto direto. O trabalhador se vê refém de uma rotina em que só tem energia para descansar e se alimentar, sem conseguir se dedicar ao lazer, à educação ou a cuidados pessoais.

Em uma sociedade onde o salário muitas vezes mal cobre as necessidades básicas, muitos trabalhadores não têm o luxo de priorizar o bem-estar físico e mental. Se não houver um salário suficiente, as necessidades mais urgentes, como alimentação e moradia, se tornam a única preocupação.

A redução da jornada de trabalho não é, portanto, uma simples questão de “menos trabalho”. Ela é uma questão de dignidade e de permitir ao trabalhador mais tempo para cuidar de si e de sua família, além de possibilitar que ele tenha a oportunidade de melhorar suas qualificações e, eventualmente, sua posição social.

O discurso dos empregadores de que a redução da jornada prejudicaria a produtividade é, no fundo, uma resistência à mudança e ao investimento necessário para tornar essa transformação possível. Eles reconhecem que, para que a redução das horas de trabalho seja viável, seria necessário um investimento em automação, digitalização, qualificação da mão-de-obra e, principalmente, uma reestruturação no modo de operação das empresas.

Contudo, esse tipo de mudança exige recursos financeiros e, muitas vezes, uma reorientação da estratégia de negócios, algo que muitos empregadores não estão dispostos a fazer.

Os empresários apontam para exemplos de países com IDH elevado como a Alemanha, e alegam que a produtividade desses países não foi afetada pela redução da jornada de trabalho. No entanto, essa comparação ignora as profundas disparidades sociais e econômicas entre o Brasil e esses países.

A falta de acesso universal a serviços de saúde e educação, a precarização do trabalho e a insegurança alimentar em larga escala são problemas que o Brasil ainda precisa enfrentar, o que torna a argumentação dos empresários questionável.

O Brasil não pode se dar ao luxo de seguir modelos de países com realidades tão diferentes da sua. Para que a redução da jornada de trabalho seja eficaz, é necessário que o país adote políticas públicas que incentivem a qualificação da mão-de-obra e o uso de tecnologias que aumentem a eficiência nas empresas.

As mudanças precisam ser estruturadas de forma a não prejudicar o funcionamento do mercado de trabalho, mas, ao contrário, a favorecer um modelo mais equilibrado e justo.

A PEC 6×1, que propõe a redução da jornada de trabalho sem redução salarial, pode ser um avanço significativo para a sociedade brasileira, oferecendo aos trabalhadores mais qualidade de vida e a possibilidade de buscar outras formas de desenvolvimento, como educação e cuidados com a saúde. Com a mudança, mais tempo seria dedicado à família, ao descanso e ao lazer – fatores que têm grande impacto no bem-estar geral da população.

Além disso, a pesquisa da Nexus revelou que 55% dos brasileiros acreditam que a produtividade aumentaria com a redução das horas trabalhadas. Este dado reflete uma tendência crescente de que, ao invés de trabalhar mais horas, é possível ser mais produtivo trabalhando de forma mais inteligente, com maior motivação e bem-estar. O trabalhador brasileiro precisa de mais tempo de descanso para ser mais produtivo e saudável, e assim, contribuir mais eficazmente para o desenvolvimento do país.

O Brasil precisa urgentemente repensar suas jornadas de trabalho exaustivas e começar a trilhar um caminho em que o equilíbrio entre vida pessoal e profissional seja prioridade. Isso não só beneficiará os trabalhadores, mas, a longo prazo, também impulsionará a economia, com um mercado de trabalho mais motivado, qualificado e saudável.

A hora de mudar chegou, e os empregadores precisam entender que o futuro do Brasil não pode ser construído em cima da exaustão de seus trabalhadores.

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