O “lado B” dos líderes do agro no Instagram: caldo de cana, Porsche e academia

Blairo saboreia um pastel com caldo de cana na feira. Joesley segura um shampoo no supermercado. Marquinhos levanta pesos na academia. Paulo acelera na pista.

Tudo isso está no Instagram. À primeira vista, são cenas triviais, fragmentos de uma rotina comum. Mas por trás desses momentos banais na rede social estão gigantes do agronegócio, líderes de empresas que movimentam bilhões de reais ano após ano.

A diferença é que, hoje, todo mundo consegue ver a vida desses empresários na palma da mão.

Se, no passado, CEOs de grandes empresas temiam expor seu lado privado ao escrutínio público, receosos principalmente por sua segurança, esse medo ficou para trás, com o avanço das redes sociais.

Hoje, a maioria está conectada. Alguns com perfis públicos, outros restritos à família e a poucos amigos próximos, mas todos presentes de alguma forma.

Muitos estão no LinkedIn, a rede corporativa por excelência. Outros preferem o Instagram – ou até o Facebook, que, apesar de ter sido abandonado por boa parte dos jovens, mantém um público ainda fiel entre as gerações mais velhas.

Alguns empresários só recentemente aderiram às redes. Joesley Batista, acionista do grupo J&F e controlador da gigante de alimentos JBS, por exemplo, passou anos longe dos holofotes, mas passou a manter um perfil ativo no Instagram desde o começo de janeiro.

Com 9,5 mil seguidores até o momento, Batista tem privilegiado o compartilhamento de frases motivacionais em seu perfil. “Visitar lojas é manter a barriga no balcão”, disse numa postagem recente, ao comentar uma visita a um atacado.

“Por trás de um CNPJ de sucesso, tem um CPF que não desistiu”, afirmou em outra publicação. “Inovar é se desafiar constantemente a explorar coisas novas.”

Também aparece em atividades do Instituto J&F, em compromissos como o Fórum Econômico Mundial de Davos, na Suíça, e em registro com o irmão, Wesley, e o pai, José Batista Sobrinho – no perfil, não expõe, entretanto, imagens privadas com os filhos ou a esposa, a jornalista Ticiana Villas Boas, que também voltou a utilizar seu Instagram em agosto do ano passado após

Se Joesley resolveu aparecer publicamente, um de seus grandes concorrentes, Marcos Molina, fundador e presidente do conselho de administração da Marfrig, segue discreto: não tem perfis nas redes sociais e raramente concede entrevistas.

Já seu primogênito, Marquinhos Molina, optou seguir por outro caminho. Com um perfil aberto ao público no Instagram, compartilha com frequência aos seus 8,1 mil seguidores sua rotina de treinos entre uma reunião e outra na Arábia Saudita, onde desembarcou há poucos meses para ajudar na expansão da presença da BRF – agora sob o controle da Marfrig – no Oriente Médio.

Nos stories e nas postagens, além dos exercícios físicos, Marquinhos também posta registros de compromissos como um curso na Harvard Business School, uma das mais prestigiadas escolas de negócios do mundo, e encontros com sauditas, além de volta e meia mostrar gôndolas dos supermercados locais recheadas de produtos Sadia.

Marcos Molina aparece em algumas (poucas) fotos do perfil do filho. Em uma, está acompanhando um jogo de NFL no Brasil. Em outra, em um evento da Marfrig.

Blairo Maggi, acionista da Amaggi e ex-ministro da Agricultura, ex-senador e ex-governador de Mato Grosso, é de longe, o que tem mais seguidores entre os grandes nomes da agro. São mais de 88 mil. E é um dos mais ativos na rede.

Maggi surge em postagens quase sempre casuais, ao lado da esposa, da mãe e dos netos, mas também sob outras peles, todas menos conhecidas do público: ora está vestido de Papai Noel, ora com roupa de pescador, ora com a camisa do Cuiabá, time de futebol que disputou a primeira divisão do Campeonato Brasileiro no ano passado

Com 5,1 mil seguidores em seu perfil no Instagram, outro nome relevante do agronegócio nacional, Paulo Sousa, CEO da Cargill no Brasil, também revela ali seu “lado B” nas pistas de automobilismo.

Nas horas vagas, ele é piloto, com participações de corridas que utilizam apenas carros esportivos da marca Porsches, realizadas no Autódromo de Interlagos, em São Paulo. Além disso, também já repostou piadas, charges, recortes de jornal e vídeos de filosofia.

Quanto mais humano, melhor

Para especialistas ouvidos pelo AgFeed, a entrada dos líderes do agro com mais forças no Instagram reflete uma tendência de humanização de imagem – não só dos líderes, mas das empresas como um todo, de olho em um impacto positivo.

O investimento em branding pessoal, ou seja, a construção de uma marca própria, vem crescendo nos últimos meses, segundo o especialista em branding, CEO da consultoria Neodigital e diretor da Associação Brasileira de Marketing Rural (ABMRA), Alberto Meneghetti.

“Os líderes estão começando a enxergar que a presença deles nas redes agrega valor à marca da empresa. Todo mundo se deu conta de que é mais benéfico para a empresa o líder se humanizar mais. Gera mais engajamento”, afirma Meneghetti, ressaltando ainda que esse movimento não ocorre apenas no agro, mas também entre líderes de outros segmentos.

Para Mônica Zanotto, especialista em marketing e comunicação para o agro e diretora da consultoria MKT do Agro, as empresas ganham com essa relação.

“Quanto melhor estiver posicionada a figura pública da marca, seja o CEO, seja o diretor, seja o pesquisador, nas redes sociais, melhor vai ser para a marca”, afirma.

A preferência pelo Instagram, ao invés do LinkedIn – que seria a escolha mais óbvia para líderes de grandes empresas – se deve ao caráter “versátil” da plataforma, na avaliação de Meneghetti.

“O Instagram tem um caráter e uma narrativa muito mais visual, mais leve e muito menos formal que o LinkedIn”, resume.

“Para os líderes do agronegócio, pode ser muito mais interessante usar o Instagram para criar essa conexão emocional, porque eles mostram os bastidores, os desafios diários que eles enfrentam e, talvez, os aspectos mais humanos da gestão empresarial.”

O diretor da ABMRA cita algumas postagens que Joesley Batiista para ilustrar o exemplo da versatilidade da rede pertencente à Meta, do bilionário Mark Zuckerberg.

Em uma das postagens, o acionista da JBS aparece em uma foto junto de Luiza Helena Trajano, presidente da varejista Magazine Luiza; em outros posts, ele está no supermercado ou esquiando.

“O seguidor acaba conhecendo, além do líder de uma grande empresa, um pouco sobre o que ele é também no pessoal”, diz Meneghetti.

Mônica Zanotto, da consultoria MKT do Agro, ressalta que o Instagram é uma rede de relacionamento que consegue alcançar um público mais amplo.

“No Instagram, a gente não se relaciona só com o agricultor, com o pecuarista, a gente se relaciona com a grande comunidade que nós temos”, afirma.

Meneghetti compartilha da mesma opinião. “No LinkedIn, o empresário tem o networking que ele já conhece, as pessoas que ele já vê. No Instagram, sai um pouco da bolha.”

Um ponto importante, para Zanotto, é alinhar valores da empresa com o discurso do CEO para que não haja um eventual ruído – ainda que exista a possibilidade de utilização de tons diferentes.

A especialista cita como exemplo um episódio de desalinhamento que rendeu críticas ao CEO da empresa G4 Educação, Talis Gomes, em setembro do ano passado.

Após receber a pergunta “Se sua mulher fosse CEO de uma grande companhia, vocês estariam noivos?”, feita por um de seus seguidores em seu perfil pessoal no Instagram, Gomes respondeu: “Deus me livre de mulher CEO”.

Na sequência, Gomes passou a sofrer várias críticas nas redes sociais e recebeu uma resposta pública de Luiza Trajano, do Magazine Luiza, no LinkedIn. A varejista tinha feito anteriormente uma parceria com a G4 para oferecer um curso ao seus vendedores.

“Às mulheres, peço que não deixem que posicionamentos como esse abalem seus desejos e opções”, afirmou.

Após a polêmica, Gomes pediu desculpas publicamente – e antes disso, a própria G4 disse que não concordava com a posição de seu fundador.

“O que precisa estar muito bem alinhado é ter coerência entre os valores e as mensagens principais e foi aí onde o Talis errou”, afirma Zanotto.

A consultora defende que os CEOs sempre tenham suporte de comunicação. “Principalmente para saber lidar com os haters, que vão aparecer.”

Apesar da necessidade de treinamento e apoio para lidar com as redes, a solução também não é fechar os comentários para evitar os haters, na avaliação de Alberto Meneghetti.

“Tem que haver o contraditório também, o lado bom e o lado ruim. Tem que ficar de olho nas redes, responder e não só simplesmente postar”, avalia.

A vantagem, para Meneghetti, é que o líder de uma empresa consegue utilizar a sua voz de uma forma muito mais pessoal e autêntica em comparação com a sua própria companhia.

“Talvez a empresa não consiga transmitir a mensagem com a mesma intenção do CEO, até pelas suas limitações. O CEO pode ir além da visão sobre o setor, a filosofia de trabalho dele, a experiência pessoal dele e dar opinião sobre qualquer outro assunto: sustentabilidade, inovação, tendência de mercado”, enumera.

Meneghetti cita o perfil de Marquinhos Molina no Instagram como exemplo de utilização da rede para trazer o lado setorial.

“Ele usa o Instagram não para falar só da Marfrig, mas sobre o papel do Brasil, do mercado global de carne, a internacionalização da empresa”, afirma.

“Se ele vai para o LinkedIn, ele vai ter que falar sobre a Marfrig. E todo mundo vai achar que quem está falando é a Marfrig, porque tem uma assessoria de empresa atrás”.

Alguns executivos trazem, sim, questões setoriais para o seu perfil. É o caso, por exemplo, de Odílio Balbinotti Filho, CEO da Atto Sementes, que aparece em seu perfil no Instagram comentando assuntos como a insegurança em Mato Grosso, estado-sede da Atto, e a polêmica envolvendo a moratória da soja.

Meneghetti sugere que os líderes do agro tenham sempre cautela ao pisar no terreno da política. “Ao se posicionar sobre questões políticas, o CEO deve deixar claro que está expressando uma opinião pessoal, para preservar a imagem e os valores da empresa”, afirma.

“O CEO pode ter as próprias opiniões políticas, mas a empresa pode ter uma posição diferente, neutra, em relação a vários temas. A empresa lida com diversos públicos e stakeholders. Sempre quando entrar nesse “terreno movediço”, tem que tomar muito cuidado”, complementa.

Meneghetti ressalta ainda que misturar preferências políticas pessoais com a empresa não é uma boa estratégia para os líderes das empresas. “O CEO pode evitar declarações inflamadas ou polarizadoras. Isso mantém a imagem da liderança mais equilibrada e menos propensa a gerar controvérsias desnecessárias.”

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