Amaggi e Ramax duelam na Justiça pelo milho que produtor vendeu às duas empresas

O produtor rural Marlon Engler, de Juara (MT), deveria ter destinado 70 mil sacas de 60 quilos de milho colhidas na safra passada à Amaggi. O contrato, comum entre os mais de 6 mil fornecedores da gigante do agronegócio, foi atrelado a uma Cédula do Produto Rural (CPR), firmada em fevereiro de 2024.

A CPR previa como garantia à companhia a penhora do milho. No entanto, o produtor descumpriu o contrato. Em maio do ano passado, Engler vendeu (e entregou) 18.248,67 sacas de milho para o confinamento da Ramax Importação e Exportação de Alimentos, com sede também no município mato-grossense.

Nascia aí uma batalha judicial, cujo último capítulo, iniciado segunda-feira, 13 de janeiro, foi marcado pelo arresto parcial do milho estocado no confinamento da Ramax por parte da Amaggi. O arresto foi suspenso na terça-feira, 14 de janeiro, e novamente autorizado na noite da quarta-feira, 15 de janeiro, também por decisão judicial.

Ainda no ano passado, sem ter recebido o milho contratado, a Amaggi tentou exercer o direito de penhora do cereal. Conseguiu retirar parte da produção na lavoura de Engler, mas o insuficiente para chegar ao total contratado.

Por meio de um monitoramento de satélite, a Amaggi apurou que a colheita de milho ocorreu de fato. A companhia constatou também que caminhões entregaram o grão no confinamento da Ramax, ao invés dos armazéns da companhia.

A Ramax, por sua vez, admite que comprou o cereal, mas que pagou pelo produto e até possui nota fiscal. Alega ainda que não sabia da existência da CPR e reconhece que não consultou o cartório para constatar a possibilidade de penhora prevista na cédula.

Sem o milho de Engler, a Amaggi acionou a Justiça de Mato Grosso para buscar o produto entregue no confinamento. Há cerca de seis meses, conseguiu o primeiro arresto na Ramax, em Juara, mas a decisão foi suspensa por uma liminar da 4ª Vara Cível de Cuiabá.

Na decisão, a Justiça, no entanto, determinou que o milho ficasse armazenado pela Ramax até que o processo fosse julgado ou houvesse acordo entre as partes. A demanda judicial caminhou para o Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), que também negou, ainda em 2024, o pedido da Amaggi.

No entanto, no último sábado, a Terceira Câmara de Direito Privado do TJMT, acatou um agravo da Amaggi e autorizou o arresto.

Com a decisão, acompanhada de uma oficial de justiça e o suporte policial, a Amaggi foi ao confinamento e iniciou a retirada da quantidade de milho que entende ser sua. Utilizou caminhões e estruturas próprias para isso.

Uma nova decisão judicial, no entanto, atendeu a demanda da Ramax e paralisou novamente o arresto. A juíza Ana Cristina Silva Mendes deu 48 horas para a Amaggi e a oficial de justiça explicarem supostos abusos no processo de retirada do milho.

Nas explicações, a oficial de Justiça e a Amaggi relataram tentativas de obstrução da operação de carregamento e pesagem, além de ofensas contra a agente do Judiciário e o advogado da Amaggi. A juíza aceitou os argumentos e a operação deve ser retomada nesta quinta-feira, 16 de janeiro. A Ramax informou que vai continuar em busca de uma solução na Justiça, com recursos ao TJMT.

O AgFeed ouviu os dois lados da disputa judicial. Tentou ainda contato com Engler, mas o produtor rural não atendeu às ligações telefônicas até o momento e nem aos pedidos de entrevista por aplicativo de mensagem e e-mail.

Marcelo Fraga, gerente jurídico da Amaggi, afirmou que a companhia tem um planejamento que começa antes mesmo de o milho ser plantado e que segue pela busca de armazenamento, um corredor para escoar o grão e a contratação de navios.

“Nosso negócio é a cadeia do grão em que é preciso cumprir contrato. Não posso entregar histórias para o cliente”, disse.

Para “não entregar histórias” e sim produtos, Fraga afirma que a Amaggi faz contratos com garantias que são registradas em cartório

“A empresa (Ramax) não fez a devida diligência de ir ao cartório e puxar a certidão. Ou, se fez, assumiu o risco e hoje tem de devolver o produto a quem é de direito”, disse.

O gerente jurídico afirmou que é vegetariano e que se solidariza com a justificativa de que a Ramax não terá o cereal para alimentar os animais no confinamento caso o arresto siga em frente.

No entanto, lembra que o processo foi iniciado há mais de seis meses e que, na primeira decisão, a Justiça pediu que o produto ficasse armazenado e à disposição.

Ainda segundo Fraga, a Ramax criou resistência desde o início do processo e, em nenhum momento, a Amaggi foi procurada pela empresa para um acordo. “Ela comprou mal e tem de arcar com o erro”.

Magno Alexandre Gaia, CEO da Ramax, sustenta que a empresa pagou pelo milho entregue e consumido pelos animais da unidade que recebe 35 mil animais por ano.

Para Gaia, o produto que a Amaggi quer “não existe mais” e o pedido da companhia é que a Justiça tenha bom senso, pois o insumo é essencial para a atividade e para a alimentação dos animais.

“Foi montada uma operação de guerra, com o confinamento arrombado, ação de policiais e gerou um transtorno. A decisão (do TJMT) não considera a consequência que pode trazer, com maus-tratos, desemprego de funcionários”, afirmou.

Gaia não consegue precisar quanto milho chegou a ser arrestado, mas calcula em torno de 6 mil sacos dos mais de 18 mil pretendidos. “Fizeram a retirada no meio da chuva e usaram milho até como cascalho para que caminhões pudessem se movimentar”.

O CEO da Ramax sustenta ainda que o processo nem deveria existir, já que a Amaggi teria descumprido um prazo de recurso. “No final de semana, a partida foi reiniciada para, na calada da noite, sermos surpreendidos por essa decisão intempestiva”.

Uma emergente no mercado da carne

Criada em 2008 como uma trading, a Ramax iniciou as atividades exportando carnes de frigoríficos brasileiros, argentinos e paraguaios. Os clientes e os acessos aos mercados surgiram a partir da experiência de Gaia no Frigorífico 4 Marcos, que passou por um processo de recuperação judicial e acabou comprado pela JBS.

Segundo ele, os negócios cresceram e levaram a empresa a ocupar todos os elos da cadeia pecuária.

A empresa tem atividades na engorda de animais, confinamento, abate, firmou contratos para operar frigoríficos em Guarantã do Norte (MT) e Presidente Prudente (SP), segue com a trading e mantém uma plataforma digital na China para entregar a carne a restaurantes naquele país.

Em 2024, segundo o CEO, foram 35 mil cabeças de gado confinadas, 240 mil encaminhadas ao abate e 38 mil toneladas exportadas. Para 2025, a Ramax espera aumentar para 45 mil animais confinados, 280 mil destinados ao abate e 60 mil toneladas exportadas.

O faturamento da empresa saiu de R$ 1,2 bilhão em 2023 para R$ 1,4 bilhão em 2024, de acordo com dados fornecidos pela própria Ramax.

“Queremos atingir R$ 2,2 bilhões em 2025”, afirmou Gaia, que atendeu o AgFeed por videoconferência a partir da sede da trading nos Estados Unidos.

Além dessa sede, do confinamento centro da polêmica e dos frigoríficos em Mato Grosso e São Paulo, a Ramax tem unidades em em Santana do Parnaíba (SP), Sinop (MT), Xinguara (PA), em Dubai e no Líbano.

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